6. Anchor

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Carter

Ethan comprimiu os lábios, encarando a chuva cair com força contra o para-brisa. A luz fraca dos postes de iluminação trazendo um ar soturno e sádico para dentro do carro, junto com seu tom amarelado e a lua encoberta por nuvens grandes, escuras e brutais. Eu não conseguia soltar o volante, por mais que nós estivéssemos estacionados há mais de trinta minutos.

Meus olhos não se desviavam da rua, das gotas de chuva caindo sobre as poças e sacudindo os reflexos amarelos das luzes, dos guarda-chuvas passando para lá e para cá, das luzes dos carros, do movimento que as árvores faziam quando o vento empurrava seus galhos.

Ethan sabia melhor que qualquer pessoa que o silêncio era mortal, mas qualquer palavra poderia ser ainda pior. Ele virou o rosto para mim, seus olhos estavam pesados e tétricos. De alguma forma, ele tentava entender o quanto doía dentro do meu peito ou o quanto eu estava assustado.

— Vou estar pronto quando você estiver pronto — Disse ele e eu confirmei com a cabeça.

Mas eu não queria falar sobre aquilo. Estava enrolando voltar para casa porque eu sabia que meus pais perceberiam que tinha alguma coisa errada comigo e eu não queria ter que falar sobre aquilo com nenhum deles dois.

Ethan respirou fundo, se mantendo em total silêncio, imóvel, por algum tempo antes de franzir o cenho e virar-se para mim subitamente, como se sua mente finalmente tivesse lhe entregado uma boa resposta para tudo aquilo.

Ele sabia lidar com os problemas melhor do que eu, e sempre foi daquele jeito, mas eu duvidava que qualquer coisa que ele dissesse fosse me ajudar naquele instante.

Allison passou bem diante dos meus olhos e mal percebera que eu ficara completamente hipnotizado por ela, e, porra, como aquilo doía dentro do meu peito. Não deveria doer. Definitivamente não deveria doer e eu deveria parar de pensar naquilo, mas não conseguia, a imagem dela sempre voltava para a minha mente.

E todas as vezes em que eu pisquei desde que a vira novamente, tudo o que eu conseguia enxergar era ela, era seu sorriso, seus olhos, suas sardas, seu amor que um dia foi meu.

Eu ainda era capaz de me lembrar do que meu pai me disse aos meus dezessete anos quando o perguntei como ele descobriu que a mamãe era a mulher da vida dele. Ele me respondeu que descobriu aquilo quando tudo o que ele era capaz de enxergar quando fechava os olhos era ela, e, droga, eu enxergava Allison tão nitidamente que quase era capaz de tocá-la.

— Você deveria ter ido falar com ela — Ethan franziu o cenho. — Droga, Carter, por que você não foi falar com ela?

Eu baixei os olhos para minhas mãos presas no volante do carro. Eu não queria responder.

— Que grande merda, Carter, por que você não foi falar com ela? — Ele me perguntou novamente, mais incisivo e até irritado.

Balancei a cabeça negativamente, como se pedisse para ele ficar quieto. Eu sabia que, talvez, eu deveria ter ido falar com ela, mas e se ela não quisesse me ouvir?

— Merda, Daniel — Ethan vociferou, agarrando meu braço com força e puxando-o em sua direção, me obrigando a virar.

Eu o encarei com os olhos vazios, os dele, por outro lado, estavam cheios de raiva, inflamando cada vez mais. Ele estava tão puto que eu podia ver suas bochechas arderem e perceber que eu estava tão dolorido por dentro que mal conseguia reagir o deixou ainda mais irritado.

Ele agarrou a gola da minha camiseta com força, puxando-me como se quisesse que eu acordasse para a realidade.

— Seu inútil de merda — Ele grunhiu. Eu nunca tinha o visto tão irritado. — Seu completo e burro inútil de merda. Por que você não foi falar com ela? — Disse entre os dentes. — Não percebe o que você fez? Não percebe o que você está fazendo consigo mesmo? Olha pra você, Daniel! — Ele me empurrou, batendo o indicador no meu peito, com força. — Você ama essa garota e está deixando ela escapar!

Substancial |LIVRO 2|Onde histórias criam vida. Descubra agora