Vilões

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Quando eu fiz 10 anos, ganhei da minha mãe um livro que contava sobre princesas de Alexan Prian. Com seus sapatinhos de cristais, sorriam e acenam para a multidão.

Nesse mesmo dia, lembro que sonhei que era uma e vivia de maneira totalmente diferente, uma vida de luxo, aonde eu não dormia em um colchão fino dividindo travesseiro com outra desafortunada.

Princesas encantadas são admiradas por sua beleza e sensatez, a pesar de que a maioria de nós nunca teve a sorte de chegar perto de uma. São sempre escoltadas por seu miniexército, e pensar que eu quase entrei nele, como minha ex-namorada.

A pesar do meu safismo, elas, em si, nunca antes tinham sido do meu interesse, não sei o que mudou hoje para que a desafortunada que eu divido cama seja agora uma da realeza.

Estou amarrando meus cadarços quando Mica acorda e se senta na cama.

Como será para ela dormir em uma cama tão desconfortável comparada a sua anterior?

— Aloha? Você disse que hoje não trabalharia. - Ela disse enquanto se espreguiçava e eu não consigo evitar achar seus bracinhos levantados algo fofo.

— Eu não vou, vou pegar água na nascente próxima daqui.

Assim que fico de pé e, de relance, vejo os corotes coloridos em cima do armário.
Hoje faz uma semana desde que a princesa bebeu demais e que comemos macarrão juntas.

Comemos macarrão depois disso, mas não foi a mesma coisa. Acho que houve um pacto silencioso entre nós de não comentarmos sobre aquele dia. Tenho medo de envergonha-la ao comentar, então apenas guardei aquele dia no meu coração.

Enquanto pego meu caldeirão e baldes, vejo Mica levantar da cama e começar a se arrumar com pressa.

— Por que está se arrumando? Ainda é cedo. - Estranho, até porque se eu pudesse voltar a dormir, eu faria.

— Por que mais eu estaria? Ora, porque eu vou com você.

— Mica...

— Por favor, Aloha, eu estou a dias sem sair de casa!

— Mas-

— Mas nada! Você mesmo disse que é perto daqui! - Ela diz com um olhar de cachorro pidão. - Qualquer coisa você me protege.

Ela quase me convenceu, mas com essa sua última frase, não mudo de ideia.

— Não vou proteger ninguém de ninguém, não! Só vou buscar água.

Ela bufa e eu me surpreendo, nem sabia que encantados poderiam bufar.

Saio de casa com o material deixando Mica para trás, que insistente, me segue. Tento ignorar e vou para trás de casa pegar o carrinho de mão, onde coloco os objetos que eu vinha carregando. Viro meu rosto e dou de cara com ela.

— Eu já tranquei a casa. - Ela diz com um sorrisinho malandro e mostra a chave de casa em sua mão.

— Você não vai desistir, vai? - pergunto, já cansada. - Entra aí.

— Entrar aonde? - Ela pergunta sem entender e eu aponto para o carrinho de mão.

— Eu te dou carona na ida, mas na volta você vai ter que voltar a pé porque vou ter que trazer a água.

Seu rosto se ilumina e seu sorriso se abre. Ela rapidamente senta no carrinho de mão e coloca os baldes no seu colo.

- Isso é tão legal! Melhor que qualquer carroagem. - Ela exagera animada e eu escondo meu riso.

Enquanto andamos, o sol se nasce. Estamos quase chegando quando baixinho ouço uma música cantada por Mica. Tenho vontade de parar tudo para ouvi-la mas ao invés disso, ignoro minhas vontades e finjo não ouvir seu canto.

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