Três Meses e Alguns Dias

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Os dias se passavam mais rápido do que eu podia imaginar. Jean e eu não conseguíamos mais permanecer longe um do outro, e talvez fosse justamente por isso que o tempo voava. Com muito cuidado, sempre nos visitávamos nas noites frias e escuras desse lugar.

Todos os dias eu me perguntava o porquê daquilo ter acontecido, era um misto de sentimentos e sensações que acho que nunca serei capaz de descrever. Eu me culpava pela situação, por ter me apaixonado. Me culpava por colocar minha vida e a dos rapazes em risco, e se algo acontecesse eu nunca me perdoaria. Ter me apaixonado por um Eldiano era exclusivamente culpa minha, e o pior de tudo, eu nunca quis me livrar desse sentimento. Agora, mais do que nunca, eu conseguia entender Kira.

Apesar disso, eu sabia e entendia que minha prioridade era Marley, minha família, e não havia outra forma de lidar com isso. Uma hora ou outra, tudo acabaria. Algumas noites, cheguei a rezar para que Jean não estivesse apaixonado por mim como eu estava por ele, mas talvez eu não tenha rezado o suficiente.

- Até mais pessoal! Nos vemos amanhã cedo – me despedi do time de elite em nosso treino, e organizei um pouco da bagunça que havia ficado no pátio. Arrumar o restante das coisas sempre ficava por minha conta, exceto raras vezes em que o Capitão me ajudava. Esses dias eram os melhores, e eu nunca entendi como ele conseguia arrumar uma bagunça tão rápido.

- Esther, precisa de ajuda? - ouvi Jean dizer em minhas costas. Ele já não havia ido embora?

- Ah, na verdade não – respondi sorrindo, e me virei indo até o depósito. Na verdade eu precisava sim de um outro tipo de ajuda, mas não queria pagar o preço por recebê-la no meio do pátio.

Os passos largos de Jean me acompanharam, e assim que terminei de organizar alguns pesos, senti suas mãos segurarem minha cintura por trás, me puxando mais perto de seu corpo. Fechei os olhos e pendi meu pescoço para o lado, esperando que ele depositasse beijos em meu pescoço, e assim ele o fez. Não precisávamos pronunciar uma palavra sequer para nos entendermos, e excluindo o fato de que tudo o que ele sabia de mim até agora era uma enorme mentira, nossa sincronia ainda era incomparável.

Nossos corações sempre batiam forte, e quase no mesmo compasso. Meus olhos não conseguiam mais se desvencilhar dos seus, nem sua boca conseguia se separar da minha, bem como ele dizia.

"Sua boca é minha perdição, Esther. Não sei como fez isso comigo".

Por vezes eu quis desistir de tudo, quis simplesmente ir embora e implorar para que Zeke me matasse, mas algo maior me prendia aqui e eu não conseguia relutar. Eu não queria.

Seus beijos em meu pescoço não cessaram, e eu suspirava alto simplesmente aproveitando-os o quanto podia. Suas mãos me apertaram em um abraço, e senti seu hálito quente próximo ao meu ouvido, me fazendo arrepiar por inteira.

- Quero que você me acompanhe em um lugar. Consegue ficar pronta em menos de uma hora? - seus lábios roçavam em meu ouvido, e sua voz rouca me deixava zonza de vontade de tê-lo ali mesmo.

- Não sei, acho que sim. Só não tenho certeza se é uma boa sairmos do alojamento - respondi me virando e olhando seus olhos castanhos, que estavam mais claros que qualquer outra coisa.

- Prometo que não vão sequer sentir nossa falta. Assim que sairmos, todos já estarão dormindo.

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Me aprontei em menos de uma hora, e por incrível que pareça, havia conseguido me arrumar de maneira bem satisfatória. Não existiam muitas opções de vestuário para que eu pudesse me perder entre as opções, então escolhi o único que seria o ideal para a ocasião. Sinceramente, as pessoas aqui dentro viviam absurdamente atrasadas, e minha saída era usar um dos vestidos antiquados que eu possuía. Em Marley, isso aqui seria poderia muito bem ser uma fantasia.

Saí pela escada dos fundos, tentando ao máximo não fazer um barulho sequer, e acho que fui bem sucedida. Precisei levantar as barras do vestido enquanto me dirigia até o estábulo, do contrário ele se encheria de lama, e eu não estava nem um pouco afim de parecer suja. Acho que eu me tornava um pedaço de Levi, já que a cada dia que se passava, eu percebia um pouco de suas manias em mim.

Enquanto esperava Jean, tratei de selar meu cavalo. Minhas mãos suavam frio, e por breves momentos eu me questionei o que estava fazendo. Meu coração batia forte sem nem mesmo vê-lo, eu parecia uma adolescente de quinze anos, e francamente, que situação vergonhosa! Lembrei que Jean poderia ter por volta de seus dezesseis, e fiz uma careta por
perceber o quão patética eu era. Rezei para que Reiner nunca tivesse o desprazer de descobrir tudo isso, ele me mataria! Pior, ele ficaria decepcionado.

Estagnada em meus devaneios, nem percebi Jean chegando ao estábulo, apenas senti suas mãos apertarem minha cintura por trás, como ele já havia criado o costume de fazer.

Me virei, enxergando uma das mais belas visões que eu poderia ter visto nos últimos dias. Sua camisa branca de linho era larga, estava um pouco aberta em seu pescoço e sem os cordões amarrados, agradeci por aquilo. Sua calça era um pouco menos apertada que as de nosso uniforme, na verdade se assemelhava à algo social, mas também não era bem isso. Jean usava um cordão em seu pescoço, com um pingente que eu nunca havia reparado, um pouco parecido com o mar. Me perguntei se poderia realmente ser o mar, mas logo lembrei que ele nunca soube, nem saberia o que era aquilo. Fiquei um pouco triste em pensar nisso.

- Você está linda - ele sorriu, com o olhar deslumbrado. Parecia nunca ter visto uma moça de saia, coisa que não era verdade.

- Posso dizer o mesmo de você - respondi, admirando seu rosto.

Nos beijamos da mesma maneira de sempre, insaciáveis. Levei meu rosto até seu pescoço, e apesar de ter que levantar um pouco os meus pés, ele também cooperou se abaixando. Seu cheiro era incomparável, e acho que nunca havia sentido algo igual, nada era tão bom quanto o cheiro daquele rapaz. Depositei alguns beijos na região de seus ombros e pescoço, e voltei meus calcanhares ao chão.

- Vamos, eu quero que hoje seja uma noite diferente. Tomara que você goste - ele disse, subindo no animal.

Jean estendeu suas mãos, e eu tomei impulso para subir também. Me segurei em sua cintura com força e suspirei quando ele me olhou por cima de seu ombro, dizendo que só voltaríamos pela manhã, quando enjoássemos um do outro.

Naquele momento, percebi que se dependesse disso, eu nunca mais voltaria.

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Jean me puxou de cima do cavalo, me colocando de pé no chão. Cocei meus olhos e olhei para os dois lados da rua, mas não havia ninguém além de nós dois. O silêncio pairava no ar, e me deixava mais ansiosa do que eu já estava.

- Vem - ele estendeu sua mão e segurou forte a minha, me puxando até o outro lado da calçada. De certa forma, ele também parecia um pouco nervoso.

Paramos em frente a uma grande porta de madeira, toda entalhada à mão. Quem quer que morasse ali, possuía um gosto que se aproximava do meu.

Jean deu leves batidas na madeira, e me olhou um pouco ansioso. Eu dei um sorriso um tanto quanto amarelo e olhei para o vão do portal, assim que uma senhora de cabelos um pouco grisalhos apareceu.

- Jean?! Céus, eu quase morri de saudades de você, meu filho!

Drowning (Parte I) - Jean KirsteinOnde histórias criam vida. Descubra agora