Capítulo 4

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Hazel passou os últimos três dias em repouso, se levantando apenas para ir ao banheiro cuidar de suas necessidades e, depois, retornava para a cama. E eu esperava que ainda estivesse desta forma quando eu chegasse da universidade. No entanto, lá estava ela. Em pé. Na frente do fogão, como jurara na noite anterior que o faria depois de ter insultado o gosto ruim da comida do restaurante.

Eu realmente não via problema em deixá-la se divertir na cozinha. A questão, porém, era que ela estava a sete dias de tirar os pontos.

Resolvemos o problema da infecção. Depois do primeiro dia, os pontos deixaram de expelir o líquido amarelado e o cheiro ruim deu trégua, e agora a ferida já dava indícios de cicatrização.

Pensei que, talvez, a resposta positiva de seu corpo aos cuidados exatos tivesse lhe animado ao ponto de cantarolar no meio da cozinha, balançando o corpo em movimentos duros, como se ainda a incomodasse mover-se demais.

Era a primeira vez que a via daquela forma: leve. E, para ser sincero, gostei disso. Ela tinha uma energia boa agora, como se a infecção agisse como um buraco negro sugando sua existência.

Passei a conferir seu estado com mais frequência do que deveria. Quando não estava, pedia que Mia, a diarista que contratei há alguns meses para manter o apartamento em ordem — já que eu havia escolhido trabalhar em uma carga horária ainda maior do que a de antes e não tinha tempo para as tarefas domésticas —, olhasse-a e conferisse que não precisava de nada. Mas ainda não a vi sorrir ou soube que sorriu em minha falta.

Talvez eu tenha tomado como um desafio. Queria, a todo custo, colocar um sorriso em seu rosto e não pararia enquanto não conseguisse o fazer.

A cozinha cheirava à cebola refogada e especiarias.

Quando Hazel se moveu para levar a carne que acabara de descongelar à bancada, ela se sobressaltou ao me ver parado à porta.

— Ai, que susto! — reclamou ela. — Chegou cedo.

Conferi o relógio na parede adjacente e assenti.

— Taylor Swift?

— Uma companhia maravilhosa, não acha? — salientou ela.

— De fato.

Ela cortou a carne em cubinhos e se curvou sobre a bancada, alinhando a lâmina da faca com a pimenta, partindo-a em tiras. Hazel se moveu com tanta confiança, que me perguntei se ela aprendera a cozinhar há muito tempo.

— Vai ficar parado aí?

Eu me movi, tirando as mãos dos bolsos e me aproximei do balcão. Puxei uma banqueta e me sentei.

— Precisa de ajuda?

Hazel levantou os olhos para mim e os estreitou.

— Você sabe cortar legumes?

Não.

— Sim.

Desconfiada, ela empurrou a tábua que acabara de desocupar junto da tigela com tudo o que precisava que eu cortasse. Avaliei os ingredientes como avaliava uma coleta de células do colo uterino durante o exame do Papanicolau, e quase entrei em pânico.

— Isso é sério? — perguntou ela. Levantei o olhar e a encarei.

— O quê?

— Você faz partos, mas não sabe cortar legumes?

Constrangido, reprimi o lábio inferior.

— Ninguém é perfeito, né?

Balançando a cabeça em indignação, ela contornou o balcão e parou ao meu lado.

The Obstetrician _ Livro 3 [EM ANDAMENTO]Onde histórias criam vida. Descubra agora