5. Minha razão para continuar viva

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Alexa Trovasky
Rancho Fundo | Goiânia, Goias
25 de dezembro de 1995 • 14:16

 Sentada na cara encaro a parede. Só agora a cólica passou. Passei a manhã toda com cólica, só agora deu uma pausa. Não é bem uma cólica forte, mas, ainda sim, é cólica e essa porcaria é horrível

 Levanto-me da minha cama bem devagar e ando até a porta. Saio e ando em direção a cozinha. O cheirinho de arroz com frango tá vindo aqui no corredor. Normalmente Téo se remexe todo quando eu sinto cheiro de comida, hoje ele não se mexeu tanto

 Eu estou começando a ficar preocupada com o meu filho. Pra mim não é normal ele não se mexer. Ele sempre se mexe muito. É muito agitado, tão agitado que nem parece ser filho de Daniel

— Bom dia — balbucio enquanto vou até à mesa. Ao me ver Daniel corre para mim e coloca às duas mãos em meu rosto. Faço uma careta para ele

— Alexa, sua boca esta branca! — ele diz enquanto olha para baixo. Ele olha para mim e arregala seus olhos. Olho para baixo. Sinto minha cabeça pesar só com esse movimento. Meu coração quase sai pela boca. Olho para Dan que esta com os olhos marejados. Isso é sangue? Eu estou perdendo o meu bebê?

— Téo, não me deixa você é tudo o que me resta — sussurro e tento respirar pela boca. Sinto como se o peso do mundo estivesse em minhas costas. Com uma dor de cabeça absurda eu tento dar um passo a frente, mas, não consigo. O que esta acontecendo?

— Ele não vai te deixar! — Daniel me tira do chão e corre comigo em seu colo — Téo vai nascer! Vai nascer e vai cuidar de você, vai te priorizar assim como você que vem pensando só nele durante todo esse tempo! — enquanto Daniel vai falando comigo, sinto a dor aumentar e meu corpo ficar cada vez mais pesado. Minha visão fica completamente escura... — FICA COMIGO ALEXA!

Maternidade Santa Joana | Goiânia, Goias
26 de dezembro de 1995 • 01:52

 Abro meus olhos. Uma imensidão branca invade meus olhos. Fecho novamente. Abro novamente, mas, bem mais lentamente. Olho fixamente para o teto branco. Minha visão vai se acostumando pouco a pouco. Tudo esta doendo

 Um gruído ao meu lado esquerdo me chama a atenção. Viro lentamente minha cabeça. É o meu pequeno. Faço um bico involuntário e começo a chorar. Ele está em um bercinho hospitalar bem ao lado da minha cama. Esta usando o macacão que dei a Daniel para anunciar o que o nosso pequeno estava a caminho

— Você finalmente saiu de mim — digo entre lagrimas. O cheiro do perfume de Daniel se aproxima. Dan se posiciona ao lado do bercinho e leva sua mão até a minha que esta sem soro

— Você acordou — ele abre um sorriso lindo — Fiquei tão preocupado com você, pensei que iria nos deixar — diz com sua voz embargada — Como você esta se sentindo?

— Eu estou bem, cheia de dores, mas eu estou bem — sorrio para ele e volto a olhar para a minha obra-prima. Que bebe lindo — Quando ele nasceu, peso, hora e tudo! Quero saber tudo! — levo minha mão até o bercinho. Téo agarra meu dedo, ele é forte igual à mãe

— Ele nasceu com peso normal, sem nenhuma doença. Nasceu as 15:30. Já chegou berrando. Eu e Michael cortamos o cordão umbilical. Até agora eu notei que ele é quetinho e só chora quando esta com fome e com a fralda suja! — ele diz todo orgulhoso

— Moleque esperto, nasceu na hora do lanche! — abro um sorriso ainda maior — Meu pequeno, se você vê a casa enorme que eu comprei pra gente. Ela é enorme mesmo, tem um balanço maravilhoso no quintal, em breve vamos fazer um parque e um zoológico por lá também para que você não queira ir para a casa do tio Michael o tempo todo porque Los Olivos e dentro do cu da Califórnia! — digo exageradamente e Daniel começa a rir

— Eu estou louco para ver como você como mãe, sem dúvida vai ser como aquelas mães que gritam pelos filhos até quando eles estão só na sala — ele diz entre risos

— Isso se chama, mãe Brasileira! — digo enquanto observo cada detalhe do meu pequeno. Ele tem os dedinhos mais lindos do mundo. Ele tem uma boquinha linda, ele é bem grande para um bebê recém-nascido. Mas também, minha barriga parecia a bola do Kiko

— Olha, você teve que ser submetida a uma cesárea, foi muito rápido e logo após cuidaram de você. Você pode ir embora amanhã e viajar bem, só daqui a seis semanas! Vamos todos cuidar muito bem de você, prometo! — ele murmura enquanto dá a volta e vem para pertinho se inclina um pouco — Posso te dar um beijo na bochecha? — ele pergunta todo apreensivo. Aceno positivamente para ele que traz seus lábios para a minha bochecha. Ele demora mais que um beijinho comum. Ele se distancia com os olhos fechados — Nosso filho é lindo, obrigado por trazer esse pequeno milagre ao mundo — seus olhos se enchem — Eu vou pegar algo para você comer já que você perdeu o natal! — ele diz enquanto vai até à porta

— O Quê? EU PERDI O NATAL? LOGO O NATAL TÉO?  VOCÊ ESCOLHEU NASCER NO NATAL? É SÉRIO? — digo olha para ele que sorri, ele sorriu? — AI MEU DEUS MEU BEBÊ LINDO! — grito toda boba. Nem sabia que bebês com poucas horas de nascido podia sorrir. Eu quero apertar ele. Esse foi o reflexo muscular mais lindo que eu já vi!

— Oi — Michael diz enquanto abre a porta. Ele está usando uma camisa vermelha e um chapéu em suas mãos — Você esta linda! — ele diz com um sorriso tímido. Se aproxima devagar. Se senta em uma poltrona ao lado do bercinho — Ele nasceu no natal, vai ser o meu motivo para comemorar o natal sem culpa — ele segura um sorriso — Você esta bem? Como você esta se sentindo? — pergunta em seu tom baixo e calmo

— Eu estou bem. Só estou com algumas dores porque abriram a minha barriga para tirar esse pedaço de perfeição de dentro de mim — digo dramaticamente — Você viu, perdi o natal. Toda aquela comida — faço um biquinho

— Ainda bem que eu estou aqui — ele diz enquanto tira algo do seu chapéu. Uma semana no Brasil e ele já aprendeu a carregar as coisas em vasilhinhas? A vasilha que ele tira do chapéu é média, não é pequena demais e nem grande demais — Aí tem peito de peru, carne assada e linguiça assada. Tem um pouco de arroz amarelo e feijão marrom, que eu ainda não sei bem o nome, mas eu vou aprender — ele diz em um tom tão fofinho

— Se eu não tivesse ponto na barriga eu pularia nos seus braços agora mesmo — digo sedutoramente para ele que segura um sorriso e olha para o outro lado. Pego a vasilha, ele tira do bolso da calça uma colher e também me entrega, ele sabe que eu odeio comer de garfo! Ele dá a volta, levanta um pouco a parte de cima da cama. Dói um pouco, mas, eu prefiro ficar assim do que deitada o tempo todo. Ele sobe na cama, deita de lado e coloca sua cabeça em meu ombro. Permanecemos assim, em silêncio. Só se escuta Téo fazendo gruídos e eu comendo meu jantar de natal.

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