Quente como o inferno

10 1 0
                                    


Lauren estava entrando em casa quando a Sra. Grande veio da cozinha, enxugando as mãos no avental. Seu sorriso era de expectativa.

— Então, minha querida? Como foi o jantar? — A curiosidade dela já era de se esperar e, um pouco embaraçada pela própria ansiedade, acrescentou: — Acabei de fazer chocolate quente. Aceita uma xícara?

A princípio, Lauren quis recusar, mas pensou melhor e mudou de idéia.

Sabia que não conseguiria dormir no estado emocional que estava.

Uma xícara de chocolate e uma conversa com aquela senhora simpática poderiam acalmar seu coração agitado e ajudar seu corpo tenso a relaxar.

Sentaram na cozinha e a conversa girou em torno do jantar na Casa Grande. Lauren contou o que achou mais conveniente, e logo a Sra. Grande começou a fazer comentários e perguntas que a surpreenderam.

A viúva parecia saber mais sobre a casa e seus ocupantes, tanto sobre o passado como do presente, do que se poderia esperar de um simples habitante da ilha.

Quando Lauren revelou que tinha ouvido história da ilha, a Sra. Grande se entusiasmou e começou a contar fatos sobre Aleandro Cabello, o pai de Camila.

— Alejandro casou cedo, e enviuvou logo depois. Adorava a esposa e foi um choque quando ela morreu no parto. — A Sra. Grande ouviu o murmúrio de piedade de Lauren e observou: — É a menina que merece nossa simpatia e não o pai. Alejandro perdeu a esposa, mas a garota ficou órfão de mãe e pai ao mesmo tempo.

— Como assim, Sra. Grande?

A viúva fez uma breve pausa, antes de continuar com a voz embargada por lembranças dolorosas:

— Camila não passou fome, nem se pode dizer que foi maltratada, mas sofreu muito. Apesar de ter sempre tudo o que o dinheiro pudesse comprar, não tinha amor, pelo menos não do pai. Foi praticamente criada por empregados e mandada para fora da ilha na primeira oportunidade que o pai teve.

— Para onde?
— Alejandro deixou a filha em Halekai por dois anos, sob os cuidados de uma tutora e a menina só voltava para casa nos fins de semana. Quando Camila tinha sete anos, foi mandada para um internato nos Estados Unidos. Pode imaginar uma barbaridade dessas! Não era a mesma coisa que ir para uma das ilhas vizinhas. A América ficava a milhares de quilômetros de casa, mas a menina foi e só voltava nas férias de verão.

Lauren tremeu só de pensar numa menina apavorada fazendo sozinha a mesma viagem que achara tão deprimente. Seu interesse estimulava a Sra. Grande a continuar:

— Bem, quando Camila terminou a faculdade, Alejandro não tinha mais desculpas para manter a filha longe de casa. Então, Camila voltou depois de dez anos, aparentemente com a intenção de trabalhar nas plantações. E foi aí que os problemas realmente começaram.

— Problemas?

— Sim. Camila e o pai não se davam bem e não era só por causa dos anos de separação. O grande problema era a diferença de opinião. Alejandro Cabello nunca deu muita importância para a ilha e seus habitantes, embora ninguém pudesse dizer que não cumpria suas obrigações.

— Provavelmente, como achava que tinha feito com a filha.

— Exatamente, Lauren. Tudo piorou depois que a Sra. Cabello morreu e, quando Camila voltou, viu os resultados da negligência do pai. Ela tentou fazer alguma coisa, e como tentou! Mas quanto mais interferia, mais irritava o pai.

A Sra. Grande mexia o chocolate distraidamente, como se estivesse pensando na melhor maneira de dizer o que tinha em mente. Finalmente, continuou com a voz baixa e distante, como se estivesse viajando no tempo:

ILHADASOnde histórias criam vida. Descubra agora