Não vás

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-Não vas. - ele disse.

Deu mais um gole na garrafa de uisque e sorriu para mim.

Eu eu queria. Eu queria mais que tudo poder ficar. Poder ficar ali, naquele momento, para sempre.

Ele sabia que eu tinha que ir, mas também sabia que bastava um pedido dele, ainda que desajeitado, ainda que insignificante para ele, para me fazer pensar duas, três, quatro vezes e eu acabar por ficar. Arruinar o meu futuro por ele.

Sempre fora assim. Desdo primeiro momento em que nos conhecemos. Meses depois de o ver naquele churrasco na casa do Pedro, meses depois de conversa, numa noite desfocada, entre sorrisos, troca de olhares e bebidas pelo meio aconteceu.

Senti o seu cheiro em mim, senti-o mais perto, o sorriso dele era mais aberto, a pele dele mais macia do que deixara antecipar, e o seu beijo mais desejado ainda do que esperado.

E apartir dai o jogo do rato e do gato passou a ser o nosso dia-a-dia. Talvez fossemos demasiado ingenuos para querer acreditar que aquela noite não se voltaria a repetir, a realidade no entanto virou outra. Aquela noite passara a ser hábito em madrugadas desesperadas por carinho, desejo delacerante, caprichosas.

Ele egoísta, o mais egoísta que alguma vez conhecera. Eu perdida, de tudo. Do mundo e ainda que me custasse a admitir, por ele também.

Nunca tivemos a coragem suficiente para termos um relacionamento serio. Para nós aquelas noites nunca passaram de uma mera brincadeira, um habito mal apanhado, mal controlado... A verdade é que entre nós deixou de haver vergonha, passou a haver descaramento puxado, palavrão no meio de discussao, riso no meio do sexo, tesao no meio de conversa.

Perfeitos um para o outro e no entanto tao desligados um do outro.

E no dia em que eu quis mais, mais que uma amizade com beneficios duvidosos, mais que ser uma segunda opção para ele sendo que ele acabava sempre por ser a minha primeira opção, pior que isso, a minha opçºao preferida, quando eu quis ser mais que tudo isso para ele, quando eu quis ser dele, exclusivamente dele, ele disse me que não conseguia ser exclusivo, que não queria ser só meu, que não iria resultar.

Tudo bem, pensei eu e continuei, andei com a minha vida para a frebte deixando-o para tras.

E estava tudo bem. Tinha namorado novo e estava apaixonadona, tinha casa, cão, carro, trabalho e estava feliz, mesmo sem ele. Ia até me mudar para um outro estado para ir morar com o meu namorado.

Tava tudo bem mesmo, tudo na maior, até que eu decidi ir ao churrasco anual na casa do Pedro.

Eu esqueci-me que tinha sido lá que o tinha conhecido, que tinhamos trocados os nossos primeiros olhares, que tinha ouvido a sua voz rouca pela primeira vez, que tinhamos apanhado a maior bebedeira da nossa vida juntos, que tinhamos dançado agarradinhos nessa mesma noite, que eu tinha visto os seu olhos verdes gritarem pelos meus lábios e sentido o gosto dos seus pela primeira vez também. Tinha sido lá, com os pés dentro da pexina, com o pessoal bebado a dançar á nossa volta, com a garrafa de uisque que costumava estar na sua mão agora na minha porque ele deixara o vicio e eu pegara por ele, foi lá que eu lhe suspirei que o queria ara mim, Tinha sido lá que tudo tinha começado, tinha sido lá que tudo tinha acabado também mas eu tinha-me esquecido disso.

Já não me lembrava mais de nada disso. Nada mesmo, até me virar para beijar o meu namorado e ver uma garrafa de uisqui pousada na bancada. Por alguma razao, eu gosto de lhe chamar destino, eu fui pega-la. E ai, no momento em que a minha mão toca na garrafa, no outro lado da bancada alguém a agarra. Como se ela fosse correr, com medo de a perder ele agarrou-a com as maiores forças do mundo e não a largou nem mesmo quando reparou em mim a tocar nela também.

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