Prólogo

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Havia um trono tão reluzente quanto o sol, feito de ouro e adornado de pedras preciosas, muitas das quais os seres humanos sequer possuem conhecimento.

Havia um Deus Todo Poderoso sentado sobre ele, sua aparência impossível de ser descrita por esta ser mutável - aos olhos de um mortal poderia ter a aparência do seu pai ou de sua mãe, da pessoa que você mais ama. No entanto ali, sua aparência não possui um rosto ou um corpo, aquele Deus é luz.

Haviam sete arcanjos ajoelhados diante do seu criador, as cabeças curvadas em perfeita submissão.

E por fim, havia um querubim presente, de pé, recusando-se a ceder, recusando-se a aceitar seu mísero destino. Era considerado inferior quando comparado aos demais (Gabriel, Rafael, Uriel, Miguel, Barachiel, Jehudiel, Famiel e Salatiel).

Apesar de não pertencer á casta dos arcanjos, apesar de ser a primeira vez diante dele, o querubim não estava nervoso, não tinha medo ou receio, não curvava-se, não era o mais poderoso existente, mas era único.

Corajoso, destemido, fiel a si mesmo e com os seus semelhantes, fiel aos seus princípios; não possuía um trono adornado por joias, ou luz irradiando do seu interior. Contudo, ele teria um trono - era sua promessa para si mesmo e ele seria forjado em fogo e escuridão, as mesmas chamas que queimam em suas órbitas, serão as mesmas responsáveis pelo seu legado, e em vez de luz, ele iria mostrar para o mundo o seu poder, as trevas. Aquilo havia nascido com ele como uma benção, ou talvez uma maldição, e lhe forçava a lutar.

Alguns dirão no futuro, o maior pecado cometido pelo anjo fora a ambição. Porém, naquele cenário em questão, naquele momento diante do seu pai, diante dos seus irmão, ele respondeu: 

 — Meu maior erro foi sentir demais, questionar demais, quando nenhuma das opções fora permitida, não era aceito. Mas...  —  O anjo tomou uma pequena respiração, pela primeira vez estava demonstrando algo, sendo quase humano. O peito subia e descia rapidamente, os olhos verdes estavam incendiados, tomados por uma fúria mal contida e aquelas chamas tão familiares. A destra do homem ergueu-se, o indicador sem nenhuma cerimônia ou receio, fixando-se no trono e no Deus sentado nele e então ele continuou  — Você é o pintor, eu sou a obra de arte. Você nos fez dessa forma! — O tom era acusatório, mas havia certa mágoa escondida.

No final, poderia ser visto como um vilão e não se importava, não era egoísta e não tratava apenas de si mesmo, tratava de uma casta violada, obrigados a exercer um papel miserável, sem o reconhecimento merecido.

Ao mesmo instante, o ambiente foi invadido; o som de uma trombeta ao longe se tornou audível, anunciando o inevitável. Querubins estavam ali, posicionados atrás de seu líder, dentro de cada íris era possível visualizar o medo, excitação e principalmente, o sentimento de liberdade, alívio. Então, a voz do anjo voltou a ressoar:

— O erro foi unicamente seu, já está na hora de lidar com as consequências pai  — Ele finalizou o discurso, um sorriso lascivo delineando seus lábios, as orbes uma vez verdes foram tomadas pelo vermelho. Vermelho como sangue.

Ele se curvou, apoiado sobre seu joelho esquerdo enquanto dois outros querubins trajados para a batalha se aproximaram, e junto com eles jazia um objeto. Uma coroa, forjada por fogo e escuridão.

Se Deus transmitia o dia, a coroa mostrava a noite, com suas estrelas como lembrete; até mesmo nos lugares mais sombrios, há esperança.

O objeto foi posto sobre os fios dourados e brilhou, apagou e brilhou outra vez reconhecendo seu dono e este voltou a ficar de pé. Em contrapartida os anjos consigo se ajoelharam, milhares e milhares reconhecendo seu novo salvador.

Os olhares dos arcanjos se tornaram atônitos enquanto levantavam. Era para ser apenas uma reunião de rotina seguida de uma punição severa, feita pelo próprio pai e não uma coroação, eles murmuravam com certa descrença ''Pare com isso'', ''Não seja estúpido'', ''Ele vai morrer'', e nenhum dos querubins pareciam afetados pelas palavras. A voz do anjo coroado se fez presente outra vez, pronunciando palavras que ficariam gravadas para sempre, pois ali naquele instante, ele iniciou sua história 

— O meu nome, reconhecerão igual ao seu, ou até mais — Murmurou com certo sarcasmo encarando a luz que aos poucos estava sendo apagada — Eu sou Lúcifer, o novo amanhã. Eu sou um rei.

Era uma vez...

Um Deus Todo Poderoso que apenas observou e nada fez para impedir o filho rebelde. 

Sete arcanjos que lutaram e foram amaldiçoados a sentir, assim como todos os outros anjos. 

Querubins caíram. Eles perderam a batalha, entretanto não perderam a guerra.

E agora...

 um novo Deus e seu novo mundo. Há um trono forjado por fogo, e uma coroa de escuridão sobre fios dourados. Agora, há um novo lugar chamado Inferno e seu criador denominado Diabo. 

E algum lugar em Florença - Itália, uma garotinha de fios castanhos e olhos azuis assimilados ao branco sonha todas ás noites com a imagem dele sentado em seu devido lugar. Ela desperta assustada, com sua mamma lhe abraçando e sussurrando que tudo ficará bem, bastava rezar. Pobre mamma, se ao menos soubesse que suas preces nunca seriam atendidas!

Do outro lado do quarto, a imagem do crucifixo causa náuseas na moçoila, mas ela não ousa contar isso para a senhora que cuida de si, por isso apenas fecha suas pálpebras com força e murmura em baixo som, para o seu Deus.

 — O que você fez?  —  E este responde com convicção; ''O necessário''. 

***

Então é isto, oficialmente voltamos. Sentiram saudades?

𝐋𝐈𝐁𝐄𝐑𝐃𝐀𝐃𝐄 & 𝐐𝐔𝐄𝐃𝐀Onde histórias criam vida. Descubra agora