SHAWN
Se eu estava meio que evitando Camila depois da noite íntima do casamento da minha prima, passei a fazer isso descaradamente depois do beijo na biblioteca.
Um beijo que não tinha nada a ver com a farsa, com o filme ou com qualquer outra coisa além do fato de desejá-la. E de Camila me desejar também. Ou pelo menos foi o que pareceu na hora. Mas, então, ela pirou total e foi embora.
Não sei o que pensar ou o que dizer a ela. Por isso, venho fazendo o que qualquer cara de vinte e poucos anos com algum bom senso faria: estou dando bastante espaço a ela. Camila parece ter pensado a mesma coisa, porque nas poucas palavras que trocamos só mencionou que seu horário no café tinha sido estendido. Já eu tenho passado uma quantidade de tempo ridícula na empresa do meu pai, considerando que nem estou estagiando lá oficialmente.
Não conta como crédito de trabalho na faculdade, nem me pagam (não que eu precise disso), mas, para ser honesto, tampouco estou contribuindo muito. Na maior parte do tempo só fico atrás do meu pai, acompanhando suas ligações, observando a maneira como lida com os outros, de seus funcionários a investidores importantes. Continuo aguardando pelo momento em que vou me assustar com tudo isso e decidir que quero trocar meus ternos sob medida por colares de cânhamo e calças de linho com cordão na cintura para ir à Costa Rica trabalhar como guia turístico. Em outras palavras, fico pensando que vou acordar e me rebelar contra as expectativas — e as vantagens — que recaem sobre mim desde pequeno. Mas isso ainda não aconteceu.
É como eu disse a Camila naquele jogo idiota das duas verdades e uma mentira: estou mesmo animado com o que vou herdar. Talvez eu tenha entrado em administração porque meus pais me encorajaram, mas fiquei porque gosto de verdade disso. Gosto de como os números se encaixam se você souber mexer com eles. Gosto de como um negócio não é nada além do equilíbrio entre pessoas e dinheiro. E, pode me chamar de superficial, mas gosto até do cenário de arranha-céus modernos que espera por mim.
A Mendes Holdings é perfeita para mim.
Como Hailey era.
Como Camila, com suas calças cargo e suas sobrancelhas franzidas, não é. Por exemplo: esta manhã, quando trocamos algumas breves palavras no café, vi que ela estava com uns decalques de esqueleto nas unhas.
Esqueletos.
Não surpreende que eu esteja me escondendo na empresa do meu pai. Por que não fiz como em qualquer outro verão e estagiei lá oficialmente, em vez de fazer algo tão inesperado quanto um curso de cinema? Estou pensando nisso quando saio do elevador para o lobby da empresa e o vejo. E me lembro do motivo exato pelo qual quis evitar a Mendes Holdings.
"Shawn! Espera um segundo!"
Endireito a postura e penso em ir embora como se não tivesse ouvido. Mas tem muita gente olhando para que eu consiga disfarçar, e sou parecido o bastante com minha mãe para ao menos me importar com o que as pessoas vão pensar. Então, viro e olho para o cara que está transando com a minha mãe. Mas não sorrio como teria feito alguns meses atrás. Quando era como um segundo pai. Agora ele não passa do cara que está tentando substituir meu pai de verdade.
"Mike."
Ele me dá um bom aperto de mão das antigas.
"Faz semanas que não vejo você. Seu pai disse que está ocupado com um curso de verão."