Seis Meses

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Dezenove anos. Foram dezenove anos de sofrimento e dor. Dezenove anos sendo inútil em absolutamente tudo o que eu poderia fazer, mas ainda assim, Marley havia decidido me recompensar.

Durante algum tempo, Kira teve a titã fêmea sobre sua posse, e mesmo assim não foi o suficiente para realizar seu serviço bem feito. Sua traição à Marley, acreditando nas mentiras dos demônios da ilha, a fez rejeitar a nossa verdade. A única verdade.

Reiner e Bertolt conseguiram contê-la, antes que ela fizesse alguma burrice dentro daquelas muralhas nojentas. Por sorte, os demônios não descobriram nossas identidades; identidades que na verdade foram perdidas durante o passar dos anos. Não me vejo mais como Eldiana, mas se não fosse minha linhagem vergonhosa, eu não poderia lutar por Marley, sendo agora a mais nova portadora da titã fêmea.

Meu corpo se desvencilhou de toda a massa corporal do titã que me havia sido concedido naquela noite. Eu sabia que o calor queimava minha pele, mas eu não sentia nenhuma dor. Os líderes do conselho batiam palmas, e os olhares de cobrança me fulminavam como nunca antes.

Apesar de antes ter sido uma fraca candidata à titã fêmea, hoje eu era a única opção existente. Os novos guerreiros ainda eram crianças completamente inexperientes, então não restaram alternativas aos responsáveis pelo conselho de segurança de Marley. Teria de ser eu.

Ao sair da sala do ritual, Reiner me esperava com o olhar cerrado. Sua expressão de desconfiança nada mais era que medo. Eu entendia sua preocupação, mas não era necessária. Não naquele momento.

Demos as mãos e saímos de lá. A ilha de demônios agora era meu único e principal objetivo.

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- Cadetes? Vocês não estão aqui por que são bons, estão aqui por pura sorte. Jovens velhos como vocês nunca foram interessantes para nossas tropas, mas apesar disso, precisamos de mais! - Um homem alto e carrancudo gritava com todos ali.

Que sistema falho. Obsoleto eu diria! Não sabem da existência de uma humanidade fora daqueles muros nojentos, e acham que todos querem lutar pelo bem dos que estão aqui. Pegam restos de qualquer idade, assim como eu, uma triste e jovem viúva de um noivo agora morto por bandidos do subterrâneo... Que tragédia! Poderia até sentir pena de mim, se fosse verdade.

- Vocês treinarão durante dias e noites, e darão os seus corações! Não importa como, não importa onde, nós avançaremos!

Prestei a continência como se realmente pertencesse à aquela realidade nojenta. A partir dali, eu faria de tudo pra termos de volta o que realmente era nosso.

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As manhãs eram bem mais fáceis do que eu havia imaginado, e em quase dois meses de treino eu já me destacava de forma significativa dentro daquele grupo de novos cadetes. Posso até dizer que era a melhor de todos. Lutar não tinha sido uma opção minha, mas agora isso fazia parte de mim enquanto guerreira de Marley. Tudo o que já tinha antes vivido, facilitava muito minha vida naquele lugar.

Já acostumada com o equipamento 3D, meus saltos estavam evoluindo em qualidade de forma absurda. Alguns superiores já notavam meu avanço e permaneciam de olho, suponho eu, imaginando para qual unidade me mandariam.

Eu queria a mais interna, a mais próxima da alta sociedade, e bem longe do Reconhecimento. Seria o ideal para ficar distante de qualquer ameaça. Mas, não seria uma escolha minha. Esse dia logo chegaria, e eu teria que estar preparada para qualquer situação.

- Ei! Precisa de ajuda? - Reiner corre em minha direção, apontando o equipamento, como se não me conhecesse. Já havia pedido para que não fizesse aquilo. O que um cadete da tropa de exploração tinha pra fazer ali além de nada? Se eu estivesse observando de fora, me pareceria suspeito.

- Acho que não, estou bem - respondo séria, fechando o equipamento em minha cintura. Receio que ele gostaria de me comunicar alguma coisa, mas aqui? Agora?

- Senhor Reiner, precisa de ajuda? - O instrutor do equipamento se aproxima de nós, batendo suas grandes pernas no piso de pedra do pátio. Seu sorriso era calmo e estratégico, e se alguém não o conhecesse até diria que era uma pessoa normal.

- Não, tenente Pietro! Essa moça não parecia confortável em seu equipamento, então vim tentar ajudar, mas já estou de saída! Considerações ao Capitão Levi? Estamos voltando agora para o nosso alojamento - Reiner perguntou, fingindo uma naturalidade que com certeza, não era dele.

- Não será necessário, jovem. Amanhã pela manhã indicarei os novos cadetes para a turma do capitão. Ele se recusa a ser um professor, mas alguns aqui tem grande potencial para a exploração - diz Pietro pousando o olhar sobre mim.

Finjo um sorriso, e me viro indo em direção aos outros cadetes. Tropa de exploração? Era tudo o que eu não precisava. Reiner e Berthold já estão nela, não é necessário que eu esteja também. Droga!

Não era o que eu havia calculado, não era o que deveria acontecer...

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Notas da autora:

"Olá! Chiara falando. Não aparecerei muito por aqui, já que acho que a experiência de vocês lendo não deve ser interrompida.

Trago aqui alguns breves pontos importantes para o seguimento da obra:
- Essa história não é uma simples história de amor, e eu espero que consigam entender os sentimentos dos personagens em suas devidas profundidades, especialmente dos personagens principais.
- Minha intenção é passar desde sentimentos desconfortáveis, tristes, até felizes e que tragam paz. Espero que eu consiga esse feito, nem que seja um pouco.
- Me perdoem caso isso não aconteça, procurarei melhorar. Espero que sintam prazer ao ler essa história!

Agradeço imensamente pela escolha, e tenham uma boa leitura."

Drowning (Parte I) - Jean KirsteinOnde histórias criam vida. Descubra agora