Obsidia

2. Não o tire de mim, por favor

Alexa Trovasky
Leilão Pritchett, Manhattan
12 de outubro de 1994 • 21:19

 Você me traiu Michael. Me deixou em pedaços com a ocultação do seu desvio de caráter. O que você quer que eu fale pra você? Quer que eu fale que senti saudade de alguém que me deu um pé na bunda só porque eu estava trabalhando? É sério? Você passava meses viajando compondo suas músicas e eu nunca reclamei, algumas vezes até viajei com você

 Então, eu vou exercer meu direito de também trabalhar porque no início da nossa relação eu deixei claro que eu iria trabalhar e me tornar a droga da mulher mais poderosa do mundo, e eu sou. Porém, para manter isso da mais trabalho ainda e era pra manter isso que eu trabalhei tanto. Que eu trabalho tanto

 Michael. Como eu odeio te amar. Odeio. Odeio tanto. Tem um homem lindo ao meu lado, não lindo apenas fisicamente. Ele é lindo de todas as maneiras. Sei que ele daria a vida por mim sem pensar duas vezes. Daniel tem me feito tão bem. Mas, pra mim ainda é tão recente. Se tiver uns cinco meses que nos separamos é muito

 Você já seguia em frente antes mesmo que eu ser comunicada. Michael, isso não se faz. Não se faz. Foi tão estranho me acostumar ao toque de outra pessoa. Eu gosto de mesmice odeio mudanças. Gosto de solidez

 Eu passei por um trauma tão forte na minha infância que, tudo que eu menos quero é perder as pessoas que amo. Eu, não gosto de mudanças porque mudanças nos tira coisas que estavam lá há tempos

 Eu não sei bem qual é o meu problema e se tem a ver mesmo com esse trauma. É tão difícil. Tão difícil não dormir na minha cama. Tão difícil não dormir com o homem que costumava roubar a coberta durante a noite

 Tão difícil não ser acordada no meio da noite para ir ver os vaga-lumes no jardim ou para subir nas árvores e ver o sol nascer. Eu sinto falta até das cantorias desafinadas. Das bombinhas de fedor, ele mastigando chiclete com a boca aberta porque gostava do som e até mesmo dos sustos que ele me dava quando eu menos esperava

 Onde nós nos perdemos Michael? Onde nosso amor tão puro ficou? Nós erramos em uma parte do caminho. Erramos feio. Mas, agora não importa mais. Acabou. Você já esta seguindo em frente e eu, bem, eu estou tentando, mas não sei se vou muito longe

 Não posso enganar Daniel. Se eu realmente não conseguir retribuir esse amor tão avassalador que ele sente por mim, então, não posso o enganar. Ele não merece ser enganado. Tenho que ser justa, por mais que seja doloroso. Não posso ser como Michael, não posso

— Oi gente, estão competindo pra ver quem pisca primeiro? — Dan pergunta em um tom engraçadinho me tirando dos meus pensamentos. Michael olha para o chão e faz um bico. Passa o dedo por baixo dos óculos e respira profundamente

 Daniel pega o meu copo cheio de uísque sem gelo da minha mão e o vira de uma vez. A conversa com Lisa não foi das melhores ou ele só esta com ciúmes de mim com Michael? Descobri graças a Marjorie que Daniel só bebe assim quando esta chateado com algo

— Vamos dançar? — pergunto a Dan que abre um sorriso para mim — Vem! — digo enquanto desço da cadeira, deixo o copo vazio de uísque no balcão e o puxando pela mão o levo até a pista de dança. I do, I do, I do, I do, I do do ABBA esta tocando eu amo essa música!

 Puxo Daniel pra bem pertinho de mim. Com nossos corpos colados dançamos lentamente. Permito-me encostar minha orelha em seu peito. Seu coração esta batendo tão rápido. Ele fica nervoso perto de mim ou o coração dele é uma escola de samba?

— Dan? Você esta se sentindo bem? — pergunto enquanto me afasto um pouco, seu rosto esta um pouco suado, como não percebi isso? — Quer sair daqui? — pergunto a ele que não me responde. Ele apenas se afasta bruscamente de mim e um pouco avoado anda para longe

 O sigo. Tento o alcançar, mas ele tem pernas bem maiores que as minhas. Ele se esbarra com algumas pessoas, mas não pede desculpas nem nada. Tem algo errado. Eu sei que tem! Sinto alguém me puxar pelo braço

— O que foi? — Michael pergunta preocupado. Entra na minha frente e coloca às duas mãos sobre o meu rosto — Você esta vermelha, esta sentindo algo? — aceno negativamente

— Acho que o Daniel esta passando mal — choramingo para ele que corre comigo atrás de Daniel que entrou no corredor de escritórios. Michael olha nas salas enquanto eu vou direto para o banheiro masculino. Se eu fosse um homem e estivesse passando mal eu iria pra lá!

 Bato na porta e chamo baixinho por ele. Nada. A porta se abre, um homem entra na frente e abre os braços. Ele parece assustado, muito assustado. Tento olhar para trás dele, mas não consigo, o que ele esta tentando esconder?

— Precisa chamar uma ambulância moça!  PELO AMOR DE DEUS! Chama uma ambulância senhora! Rápido! O juiz morreu! — o homem diz apavorado aos berros chamando a atenção de todos, inclusive de Michael que corre para perto de mim. O empurro o homem o tirando do caminho e entro no banheiro. Ao entrar, sinto tudo desabar em minha cabeça. Meu Deus. Não

 Minhas pernas falham. Ajoelho-me e encaro Daniel deitado de bruços sobre o chão, seu rosto esta em cima de uma poça de sangue. Sua boca esta entreaberta... Ele vomitou sangue? Sangue puro? Ele está vivo? O que aconteceu?