Uma vida normal - 3

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O quarto dela era bonito. Melissa devia ter gasto vários dias de sua vida decorando isso tudo. Eu via pelúcias no chão, pôsteres de pessoas que eu não conhecia, e vários livros, com desenhos nas capas, espalhados por várias prateleiras.

- Pelo visto você também esqueceu do meu quarto.

- O que são esses livros com desenhos nas capas?

- Não são livros, são mangás! - Ela disse pegando um deles. - Não vai me dizer que não se lembra disso também? Você amava ler “Dragon Ball”.

- Eu não me lembro de nada disso.

- Eu sinto muito. Mas o lado bom é que você pode aproveitar a experiência toda outra vez. - Ela sorriu.

Eu nunca tive acesso a esse tipo de conteúdo. A questão não era não lembrar, eu só nunca tinha ouvido falar em nada daquilo.

Melissa me entregou o mangá.

- Vai lendo enquanto eu busco alguma coisa pra comer. Você não deve se lembrar da frase "Mangá é diferente, você lê de trás pra frente" né?

- Como assim?

- Aqui. - Pegou o livro de mim. - Eles são lidos no sentido contrário dos livros ocidentais.

Ela me mostrou como ler corretamente. Achei estranho, mas curioso. Se ela tinha tantos assim, então devia ser algo bom.

- E essa foi sua primeira lição. - Disse ela, sorrindo. - Eu não podia deixar de te fazer gostar de mangás outra vez. - Ela sorriu de novo. Depois saiu do quarto e foi buscar as comidas.

Olhei para a capa daquele pequeno livrinho ilustrado. Estava escrito "Dragon Ball" e, logo abaixo, "Akira Toriyama". Desenhado ali, havia um garoto sorridente montado num dragão. Eu não fazia ideia do que se tratava aquilo.

Me sentei na cama de Melissa e comecei a ler, e rapidamente minha atenção foi tomada pela história. Eu estava realmente gostando daquilo. Pela primeira vez, em muito tempo, eu estava realmente gostando de algo. Isso fez eu me sentir bem.

Eu estava tão focada lendo, que não percebi Melissa chegando no quarto.

- Queijo ou apimentado?

Eu me assustei com a fala repentina dela e quase deixei o pequeno livro cair na minha cara.

- O que é isso? - Perguntei enquanto me levantava.

- Você realmente esqueceu tudo, garota. - Ela disse se aproximando. - Isso aqui são Doritos. Comida, salgadinho, biscoito, bolacha, chamam de vários nomes.

- Quero de queijo.

- Algumas coisas nunca mudam. Você sempre amou o de queijo.

Ela me entregou o pacote. Eu nunca tinha visto nada dessas coisas antes, era tudo muito estranho, mas, ao mesmo tempo, era bom.

- O que quer saber primeiro?

- Como assim? - Perguntei, enquanto mastigava.

- Meu Deus, é pior do que eu pensava. Você também esqueceu que teve amnésia? - Ela disse, em tom sarcástico.

Nós duas sorrimos um pouco e me lembrei do motivo de eu estar aqui. E lembrei também que não era para estar aqui. Eu não sou a dona desse corpo, eu estou aqui como uma intrusa. Eu não mereço esses bons momentos, porque eles não são para mim, são para Cristine.

- Eu não sei, conta o que achar melhor. - Eu disse já desanimada ao relembrar de tudo.

- Você tem 17 anos, se chama Cristine, mora com a mãe e o irmãozinho. E o seu cachorro morreu atropelado.

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