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Há horas estamos pensando e não temos nem um pouco de progresso.

- É a primeira vez que iniciamos uma batalha - Rebecca diz, trêmula. - Sempre tivemos alguém do nosso lado. Não sabemos o que é aquele círculo escuro e nem sabemos como derrotá-lo.

Todas as vezes que nós fomos às guerras, alguém pegava a frente. Seja meu pai, minha mãe ou Rafael.

Tentamos lembrar o que eles faziam antes de cada batalha, mas é difícil saber com clareza de algo que aconteceu há, no mínimo, quinze anos. O céu estava ficando escuro e fomos obrigados a acender as luzes. Minha cabeça está explodindo, então sugiro dormirmos e terminar - o que nem começamos - amanhã.

Quando deito em minha cama, não demoro dez minutos para dormir.

Sonho com a última batalha, contra o nosso pai, só que dessa vez os meus irmãos não estavam mortos. Nos abraçamos e ficamos chorando por minutos.

Rafael me puxa subitamente para a direita, longe dos outros.

- Você é o mais novo - ele diz. - E conseguiu derrotar um monstro gigante, Júnior.

Eu abro um sorriso.

- Por isso, te darei o que você precisa. Na verdade, o que eu te prometi - ele ri. - Mas antes, prometa não falar para ninguém que fui eu quem te disse.

- Eu prometo, irmão.

- Eu te prometi falar o que fazemos antes da batalha, como é feito o processo.

Me animo.

- A pessoa só pode fazer isso se tiver mais de vinte anos, então nunca se atreva.

Eu assinto.

- O segredo é: videntes.

Minha testa se franze. Ele só pode estar brincando.

- Videntes? - eu pergunto.

- Sim. Você já ouviu sobre o pergaminho de Davi?

- O que é isso?

- É o vidente - ele coloca a mão em meu ombro. - O que você precisar, ele te mostra.

Eu não entendo, pergunto o que ele queria dizer com aquilo, mas ele apenas mostra um sorriso de lado e puxa Natan.

- Te responderíamos - os dois dizem em uníssono. - Se ao menos estivéssemos vivos.

E correm de encontro a uma explosão luminosa. Me encontro chorando com as minhas irmãs, só conseguia repetir uma coisa: Eu já havia dado o golpe.

Acordo, meu tronco está suado, o relógio marca seis da manhã. Rebecca e Bianca estão acordadas, sentadas de costas uma para outra ao redor de uma mesa pequena. Me aproximo e pego um biscoito que estava em um pote no centro da mesa.

- Sonhei com Rafael - eu digo e as duas me olham no mesmo momento. - E com o Natan.

- Por favor não - Bianca reclama. Ela não gosta de escutar coisas sobre o irmão gêmeo.

- De algum jeito eles quiseram falar comigo, sobre o que fazemos antes das batalhas.

- Por sonho? - Rebecca pergunta com as sobrancelhas arqueadas.

- Claro que você não vai acreditar, podemos conduzir arcos mágicos, espadas mágicas, lanças que soltam fogo, mas receber sinais pelo sonho é realmente loucura.

Rebecca vira os olhos.

- Teve alguma resposta? - ela pergunta, por fim.

- Pergaminho de Davi.

- E onde encontramos?

- O deus Davi o tem, obviamente - Bianca diz. - Vai ser impossível.

- Você sempre querendo ser contra nós - Rebecca diz e se vira para sua irmã. - Sabe o motivo de você nunca ter arrumado um marido? Porque você é extremamente insuportável.

- Ou porque eu gosto de mulheres.

Eu e Rebecca paramos, ela nunca havia falado isso conosco.

- Qual é! Vocês nem desconfiavam?

Não conseguimos responder.

- Onde encontramos o deus Davi? - pergunto para quebrar o silêncio.

- Podemos invocá-lo - Rebecca responde. - Não é impossível como disse a Bianca.

O clima começa a esquentar, as duas provavelmente iriam se bater se eu não entrasse no meio.

Invocar um deus é mais fácil que invocar um demônio, você precisa de coisas cem por cento caseiras e uma fé inigualável.

Após deixarmos tudo na ordem correta, eu e Bianca nos aproximamos para efetuar o ato, mas Rebecca coloca a mão em meu peito, me bloqueando. "Apenas um." Ela diz, então deixo Bianca ir sozinha.

Ela se deita no centro, deixando um espaço mínimo entrem sua cabeça e o pé da mesa. Bianca começa a balbuciar palavras em outra língua e as lamparinas em volta se apagam. Um vento gelado entra em minha casa e todos nos arrepiamos, Bianca não encostava mais no chão, flutuava cinco centímetros acima dos desenhos feitos no chão. Suas pernas voltam a tocar o solo e seu corpo é colocado de pé, ela ainda falava as palavras. Seus olhos se abrem e ela se move até uma vela que estava na mesa, a única acesa.

Bianca pega a vela e volta ao centro dos desenhos, suas pupilas são levantadas, mostrando um olho intensamente azul que brilhava. Com um único sopro rápido, a vela se apaga e Bianca se desequilibra, caindo no chão.

- Funcionou? - eu pergunto a Rebecca.

- Você está vendo algum deus aqui? - Rebecca responde. - Deu tudo errado, merda.

Nós dois nos deslocamos até o corpo de Bianca e levantamos sua cabeça, a sacudindo.

- Ela morreu, Júnior - Rebecca diz, assustada. - Júnior, a Bianca morreu!

Não acredito de início, então dou alguns tapas no rosto de Bianca. Ela está imóvel.

Rebecca se levanta e fica de costas para o corpo, eu a acompanho.

- Tudo culpa minha - ela diz. - Se eu não tivesse falado da invocação ela estaria viva.

- Nada disso teria acontecido se eu não tivesse chamado vocês. A culpa é minha, Rebecca - Eu a envolvo em um abraço. Um vento gelado nos acolhe quando Rebecca fala, por fim:

- Acho que vou voltar para São Paulo. Tudo está dando errado desde quando eu cheguei, eu e Bianca brigando todas as horas, a invocação que foi por água abaixo, tudo está dando errado, Júnior.

- Nem tudo - a voz vem das nossas costas. Bianca estava em pé, viva. - A invocação não deu errado, eu consegui.

E foi então que percebemos um pergaminho fechado nas mãos de Bianca, ela sorria alegremente. O corpo ficar desacordado por alguns minutos depois do ato faz parte. Eu e Rebecca sorrimos de volta. Quando Bianca nos entrega o pergaminho, é como se tudo se iluminasse novamente. Segurá-lo é como uma coberta quente em um dia de inverno. Leio as primeiras palavras e meu sorriso se abre ainda mais. "Pergaminho de Davi." Nos tínhamos conseguido.

Filhos do SolOnde histórias criam vida. Descubra agora