Eu quero viver!

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- Cássia! Cássia!

Uma voz bem distante chamava por um nome familiar. Meus sentidos estavam alterados. Não conseguia saber onde estava, nem como fui parar lá.

- Cássia!

A voz se aproximava.

Abri meus olhos lentamente. Estava escuro.

- Cássia!

Agora eu conseguia ouvir claramente uma voz suave chamando.

- Olá. - Minha voz ecoou pela minha cabeça, mas não consegui falar.

- Estou aqui, venha até mim. - A voz respondeu.

- Consegue me ouvir? - Perguntei, ainda com minha voz presa em meu corpo.

- Eu estou em você.

Eu não entendia nada.

- Onde você está? - Perguntei.

- Em você, Cássia.

- Quem é você?

- Venha até mim.

Eu não estava entendendo o motivo daquela conversa, nem o motivo daquela voz chamando por esse nome.

- Eu não posso te ver. Não posso ir até você.

- Você precisa me alcançar, Cássia. - Fez uma pausa. - Precisa me encontrar para se encontrar.

- Quem é você?

- Venha até mim e saberá.

- Mas eu não sei como te encontrar.

- Você precisa morrer para saber.

Eu acordei assustada e gritando.

- Ei, tá tudo bem?

Eu me encolhi num canto e nem percebi que Melissa estava sentada ao meu lado.

- Cris?

Depois de uma crise de pânico, eu me acalmei e pude ver a expressão preocupada da minha amiga.

- O que aconteceu? - Perguntei.

- Você desmaiou. Eu fiquei tão preocupada. - Disse. Pude ver que ela havia chorado.

- Eu tô bem. Deve ter sido uma queda de pressão.

- Eu chamei a ambulância, fiquei com medo de ter algo a ver com o seu acidente.

- Não precisava. Eu tô bem, odeio hospitais.

Ela me abraçou forte.

Eu me lembrei dos desenhos na parede e meu coração acelerou muito. Me segurei muito para não desmaiar outra vez.

- Melissa.

- Não, você só me chama de Missa. - Ela respondeu fingindo estar zangada.

- É sério.

- O que foi? Você nunca fica séria assim.

Eu olhei em seus olhos, marejados de lágrimas, e percebi que os meus também estavam.

- Por acaso, você era órfã?

Melissa ficou sem reação por vários segundos.

- Eu nunca te contei isso.

Percebi que tinha feito uma besteira ao perguntar isso.

- Como você descobriu, Cris? - Ela perguntou séria. - Quem te contou?

Eu olhei para a parede atrás de mim.

- Foram eles. – Disse, apontando para os desenhos.

- O que você quer dizer?

- Aqueles desenhos. Eles foram feitos por uma garotinha chamada Cássia. Uma garotinha que era sua amiga, no orfanato Santa Olga.

- Quem te contou isso, Cris? - Ela perguntou já com voz de choro.

- Ninguém me contou. Quem desenhou isso fui eu.

Um silêncio tomou conta do ambiente.

- Você...

O silêncio foi interrompido pelas sirenes da ambulância, que se aproximava.

- É melhor a gente ir lá. - Ela disse, depois se levantou e saiu do quarto.

Eu ainda não acreditava que havia reencontrado minha única amiga. Eu não acreditava que havia contado isso a ela.

Me levantei e fui até a ambulância, eles mediram minha pressão e checaram meus batimentos. Depois ligaram para a minha mãe, que os aconselhou a me levarem para o hospital.

Minha conversa com Melissa teria que ficar para outra hora.

Eu pude ver, antes de fecharem a porta da ambulância, Melissa enxugando as lágrimas com seu braço esquerdo, enquanto, com o direito, acenava para mim, dando um singelo “tchau”.

Naquele momento eu decidi ficar com ela.

Naquele momento eu decidi, pela primeira vez, viver.

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