CAMILA
"Tem certeza de que não quer ver o filme, Mila?"
Olho para a mesa apertada da cozinha em que passei a última hora me dedicando ao trabalho do curso de verão. Não que eu queira ou mesmo precise fazer isso agora, já que é só para daqui a alguns meses. Mas a outra opção é ficar juntinho com Matthew e Leah no sofá enquanto eles assistem a um drama independente sem sentido.
Adoro cinema indie, mas não do tipo que usa o termo como se apontasse um grande dedo do meio para Hollywood. Orçamentos reduzidos não são uma desculpa para produzir lixo, e, a julgar pelo número de montagens angustiadas, esse não passa de pura bobagem preguiçosa.
Fora que o sofá não é dos maiores. Me juntar a eles significaria ficar colada em Matthew enquanto ele passa a mão em Leah e me olha de modo sedutor. Tem sido assim ultimamente. Não acho que ele me queira de volta, mas parece ficar excitado com a namorada atual e a ex dividindo o mesmo espaço.
É nojento, mas estou tentando agir como adulta. Mas, se isso é ser adulto, é um saco.
No ensino médio — antes de tudo acontecer —, eu costumava sonhar com a faculdade. Imaginava grupos de estudo que iam até tarde, fofocas com as amigas, jogos envolvendo bebida e festas. Talvez alguns garotos aqui e ali, para que, quando eu conhecesse o cara certo, soubesse o que estava fazendo. Minha visão não chegava nem perto da realidade.
Em vez disso, meu círculo social consiste em um punhado de outros nerds do cinema, um ex-namorado que virou colega de quarto depois de me trair e agora um riquinho gostoso que provavelmente joga rúgbi e bebe uma adega inteira como passatempo.
Franzo a testa e afasto meu caderno. Tenho pensado muito mais em Shawn Mendes do que gostaria.
Como dupla de trabalho, ele é péssimo. Mas, como companhia, não tem sido tão ruim assim. Por um segundo naquele pub, pareceu até que éramos amigos. Ou pelo menos tão amigos quanto uma aluna de artes punk e um aluno de administração conservador podem ser. Porque, charmoso ou não, esse cara não sabe nada sobre mim.
Por que não voltou para casa no verão? , ele perguntou.
Essa é a única coisa que não posso fazer, Mendes.
Matthew e Leah poderiam começar a transar no sofá em que vou dormir e eu ainda não iria para casa. E, a julgar pela maneira como a mão de Matthew está aberta sobre o peito de Leah, esse cenário não é tão fora da realidade.
Alguém bate na porta, e nós três nos olhamos em expectativa. Aparentemente, ninguém está esperando visita, porque Leah e Matthew voltam os olhos para a televisão.
"Podem deixar", murmuro.
Pelo valor que estou pagando a Matthew para ficar aqui, o mínimo que posso fazer é bancar o mordomo.
Subo na ponta dos pés para ver pelo olho mágico, como faz toda mulher sã que mora em um prédio sem porteiro de Nova York. Meu coração palpita e eu volto os calcanhares ao chão. Subo neles de novo e olho outra vez, só para garantir.
Sim, ainda é ele.
"Quem é?", pergunta Matthew.
Eu o ignoro e abro a porta devagar, dando aos meus olhos tempo de se recuperar das brincadeiras plantadas pela minha mente. Mas não é nada disso. Shawn Mendes está do outro lado da porta, parecendo cem por cento deslocado em sua bermuda cáqui lisinha e em sua camisa azul listrada.