A pergunta pairou no ar. Cada segundo pesando como horas.
Márcia encarava Inês com uma intensidade descomunal. A bruxa se sentiu despida, era como se o olhar da detetive pudesse atravessá-la. A jovem procurava nos olhos da mulher a sua frente a certeza, a verdade, a confiança que precisava. Márcia deixou seu olhar cair para a mão de Inês, a sua espera.
"Isso não tá acontecendo." A detetive se pôs de pé, sem olhar novamente para a bruxa, envolvendo seu corpo com a manta.
- Bom - começou Inês, fechando a mão com a certeza de que o ar era tudo o que a palma tocaria - eu vou tomar isso como um não... - A jovem parou na janela, inclinou seu corpo para frente e inspirou tão fundo que sentiu como se seus pulmões fossem aguentar - obrigada pelo seu tempo, Detetive! - Inês se colocou de pé e estava prestes a se transformar quando o grito agoniado da jovem a parou.
- Márcia? - Inês a chamou, se aproximando, mas ela não parou de gritar - Marcia?! - a bruxa chamou mais alto e segurou seus ombros, colocando a mais nova de frente para ela. O grito cessou. - o que aconteceu?
- Eu quero acordar. Eu quero acordar! Chega desse pesadelo! Não existe corpo seco, não existe Bradador, não existe porra de Cuca nenhuma! O Eric ficou louco e sumiu na floresta! E eu to ficando doida e você quer me levar pro meio da floresta também? Você não, você não existe! Eu! Meu pesade...
- Márcia! - a bruxa apertou os braços da detetive com mais força do que pretendia, mas o desespero da jovem lhe deixou atordoada. - Eu sou real. Nós somos tão reais quanto você, Márcia. Meu coração bate como o seu. - disse, levando a mão da detetive ao seu peito, seu coração batia forte - Meu corpo é real como o seu. - levou a outra mão da jovem ao encontro de sua cintura. A manta que cobria Márcia caiu sobre seus pés, revelando o corpo nu da moça, mas dessa vez Inês não desviou seu olhar dos olhos da jovem - Minha respiração é quente como a sua - a bruxa deu mais um passo em direção à detetive, extinguindo o espaço que havia entre seus corpos. Seus lábios estavam a centímetros de distância, mais uma vez. O hálito suave da entidade preencheu as narinas de Márcia. A mais nova estava ofegante. Seu coração estava tão acelerado que pôde sentir o sangue correr por suas veias, tinha certeza que Inês podia sentir a batida forte também. O olhar de Márcia caiu sobre os lábios cor de morango da bruxa, eles pareciam lhe convidar. Um convite irresistível. Seus lábios se aproximaram cada vez mais, os centímetros de distância rapidamente se transformaram em milímetros. Inês fechou os olhos na iminência do contato...
Mas Márcia recuou antes que o toque se concretizasse, afastando seu corpo e suas mãos do corpo da entidade. A bruxa abriu os olhos, surpresa, tentando não deixar transparecer sua frustração.
- Desculpa, Inês, eu surtei! Mas não vai acontecer de novo. Pode contar comigo!
- Você ainda não respondeu minha pergunta. - A bruxa se abaixou e pegou do chão a manta que antes cobria o corpo de Márcia. Só então a jovem se lembrou de sua nudez. Inês não desviou o olhar do rosto da detetive quando levantou e estendeu a manta para a mais nova, que se cobriu novamente.
- Eu confio em você, Inês. - Márcia respirou fundo - Mas se você me deixar morrer naquela floresta, eu juro que volto pra te atazanar. - Inês sorriu, aliviada - Eu só preciso me trocar antes da gente ir.
- Tudo bem se eu comer alguma coisa na cozinha? - perguntou assistindo a jovem se virar em direção ao guarda roupa.
- Inês, você invadiu meu banheiro e me viu dançar pelada no chuveiro. Você não precisa pedir autorização pra assaltar minha geladeira - Inês riu alto, sem o mínimo de culpa, e caminhou para a cozinha. Márcia tinha esse estranho efeito nela, a deixava mais leve, mais risonha.
