Capítulo 09 - Segredos e Promessas

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Uma das primeiras coisas que eu fiz quando cheguei no quarto, no primeiro dia de acampamento, foi pregar um calendário no armário, a fim de riscar dia por dia e ver o final se aproximar. Era uma espécie de motivação para não sair correndo e tentar pular os muros.

A verdade é que eu me esqueci de riscar vários dias quando o acampamento começou a ficar diver... agitado. Eu não acredito que vou assumir isso, mas eu estava até cogitando que não tinha sido tão péssima ideia assim ter aceitado participar. Porém, naquela quarta-feira após minha briga com Lila, corri até ele e risquei todos os dias atrasados com uma caneta vermelha e muita mágoa.

Nós já estávamos no meio da terceira semana. O que significava que faltava pouco mais de dez dias para tudo aquilo acabar. O que era bom, porque então eu poderia parar de pedir para aprender músicas tristes para tocar na flauta e parar de sugerir músicas mais triste ainda para apresentação final no canto... Já era difícil o suficiente ter que lidar com a mágoa de Bruno. Se aquele acampamento me tirasse minha melhor amiga, eu não saberia o que fazer.

― Amanda, essa música está muito acima do seu nível – minha professora insuportável de canto disse quando eu pedi para aprendermos Back To Black da Amy Winehouse. – Por que você não tenta Cai-Cai, Balão?

― Querida, só posso ensinar Someone Like You para turma se você resolver encarnar a Adele e me mostrar essa sua voz, que tal? – esse era professor Maurício, em mais uma tentativa (frustrada) de me fazer cantar.

― Tudo bem, Amanda? – esse era Eduardo, me cercando na quinta-feira, depois da aula de canto.

― Tudo – respondi, assustada com sua aparição. – E você?

― Também – ele respondeu, mas ficou me olhando daquele jeito de sempre, com um dos seus típicos sorrisos nos olhos que me diziam que ele sabia muito mais do que sua boca proferia. – Você quer lanchar ou algo assim?

― Não – respondi, sentindo a novidade que meu corpo adquiriu durante as conversas com Eduardo, também conhecida como pontada no peito. – Obrigada, mas eu preciso ensaiar flauta.

― Ou você precisa simplesmente cantar – ele comentou, dando de ombros.

― Você não tem ideia do que está pedindo – eu respondi. – Vou quebrar até os óculos dos nossos colegas de sala, além dos copos.

Ele riu, mas não falou mais nada. Agradeci interiormente, porque realmente não queria mais falar sobre aquilo. Eu tinha um certo pânico só de pensar em ter que cantar e ficaria realmente satisfeita se a professora insuportável de flauta me deixasse participar da apresentação, mesmo só tocando poucas notas. Meus pais nunca iam saber quais notas foram soadas por qual estudante e eu estava a salvo da total humilhação.

Da parcial provavelmente não.

Juntei folego para dar adeus novamente e rumar em direção ao meu quarto, mas então me lembrei que Lila poderia estar por lá. Na quarta-feira, depois da briga, ela não tinha trocado mais de três palavras comigo, mas estava com o rosto inchado, típico de quem já chorou muito. Eu queria poder me superar, superar meu orgulho ferido e consolá-la, mas eu estava mesmo muito magoada.

― Mas acho que meu ensaio pode esperar um pouco – me ouvi dizer. Simplesmente porque a ideia de passar um tempo com Eduardo era melhor do que continuar convivendo com Lila enquanto nós duas continuávamos daquela forma.

― Lanche, então?

― Lanche, então – respondi com um pequeno sorriso. – Afinal, quem resiste aquelas bombas de chocolate?

~~~

No dia seguinte, almocei com Igor e Ana Júlia, apesar de sexta-feira não ser dia de aula de flauta. Lila ainda não tinha voltado a falar normalmente comigo, nem pedido desculpas, Bruno continuava me perseguindo e Eduardo continuava almoçando com o casal 20, mesmo com suas sessões constantes de agarramento. Não que eu estivesse seriamente cogitando almoçar com Eduardo. O lanche já não tinha sido o bastante? Eu praticamente implorei para Igor e Ana Júlia para que eles almoçassem comigo.

Acampamento de Inverno para Músicos (nem tão) TalentososOnde histórias criam vida. Descubra agora