Capítulo XVI

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Conversamos sobre uma infinidade de coisas enquanto voltávamos pra casa, mas com certeza o beijo não foi uma delas.

- Espero que Estela não veja problema em estarmos encharcados - estava assustada com a quantidade de água que emsopava minha roupa.

- Estela é a pessoa mais tranquila que conheço, raramente fica irritada.

Kleen girou a maçaneta da porta assim que chegamos em casa. Aos poucos, aquele lugar deixava de ser estranho para mim. Sentia que a pequena casinha amarela - que apesar do tamanho, era bem organizada e bonita - já estava virando meu lar.

A noite chegara, e como eu estava um pouco exausta, decidi tomar um banho quente para descansar.

Quando encostei minha cabeça no travesseiro, um flashback do ocorrido mais cedo com o espelho veio em minha mente. Eu não estava delirando, não podia ser apenas uma coincidência com meu sonho.
Minha vida mais parecia uma caixinha de surpresas, e eu não sei se ansiava ou temia pela próxima.

Acordei um pouco assustada, com a impressão de ter tido um pesadelo do qual não me recordava.
Na cozinha, encontrei Kleen arrumando a mesa para o café, enquanto preparava algo que cheirava a queimado.

- Bom dia, onde está Estela? - pergunto.

- Bom dia! - Kleen diz, entusiasmado - Estela foi se arrumar, hoje ela vai treinar conosco.

- Desculpa, mas tem alguma coisa queimando? É sério, o cheiro tá bem forte.

- Minha nossa! - ele, preocupado, direciona-se ao fogão - Esqueci os blinfs aqui, nem percebi que o cheiro vinha dali.

- Kleen, tem algo queimando? Que cheiro horrível! - Estela aparece.

- Deixei os blinfs queimar, sabe sou um desastre na cozinha. - Kleen limpava as coisas rapidamente - Acho que dá tempo de preparar outros.

Poucos minutos depois, o prato desconhecido já estava pronto. Estava com medo, pois além de ser algo novo, era Kleen quem havia preparado, e eu tinha uma pequena impressão de que ele não cozinhava bem.

- Espero que goste! - Kleen coloca o pequeno alimento em meu prato.

Como na aparência, o gosto também lembrava bastante cupcake, com um leve gosto de menta.

- Ficou muito bom. Até que você manda bem.

- Só não cozinha melhor que eu. - Estela riu.

Assim que terminei, me vesti mais uma vez com uma roupa de Estela, e em seguida, fomos a caminho do campo de treinamento.

Quando chegamos, não acreditei no que vi.
Samanta estava lá, acenando para Kleen, animada.

Sério mesmo que ela ainda queria treinar comigo? Por que Kleen não me avisou que traria ela?

- Estela, quer ir dar uma aquecida com Samanta? Preciso dar algumas coordenadas pra Celeste.

- Querer eu não quero não, mas vou, né.

Estela caminhou em direção à Samanta, que estava um pouco longe da gente.

- Celly, quer dizer... Posso te chamar assim?

Faço que sim com a cabeça.

- Ótimo! - ele sorri - Hoje prefere treinar a telecinese ou controlar seu poder de vôo? Você que escolhe.

- Um dos meus sonhos sempre foi voar, então acho que já sabe - sorrio.

- Certo... E Celly, hum... Você quer ver um filme comigo hoje no cinema?

- Claro! Os cinemas daqui são iguais aos da Terra?

- Na verdade não, pelo menos não os tradicionais. Aqui adotamos um cinema móvel, estilo drive in. - ele explica -Nós vamos a um lugar onde há uma enorme tela e assistimos dentro de nossas naves. É uma experiência bem legal.

- NÃO ACREDITO! - eu gritei, indignada - Eu sempre quis ir a um, acho que vai ser mil vezes melhor assistir dentro de uma nave.

- Kleen, vem aqui! - Samanta o chama.

Eu já sabia que o dia não seria dos melhores, pelo menos não enquanto ela estivesse conosco.

Samanta não gostava de mim, isso era fato, mas sinceramente não entendia a razão de termos que treinar juntas. Se fosse só por ela ter mais poderes que o resto de Plateno, não seja por isso. Kurt também tem e quase me matou.

- Estava com tanta saudade de você! - ela o abraça e tenta beijá-lo, mas Kleen não retribui.

- É o seguinte, hoje vamos ajudar Celly a voar. - ele avisa.

- Ah, claro. Vai ser tão fácil como ensinar uma galinha a fazer o mesmo. - disse a inconveniente.

Estela e Kleen lançam um olhar de reprovação à Samanta.

- Se foder você já foi hoje? - tentei ser educada por todo esse tempo, mas paciência tem limites e aquela garota já havia ultrapassado os meus.

- Qual é? Eu não quis te ofender. Galinhas são aves fofas.

- Igual você! - Estela deu um sorriso forçado.

- Vamos começar isso logo. - Kleen ordenou - Celeste, feche os olhos e concentre-se. Levante seus braços com tranquilidade e abaixe-os com força e velocidade, para dar impulso. Consegue fazer isso?

- Consigo.

Calmamente, ergo meus braços, respirando fundo enquanto meus olhos estavam fechados. Conto mentalmente até três, para que com a maior força que existisse dentro de mim naquele momento, eu conseguisse abaixar meus braços, cerrar os punhos e finalmente voar.
Deu certo.
Bom, mais ou menos.

Consegui tirar meus pés do chão e ir a uma altura considerável, mas não sabia como me manter no ar.

Eu gritava de cima pedindo ajuda. Estela e Kleen me davam comandos, enquanto Samanta não parava de rir.
Como eu estava um pouco longe do chão, não conseguia ouvir muito bem, e isso resultou em uma das quedas mais vergonhosas da minha vida.

Minhas costas encontraram o chão de uma forma não muito agradável. Mas pelo menos não caí de cara.

- Você tá bem?? - Estela correu para perto, aflita.

Kleen veio com rapidez até mim, perguntando repetidas vezes como estava me sentindo e se gostaria de ir ao médico.

- Mas se ela for ao hospital, vão reconhecê-la.

- E você quer que ela fique com dor, ou até mesmo que a situação piore?

- Gente, estou bem, só acho melhor não treinar mais por hoje.

- Você só dá problema, é assim que pensa em nos salvar da guerra? Não aguenta se manter dois minutos no ar e acha que vai conseguir com milhares de tropas? - Samanta cospe as palavras em mim - Não adianta nada ter esse tanto de poder e não saber usar nenhum direito, duvido que tenha esquecido tudo. Acho que pegamos a pessoa errada.

- CHEGA, SAMANTA! - Kleen esbraveja.

- Olha, Kleen, você não precisa treinar essa terráquea só por causa de uma droga de promessa aos seus pais. Isso era dever deles, não seu. Aceite que eles morreram e ponto.

- CALA A BOCA! - eu nunca o vi tão nervoso como naquela hora - Não vou admitir que desrespeite meus pais ou a Celeste. VAZA DAQUI!

Samanta, que claramente estava irritada, olhou-me com raiva, dando às costas para nós e indo embora.

Por que será que ela me detesta tanto assim?
Eu não pedi para estar aqui, e de verdade, gostaria muito que essa guerra acontecesse logo para me livrar do peso que colocaram em minhas costas, e que de certa forma fui obrigada a carregar.

Sempre gostei de ajudar as pessoas, mas saber que o futuro de um planeta inteiro dependia principalmente de mim e de meus poderes me preocupava cada dia mais.
Eu gostava de Plateno, mas às vezes gostaria que tudo isso fosse apenas um sonho e que eu acordasse na minha vidinha normal e medíocre, porque pelo menos na Terra eu sabia como me comportar.

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