Capítulo 21

248 25 2
                                    




CAMILA



Faz quase uma hora que estou na cama, mas não tenho ideia de quanto tempo faz que estou olhando o celular.

Não tenho ideia de quantas vezes reli o e-mail.

Não levei o telefone comigo quando desci para a festa. O e-mail chegou enquanto eu e Shawn estávamos sentados na praia. Relutante, eu o deixo na mesa de cabeceira. Já decorei tudo, de qualquer maneira.

Uma parte específica fica repassando na minha cabeça.

Embora eu saiba que nem de perto isso seja uma desculpa pelo que fiz, você tem que saber que não me aproveitei de você dessa maneira. Nunca dormimos juntos, Camila. Achei que soubesse disso. Sinto muito por não ter deixado claro.

Puta merda. Não fui estuprada.

O restante do e-mail não me importa muito. Um monte de explicações sobre como não foi ele quem drogou minha cuba[1]libre, apesar de não ter se "esforçado o bastante" para me impedir de beber. Que seus amigos não queriam fazer nada comigo, só achavam que eu podia "descontrair um pouco". Porque é disso que uma garota precisa para se sentir melhor quando sua mãe está morrendo, não é mesmo?

Apagar por completo.

Austin garantiu até que não tirou minhas roupas. Que eu disse que estava com calor e então me despi por completo só para, logo em seguida, dizer que estava com frio e me arrastar até sua cama. E que ele ficou cuidando de mim a noite toda.

É claro que há uma chance de que esteja mentindo. Mas não acho que seja o caso. Talvez Austin tenha se misturado por um tempo com um pessoal da pesada, mas me lembro de Selena dizendo que ele voltou a ser quem era por completo depois da morte da minha mãe. Ela inclusive comentou que Austin disse que queria ter me ajudado, mas eu não deixei.

É claro que não deixei. Não respondi a uma única mensagem, não atendi a uma ligação, e foram dezenas.

Penso no que Shawn disse antes sobre perdoar Michael. Não sei se posso perdoar Austin. Não sei mesmo. O cara ainda foi um babaca por deixar a namorada ou qualquer garota se meter naquele tipo de situação. Ele não merece uma medalha por não ter me estuprado enquanto eu estava drogada. Não posso perdoá-lo. Ainda não.

Mas posso seguir em frente. E sei exatamente com quem quero seguir em frente.

Saio da cama e vou até o espelho, feliz que o status de namorada de Shawn me garanta uma suíte. Olho meu reflexo. Nada bom. A umidade da praia deixou meu cabelo mais maluco que o normal, sem contar o que os dedos de Shawn fizeram com ele enquanto me beijava à porta do quarto.

Depois de ter visto o e-mail, fiquei abalada demais para tirar a maquiagem direito. Levando tudo isso em conta, meu visual não está dos melhores. Lavo o rosto rapidamente, pensando se devo voltar a me maquiar. Então, me dou conta de que seria ridículo fazer isso à uma da manhã. Não há nada que eu possa fazer quanto ao cabelo que não seja lavar e secar, então espero que ele considere o penteado sexy, e não maltrapilha. A realidade do que estou prestes a fazer me atinge enquanto escovo os dentes.

Vou invadir a cama de Shawn Mendes. E estou bem certa de que ele vai me querer esta noite.

Mas e amanhã?

O pensamento embrulha meu estômago.

Percebo que, apesar de estarmos tão próximos neste fim de semana, não falamos sobre a vida real. Nem sobre o amanhã ou os dias que viriam em seguida. Se fosse qualquer outra situação, poderíamos continuar assim. Todo mundo pensa que estamos namorando mesmo; ninguém precisa saber que só recentemente se tornou real. Mas agora estamos presos a essa história de Pigmalião. Posso não estar mais fingindo com Shawn, mas estou fingindo ser uma garota da alta sociedade. E não tem como ser assim para sempre.

A pasta de dente de hortelã não consegue remover o gosto amargo da minha boca, consequência do medo muito real de que os sentimentos de Shawn não tenham nada a ver com a Camila gótica que conheceu e tudo a ver com a Camila barbie que ele criou. Shawn quer a Camila barbie, e eu deixei de ser essa garota quanto tinha dezoito anos. O cara nem sabe que costumavam me chamar de Karla ou que eu adotei o sobrenome da minha mãe como um grande "foda-se" pro meu pai depois que ele casou com Amy.

Cuspo a pasta e respiro fundo para afastar as dúvidas. Shawn me conhece do único modo que importa. Tenho que acreditar nisso. Ele não teria me abraçado, confiado em mim e me beijado se não fosse o caso.

Convencida, abro a porta o mais discretamente possível, torcendo para lembrar qual é o quarto dele. Sempre imaginei que uma casa de veraneio seria mais como uma cabana ou um chalé, mas isso aqui é uma mansão.

A maior parte dos convidados também tem casa nos Hamptons (claro), mas o resto está ficando aqui.

De algum modo, imagino que não iam gostar de uma universitária entrando em seu quarto no meio da noite atrás de sexo.

Atravesso o corredor em silêncio na direção do quarto de Shawn, contando as portas na cabeça. Uma, duas... cinco... corredor à direita... Paro na frente da primeira porta à esquerda.

Minha mão paira sobre a maçaneta.

E, então, eu abro.

Gothic - ShawmilaOnde histórias criam vida. Descubra agora