Contos: Drácula & Lucien

39 5 74
                                    

Paris, França, 1685.

    O pequeno cômodo de Lucien na Rue Saint-Jacques chegava a ser risível perto da sala de visitas na mansão de sua família. Ele detestava aquela casa e, se dependesse dele, Lucien jamais botaria os pés lá de novo, mas ele tinha feito um trato com o seu pai. Então, depois de vender apenas dois quadros na exposição da galeria de Saint-Denis, ele entrou na carruagem do pai e permaneceu em silêncio durante todo o caminho até a mansão.

    Sua mãe e suas irmãs estavam visitando os avós da família, o que deixava pai e filho a sós na gigantesca mansão. Lucien estava parado diante da janela de vidro, observando a movimentação na rua. A noite era uma criança e muitas pessoas, carruagens e famílias passeavam pelas ruas de Paris. Ele se concentrava nas cores e adiava o momento no qual teria de conversar com seu pai. Monsieur Beaumont servia-se de uma taça de vinho, tampouco ansioso para confrontar o filho.

    Lucien moveu a cabeça para o lado, tendo um vislumbre dos quadros caríssimos que enfeitavam as paredes. Era irônico como seu pai apoiava inúmeros artistas desconhecidos, mas recusava-se a apoiar o próprio filho.

    — Sente-se, meu filho.

    — Eu posso ouvi-lo daqui, pai. — Lucien respondeu em seu habitual tom tranquilo, por isso seu pai não tomou aquilo como uma afronta.

    — Muito bem, — monsieur Beaumont deixou a taça sobre a mesa e deu alguns passos hesitantes na direção do filho. — Sei que não quer ouvir, mas nós tínhamos um acordo. Eu lhe daria seis meses para provar que pode conseguir dinheiro com a sua... arte... e, em troca-

    — Eu voltaria para casa e assumiria os negócios da família caso falhasse - Lucien terminou por ele, finalmente virando-se para o pai, mesmo que seus olhos não o observassem. — Eu me lembro.

    Sua habitual serenidade não era o suficiente para esconder a notável tristeza. Foi-lhe dado um tempo curtíssimo para poder investir em sua arte e tudo que Lucien queria era isso: tempo. Ele tinha ideias, tinha talento e tinha a determinação necessária para colocar seu pensamento em prática, o que ele não tinha era a lei ao seu lado. Ou dinheiro. Ele fez um contrato de empréstimo com o pai, um contrato com uma cláusula que o deixou sem alternativa. Lucien sabia no que estava se enfiando, mas as chances de encontrar outro patrono eram baixíssimas. Afinal, quem investiria em um artista desconhecido? Ainda assim, ele estava ciente que seu pai só assinou o contrato porque sabia que ele falharia.

Monsieur Beaumont ergueu o queixo com um inspirar vitorioso.

    — É nobre de sua parte aceitar a derrota dessa forma, ao menos isso eu consegui lhe ensinar.

    Lucien piscou uma vez para conter as lágrimas. Ele era uma alma sensível e estava em luto por seu lado artístico que jamais levantaria voo, ele sentia-se como se tivesse recebido uma sentença de morte, pois, para aqueles com uma mente criativa, não há nada pior do que aprisionar sua única forma de se expressar.

    Em um último esforço, Lucien ergueu os olhos para encarar o pai:

    — Meu pai, por favor. Se ao menos eu tivesse mais tempo...

    — Talvez eu possa ajudar com isso — uma terceira voz se pronunciou.

    Na entrada da sala, um homem estava parado na soleira da porta. Ele era alto, vestia-se completamente de preto e era facilmente a pessoa mais bela que Lucien já vira. As mãos unidas atrás de seu corpo em nada diminuíram a largura de seus ombros ou a imponência de seu olhar poderoso.

    — Quem é você? Como entrou aqui? — Monsieur Beaumont o confrontou, recuando até a parede onde um mosquete estava em exposição.

Do InfernoOnde histórias criam vida. Descubra agora