Mal registro o trajeto até o hospital, o ar gélido me envolve enquanto cruzo a recepção de tons azulados e tristes. Tudo parece um sonho ruim, desde as lágrimas escorrendo pelo rosto da minha mãe até a demora dos médicos em trazerem notícias. Me espanto quando Jungkook aparece no meu campo de visão, pensei que tivesse ido embora assim que me deixou na entrada.
Agora tem um copo plástico em mãos e uma sacola de papel. O cheiro de café e canela logo me envolve, é como conforto exalando nessa sala mórbida.
— Você não comeu e não sabe até que horas vai ficar aqui — me estende o copo fumegante junto à sacola. — Eles tinham rolinhos de canela na lanchonete, você disse que gostava.
Ele lembra?
Basta uma olhada no pão canelado para que meu estômago proteste de fome. Geralmente, é difícil comer quando a tristeza toma conta mas, seguir de estômago vazio vai acabar causando um desmaio. Então, tomo um gole do café e dou uma mordida no rolinho, o sabor é delicioso e quente, um pedaço de alegria adocicada.
— Muito obrigada, pensei que tinha ido embora.
Me levar até ali já foi muita coisa, ele poderia ter ficado aproveitando o dia livre em casa.
— Não pareceu certo te deixar assim — coça a nuca incerto. — Posso ir se você quiser.
Minha mãe se ausentou para atender a ligação da tia Amber que mora na Califórnia e não faço idéia de quando os médicos virão. Ficar sozinha aqui, vendo pessoas desesperadas por aqueles que amam, enquanto também sinto meu coração prestes a se partir, não me parece nada bom.
— Um pouco de companhia não vai fazer mal — dou mais um gole no café.
Jungkook apenas assente e não diz mais nada pelos próximos minutos. Como em silêncio, dando pequenas mordidas devido ao nó em minha garganta. A culpa pesa sobre meus ombros como uma bigorna, devia ter ido visitar a vovó Judy antes. Mesmo estando a 30 minutos de distância, segui empurrando a visita para outro dia e agora sequer sei se haverá uma nova oportunidade.
Odeio ter me tornado tão envolvida com a faculdade, quando foi que um bando de papéis se tornou mais importante que a família? Antes, costumava ir a casa da vovó pelo menos uma vez na semana, me sentava no chão de carpete vermelho e deixava suas mãos enrugadas trançarem meus cabelos pálidos. Os olhos acinzentados pareciam sorrir enquanto me ofereciam mais um pedaço de torta de maçã. Se fechar os olhos, posso ouvir Tobias; o golden retriever de 6 anos da vovó, latindo enquanto corre pelo quintal gramado.
Seres humanos são egoístas, deixamos tudo o que importa de lado e vivemos em prol de alimentar o ego, até que o mundo ameace ruir sob nossos pés. Então começamos a barganhar, pedir por só mais um dia, só mais uma chance, quando já tivemos inúmeras e as jogamos fora.
Deus, eu não tenho sido a melhor mas me deixa falar com ela de novo, por favor.
— Não se culpe — a voz de Jungkook me faz encará-lo e noto que seu olhar está focado em meus punhos fechados. — Só vai se sentir pior se alimentar a raiva. Tá tudo bem chorar.
Cubro a boca com a mão mas não consigo conter as lágrimas que caem sem parar. Jungkook hesita mas abre os braços e eu o envolvo soluçando contra seu ombro. A mão traça círculos no alto das minhas costas, me sinto patética por deixá-lo me ver assim.
— Eu tô sempre te metendo nessas situações desculpa — soluço culpada — eu só...tenho tanto medo de perder a vovó.
— Não precisa se desculpar — sua voz soa meio embargada e eu me afasto encarando seus olhos brilhantes que logo evitam os meus — Quando vejo alguém chorar, parece até que é comigo, besteira, né?
— Você é um fofo — fungo.
Suas bochechas coram e por algum motivo isso me faz querer chorar ainda mais. Jungkook é incrivelmente gentil, apesar de todo o tamanho. Chorar com os que choram nem sempre é uma tarefa fácil, geralmente queremos nos afastar ao máximo da dor ainda mais quando não é nossa. Meus devaneios são interrompidos quando vejo minha mãe caminhando em nossa direção, os ombros caídos e os olhos prestes a se derramarem mais uma vez. Um médico está ao seu lado, a pele marrom coberta pelo jaleco branco e o nome Andrew Miller bordado.
Jungkook faz menção de se afastar mas seguro seu pulso, como se tê-lo ao lado fosse impedir que eu desmorone.
— Os músculos do coração dela estão enfraquecendo, mais do que esperado para a idade. O mal estar foi devido a elevação da pressão mas a senhora já foi medicada — deixa a prancheta de lado. — Já pode resolver visitas.
— O que podemos fazer? — a voz da minha mãe sai baixa.
— Ainda estamos fazendo exames mas não se pode prever como o coração dela vai evoluir — ajeita a postura. — Ela pode ter apenas mais um ano ou dez, no momento é difícil prever.
***
O bip bip da máquina mostra que o coração da vovó continua batendo, mas não sabemos até quando. Os cabelos castanhos caem sobre seus ombros, mesmo numa maca, a elegância parece nunca deixá-la. As mãos enrugadas estão juntas sobre o colo e o olhar se mantém erguido enquanto me observa. Corro e a abraço, quebrando num choro aflito.
— A vovó está aqui — sua voz doce é seguida por tapinhas em minhas costas.
— Eu prometo que vou te visitar toda semana, me desculpe por ter demorado.
— Você veio correndo não foi, neném? Isso que importa — afaga meus cabelos.
Me afasto e lhe encaro. Quero memorizar cada traço, desde as maçãs do rosto marcadas até os lábios finos. O que vou fazer quando ela não estiver aqui? Sequer sei como reagir. Me recuso a aceitar que tudo pode estar acabado em um ano.
— Tem que prometer que vai se cuidar, que vai se….
— Eu vou quando chegar a minha hora — a mão quentinha envolve a minha. — Só fico triste de não te ver casar.
— Claro que vai ver, nós ainda temos muitos anos.
— Ô neném — Seus olhos estão cheios de ternura, brilhando com um conhecimento que não possuo. — A vovó não pode prometer isso.
As lágrimas rolam por meu rosto sem controle, sempre a imaginei segurando meus filhos no colo. Contado a pestinha que fui na infância, uma criança curiosa que vivia escondendo objetos pela casa. A vovó esteve ao meu lado em todos os momentos importantes e ainda não me preparei para deixá-la ir. Estamos seguras, pelo menos agora, o doutor Andrew disse que é improvável que ele piore severamente em menos de 6 meses, além disso, só os novos exames irão dizer.Sei que devo aproveitar o tempo que ainda nos resta mas, no momento tudo o que consigo ver é a enorme nuvem cinzenta pairando em nosso futuro. Vovó não parece abalada, sua mão me acaricia e um pequeno sorriso está em seu rosto. Talvez esteja pronta para ir, ao contrário de mim que sinto as lágrimas rolarem a cada vez que lhe encaro.
— Tem tantas coisas que ainda quero que a senhora veja.
— Eu vou fazer o meu melhor — sorriu fraco e disse num falso sussurro — mas, caso eu não esteja aqui, o dinheiro do seu presente de casamento está no fundo falso do meu porta jóias.
— Não quero pensar em dinheiro — fungo — quero a senhora presente.
Abraço a vovó e desejo que nosso tempo seja prolongado. Me pergunto se Jungkook ficou me esperando, não vou culpá-lo caso tenha ido embora, já fez muito por mim. O modo como me confortou, me faz questionar se ele já passou por algo semelhante.
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Jungkook é um amorMeu primeiro livro físico tá em pré-venda, ele é baseado em In the dark que é uma fanfic do Taehyung. Então se você curte histórias sobre superar relacionamentos abusivos, mundo do crime e momentos fofinhos, dê uma chance a Na escuridão.
O link do livro tá na minha bio aqui do wattpad e na do instagram ( haesoo_a) também.
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Golden boy 《Jungkook》
FanficQuem vê Jungkook andando pelos corredores da universidade, jamais imaginaria a dualidade e o segredo que o mesmo carrega. Para pagar as dívidas médicas do pai, o garoto veste uma máscara, uma personalidade diferente e nos fins de semana, se transfo...