Cinco Meses

318 41 2
                                    

Depois de alguns dias dentro do esquadrão, eu já tinha me familiarizado com algumas pessoas ali. Sasha era a mais próxima, sempre falava muito e comia o dobro, não sei como não explodia.

Eren e Armin também estavam mais próximos de mim do que o restante. Depois, os outros dois rapazes, Connie e Jean. O último sempre mantinha a atenção em mim, mas a última coisa que eu precisava era um par de olhos me acompanhando por onde fosse. Talvez alguém o tenha colocado pra fazer isso, então eu precisaria redobrar meu cuidado.

Nosso time de elite já estava quase saindo do papel. Pra isso acontecer, precisaríamos do Capitão Levi. Ele ainda não havia aparecido, já que uma exploração fora das muralhas acontecia, e sua presença nela era indispensável. Eu precisaria logo que esse grupo fosse formado, facilitaria meus planos.

Me sentei na ponta da escada do pátio externo, ao lado do loirinho dos olhos azuis.

- Bom dia Esther! Parece que o treino de hoje vai ser pesado - comentou Armin.

- É? Como sabe?

- O Capitão Levi e o Comandante chegam daqui à pouco. O Capitão não dá um tempo de descanso nem mesmo pra ele, quem dirá para nós.

- Ei Armin - uma voz chamou atrás de onde estávamos.

Me virei e vi o rapaz que havia esbarrado em mim no primeiro dia. Jean, um desastrado.

- Mikasa e Eren estão te chamando no refeitório. Não sei o que é - o rapaz disse se sentando ao meu lado.

- Obrigado por avisar - Armin respondeu se levantando e saindo.

Jean tirou uma faca do bolso e começou a desenhar no chão da escada. Era um garoto, e completamente imaturo.

- Então, o que está achando?

- Falou comigo? - questionei, com o olhar fixado em alguns soldados que treinavam luta no meio do pátio, e até que eram bons. Ele concordou com a cabeça abaixada e continuou fazendo alguns riscos no concreto.

- Acho que vou me dar bem. Espero que eu consiga acabar com pelo menos uma dessas merdas nojentas que vivem aí fora - meu tom até parecia um pouco motivado, mas não passava de uma bela mentira.

- Eu também acho. Percebi que você tem facilidade com o DMT, talvez até mais que alguns que estão aqui há mais tempo.

Um breve silêncio pairou no ar, mas Jean o quebrou.

- Por que decidiu entrar?

Ótimo, essa era uma perfeita oportunidade pra tirá-lo do meu pé. Já que ele queria saber, eu iria dizer.

- Perdi meu noivo. Nosso casamento aconteceria em semanas - respondi abaixando a cabeça.

- Ah... Não imaginei que fosse algo assim - ele disse virando seu rosto em direção ao meu, guardando a pequena faca em seu bolso novamente.

- É. Já passou. Estou bem agora - virei meu rosto sorrindo. Ele sorriu de volta.

- Que bom. Vem, vamos comer alguma coisa! - ele disse se levantando e estendendo sua mão.

Pela primeira vez em muitos anos eu sorri. Eu sorri? Eu havia sorrido... De verdade... O que tinha acontecido? Jean era tão imaturo e idiota que eu tinha achado graça? Não sei, não faço ideia do por que eu tinha esboçado um sorriso. Não sentia felicidade alguma em estar ali, estava apenas honrando e seguindo o meu destino.

"Demônios podem te fazer sentir".

---

- Eu quero todos aqui em uma hora. Dois abates de titãs, no mínimo - disse o Capitão Levi abrindo seu relógio de bolso.

O homem era realmente baixo, suas mãos esguias, seus cabelos pretos como um breu, e com olhos azuis tão cinzentos quanto um dia de chuva forte. Aquele realmente era o soldado mais forte? Não parecia.

- Ele voltou sem nenhum arranhão. Fiquei sabendo que tiveram doze baixas, e ele sequer voltou machucado. Acho que na verdade ele fica só olhando os outros morrerem - disse Sam ao meu lado. Fazia algum tempo desde a ultima vez que tinha o visto, não éramos tão próximos.

- Não sei, eu acho que ele é bom de verdade - respondi ajustando o DMT em minhas pernas.

- Se ele perder a paciência, talvez vocês vejam o que é que ele sabe fazer - Jean disse, se intrometendo no assunto e chegando mais perto.

- Você já viu? - Sam perguntou com o tom insolente.

- Já - Jean respondeu se abaixando na minha frente - Posso? - ele apontou pro equipamento. Eu tinha costume de deixar as fivelas um pouco mais frouxas que o normal.

Balancei a cabeça em afirmativo, e ele sorriu de canto. O rapaz poderia até parecer gentil, caso sua existência não fosse uma grande mentira. Era apenas um verdadeiro escravo do pecado.

Suas mãos apertaram as amarras com força, e assim que terminou, checou se estavam firmes de fato, adentrando seus dedos entre as fivelas e a minha perna. Admito que fiquei um pouco tensa, geralmente eu não daria espaço pra qualquer outro homem encostar em meu corpo. Não era algo que eu gostava, muito menos que me sentia à vontade. Minhas poucas experiências não haviam sido nada boas. 

- Pronto - disse o rapaz dando duas batidinhas em minha coxa. Mal percebi quando uma de minhas mãos acertou seu rosto bem em cheio, automaticamente. 

Jean caiu no chão com as mãos no rosto, gemendo de dor, enquanto todos olhavam pra mim, alguns com caras assustadas, outros rindo. Ótimo, é assim mesmo que você quer manter a atenção longe de você Esther? Sua idiota!

- Jean! M-me desculpe! Meu Deus como eu sou idiota - me ajoelhei ao seu lado sem saber o que fazer. 

Eu realmente me sentia culpada, e esse sentimento me trazia preocupação. Eu não podia sentir isso, não havia espaço nenhum pra esse tipo de confusão mental acontecer comigo. Se organiza Esther, ou vai acabar morta, caralho! 

Do outro lado do campo, Reiner e Bertolt me olhavam. Tenho certeza de que se aqueles olhares pudessem me matar, eu morreria ali mesmo. 

Drowning (Parte I) - Jean KirsteinOnde histórias criam vida. Descubra agora