oito

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Luca se virou para Daniela, encarando a mulher que ele pensou que nunca mais veria outra vez nadando para perto dele com Lorenzo e vovó em seu encalço. O menino tragou uma respiração trêmula, sentindo suas mãos também começarem a tremer.

— Mãe? — ele perguntou em um sussurro incerto, sua mente agora uma completa desordem.

O que seus pais estavam fazendo ali, tão perto do vilarejo humano que tinham tanto medo? Estariam procurando por ele? Não, era impossível. Por que motivo eles o procurariam depois de tê-lo mandado embora, de terem se livrado dele?

Ao sair do Abismo com Alberto, ele estava tão concentrado em aproveitar sua liberdade e felicidade que não tinha se dado o trabalho de pensar sobre seus pais ou sobre como ficaria tio Ugo com sua partida, porque aquilo não era importante no momento e apenas o levariam a questões e dúvidas que ele não queria se aprofundar.

Naquele momento, porém, olhando para os olhos doloridos de seus pais e sua avó, ele sentiu todo aquele turbilhão de mágoa e ressentimento se remexer dentro dele, deixando uma sensação amarga em sua garganta ao se lembrar de tudo o que aconteceu na última vez em que se viram.

No entanto, antes que qualquer um deles pudesse falar mais alguma coisa ou se mover um único centímetro, Luca sentiu o braço de Alberto o rodear com proteção e possessividade, escondendo-o em suas costas, assumindo uma postura ao mesmo tempo defensiva e ofensiva. Seu corpo estava tenso como se ele estivesse preparado para uma luta, e Luca se surpreendeu ao ouvi-lo rosnar baixinho para os que se aproximavam.

E eles pararam, encarando o garoto mais velho com um misto de indignação e surpresa em seus rostos. Por cima do ombro de escamas lilases, Luca podia ver perfeitamente o rosto de Alberto fechado em uma fúria borbulhante e perigosa, os dentes à mostra e os olhos demonstrando claro aviso para que não se aproximassem ou se arrependeriam.

— Você deve ser o Alberto, o amigo de Luca — Daniela começou, impassível, mas o garoto não respondeu. — Nós queremos falar com o nosso filho. Então, se você puder nos dar licença...

— Luca não está aqui. Ele está no Abismo, então por que vocês não vão buscá-lo lá? — respondeu com desprezo, observando Daniela retorcer os lábios para ele.

Ele podia ler os olhos dela com perfeição, porque eram tão transparentes quanto a água do mar. Neles havia culpa, arrependimento e uma dor grande e profunda, e Alberto sabia que ela estava apenas querendo consertar as coisas. Mas ele não conseguia agir de outra forma, não depois de tudo o que ela fez Luca passar.

Alberto quase o perdeu.

Ele não conseguia mais imaginar sua vida sem o menino de olhos castanhos nela e o mero pensamento fazia seu peito doer de forma indescritível. E Luca era alguém tão, tão bom e gentil que jamais mereceria tudo o que passou, toda a dor que sentiu, o medo que o acompanhava mesmo estando agora tão longe do Abismo e que provavelmente o acompanharia para sempre, tragando-o de volta para as trevas e o frio em pesadelos que ele não conseguia evitar ou fazer parar.

E isso Alberto jamais perdoaria.

— Eu quero falar com o meu filho — Daniela exigiu outra vez, erguendo a voz quando o garoto não se moveu. — Saia da frente e me deixe falar com ele!

Alberto rosnou outra vez quando sentiu Luca tremer às suas costas.

— Talvez ele não queira falar com você.

— Como você... Quem você pensa que é?! E do que pensa de que está protegendo-o? De mim? A mãe dele?

— Daniela... — chamou Lorenzo, baixinho, segurando o braço da esposa quando ela tentou avançar em Alberto. A vovó observava a cena em silêncio, decepção e tristeza nítidas em seu rosto rosado.

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