Capítulo 2 - O começo.

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ANNE

Primeiro dia de aula.

Pra variar, já estou atrasada. Obviamente.

"O que poderia dar de errado ficar acordada para esperar meu pai chegar em casa?" Eu me perguntei ontem. Assim que fiquei acordada até a metade da madrugada, e ainda assim não consegui ver a hora em que ele chegou em casa.

Não faço ideia de onde minha mochila está, a deixei ao lado da minha escrivaninha. Tiro uma série de almofadas e cobertas do chão para procurar embaixo da cama, quando algo sai de debaixo da cama e pula em mim.

Para alguém que acabou de acordar, segurar um pastor alemão enorme no colo por puro reflexo, é bem surpreendente eu não ter caído no chão.

— Chase, por favor, por tudo que é mais sagrado, me diz que você não arrastou a minha mochila para baixo da cama — Praticamente suplico para o cachorro quando o solto em cima do colchão. Tateio o escuro debaixo do móvel até encontrar a alça da minha mochila, fico praticamente de luto quando constato que está completamente babado.

Minha mochila está vazia. Começo a revirar desesperadamente o quarto todo em busca dos meus cadernos e canetas. Encontro só metade dos meus pertences e os enfio na bolsa. Atrasada demais para procurar o resto ou me preocupar em secar as coisas.

No corredor, bato sequencialmente na porta do quarto do meu pai. Escuto apenas alguns resmungos em resposta. O uniforme dele está espalhado pela casa toda, sujo de terra e lama.

— As eleições tão chegando, não pega bem pro xerife chegar atrasado — As palavras que saem da minha boca são como mágica, no mesmo instante escuto passos pesados se arrastando até o banheiro do quarto.

Me dou por satisfeita por ter conseguido acordar meu pai e desço as escadas para tomar um café da manhã. E com café da manhã eu digo um cereal hiper açucarado e café instantâneo. Toda minha dieta em casa se resume a coisas que vem dentro de pacotes desde que minha mãe me abandonou.

Termino o cereal e deixo a louça suja na pia. Assim que subo novamente para meu quarto, dou de cara com meu pai no corredor. Está usando uma camiseta social branca amarrotada e encardida.

— Não vou nem estragar meu primeiro dia de aula com essa história. É a terceira vez só essa semana que isso acontece, e ainda é segunda. Eu vou a pé para a escola — Falo sem paciência para o homem e bato a porta do meu quarto antes de que ele possa inventar alguma desculpa esfarrapada.

Tiro meu pijama surrado e visto qualquer coisa que encontro no meu armário. Pego minha mochila parcialmente seca e saio de casa antes que meu pai possa tomar coragem de vir falar comigo.

Escola Hellster, uma iniciativa experimental do governo para propor uma reforma no ensino médio. Pallville, uma cidade de interior no litoral da Califórnia, não é a escolha mais óbvia. Mas, um bilionário egocêntrico que tá caridosamente financiando, e essa é a cidade natal dele, então aqui estamos.

A escola tem uma arquitetura no mínimo estranha. Um pentágono. Cada face da estrutura é destinada a uma área de ensino específica. Exatas, humanas, biológicas, esportes e artes. Existe um prédio central para apoio ao aluno. É o segundo ano de funcionamento da escola.

Estava caminhando até o setor de humanas para treinar redação, até que meu nome soa pelos autofalantes e me mandam ir para a orientadora. Normalmente, quando precisam falar comigo, o próprio diretor vem ao meu encontro. Quase sempre alguma coisa relacionada a quererem que eu seja o rosto propaganda da escola.

Assim que entro na sala de espera da orientadora, encontro um garoto que nunca vi na vida. O que é estranho nessa coisa toda, é que, por sua natureza experimental, a Hellster não admite novos alunos até o encerramento do ciclo de três anos dos primeiros.

O cara é, bom, comum, mas ainda assim parece diferente. Todas as roupas parecem customizadas. As calças são desfiadas e manchadas com várias cores diferentes, usa uma jaqueta jeans clara com uma pintura nas costas e pinceladas rápidas e neon nas mangas. Ele rabisca algum ser estranho com corpo de urso e cabeça de coruja num caderno de desenhos. O garoto escuta música em um volume tão alto nos fones que vaza para o cômodo inteiro.

Não preciso de nem três segundos pra descobrir que ele é o motivo de eu estar sendo chamada na orientação.

Punhal e GarraOnde histórias criam vida. Descubra agora