IV

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Seu processo é lento. O sol os fazem cavar covas, onde Nezuko se envolve ao seu redor, os impedindo de partir. Enquanto ela dorme, ele pensa, sobre o que fazer agora, para onde ir, como cumprir sua promessa.

Com seu conhecimento prévio, ele sabe que não há uma cura conhecida, não pelos caçadores. Pensar na corporação o preocupa, durante os dias que se seguiram à partida da montanha, ele foi cuidadoso em cobrir seus rastros, paranoico pela possibilidade daquele caçador ainda os perseguir. Mas ele sabe que não pode continuar, não quando a urgência de trazer sua irmã de volta lhe tira o sono e aperta o peito.

Ele precisa caçar, não demônios comuns, esses não teriam as respostas que busca, mesmo aqueles mais próximos de Muzan, provavelmente não o teria, mas por menor que fosse a possibilidade, era alguma coisa e seria por lá que ele começaria. A possibilidade de encontrar seu irmão o deixa mais desperto, seu coração está disparado, ele nunca havia tido um ataque de pânico, como Tanjiro, um menino tão empático e emotivo, essa possibilidade é bem real, então ele conta as pequenas rachaduras no solo, o gotejar no fundo, até que aquela tempestade em sua mente e peito se torne uma garoa.

Havia algo que necessitava fazer antes, naquela noite, enquanto lutava, seu corpo desacostumado ao combatente, foi mais lento que lhe era familiar como Yoriichi. Se ele tivesse continuado como humano, seria necessário treinamento para fortalecer seus músculos e expandir seus pulmões. Agora, entretanto, ele era algo como um oni, com capacidades físicas desconhecidas, seria sábio testar seus limites antes de partir em sua empreitada.

Seu olhar, repousou sobre a suave luz na abertura da cova, provavelmente era um pouco depois do meio dia, o sol estaria no ápice. Com cuidado, ele se desembaraçou dos braços da irmã, em resposta ela resmungos e se enrolou, mas não despertou. Carinho esqueceu seu peito, um alento em meio às falhas.

Ele engatinhou até a abertura, parando antes de tocar a luz. Em seu íntimo, Tanjiro sabia que não queimaria, contudo, havia ainda um receio, se aquela sensação fosse equivocada, Nezuko estaria sozinha. Com cautela, ele estendeu sua mão, seu olhar fixo a pele exposta. O toque quente fez a pele formigar, mesmo o sangue sob ela reagiu, porém, quando os segundos se tornaram minutos, ele continuo lá, inteiro, sem dor ou fumaça.

Fora da cova, a floresta nevada o cumprimentou e por um momento ele apenas permaneceu, sentido o sol, o cheiro da neve e madeira. Não havia cidade próxima, povoado ou vila. Tanjiro havia sido cuidadoso, não querendo tentar a irmã, a trazendo dor desnecessária. Após sua rápida meditação, ele sacou a lâmina nichirin, o azul na lâmina brilhou na luz quente, um tom que lhe era errado, quando negro e carmim o cumprimentou toda uma vida.

Por mais que ele repugnasse a violência, ironicamente, o chamaram de gênio, prodígio. Sua maestria com a espada, capaz de superar mesmo os tutores. Tomando forma, ele respirou, deixando seus músculos se acomodarem, a lâmina estranha em punho, pronta, e então, ele dançou.

Havia sido um erro, Muzan pensou tê-lo contido, quando em realidade, o tornou mais mortal. Seu fogo, derretendo a neve, seus golpes, cortando mesmo a pedra mais dura, sua velocidade aquém do que já foi.

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Quando a noite cai, ele não está cansado ou mesmo dolorido, em realidade, ele sentia como se pudesse dançar para sempre, como o pai, naquelas noites de inverno, como ele mesmo, em uma outra vida e tempo. O que o distraiu, foi a irmã que emergiu da cova, seu olhar baixo e um pouco sonolento.

- Nezuko.- Ele a chama, acenando levemente em expectativa.

Ela resmunga um pouco e corre para ele, se jogando em seus braços abertos.

- Ouça, teremos que partir agora, possivelmente nos aproximar de alguma cidade, há algo que preciso fazer.- Tanjiro explica, enquanto acaricia seus fios bicolores.- Você ficará bem com isso? Prometo que vou protegê-la.

A irmã o aperta mais, grunhidos suaves simulam sua resposta. É tentador se afundar naquele calor, naquele conforto, esquecer os problemas, deixar o peso de duas vidas fora de seus ombros. Ele não faz nada disso, não haverá paz para ele, como da última vez, o peso é muito para se desfazer e esquecer. Dessa vez, ele cumpriria sua promessa, nem o tempo o impediria.

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A cidade que eles avistam, é maior que aquela aos arredores da montanha onde cresceu. Não deveria surpreende-lo, energia, luz elétrica, era algo que Tanjiro já havia visto mais de uma vez. Contudo, suas memórias como Yoriichi, são mais vividas, há mais para considerar, para moldar personalidade e conhecimentos. Mais de uma vez, ele se ver como um homem adulto, este que viveu 400 anos antes, ao invés do adolescente Tanjiro.

Quando pensa sobre isso, talvez devesse se preocupar, temer pela loucura de ter duas personalidades convergindo e memórias se sobrepondo. Ele não se agarra a essas questões, não quando algo mais importante caminha ao seu lado. Não importava o que fosse se tornar. Tanjiro ou Yoriichi, ele ainda protegeria e salvaria sua irmã.

Por mais uma vez, ele ajeita as vestes roubadas, garantindo que está tudo bem. Foi com certo pesar que ele furtou roupas, estas posta para secar nos varais de uma propriedade mais afastada da cidade, em compensação, ele deixou peixes frescos e um javali recém caçado. Agora sem manchas de sangue, sem cortes, sem lama endurecida, o desconforto persistente amenizou, algo tão pequeno que fazia toda a diferença.

- Nezuko, vamos entrar agora, se for demais, você deve me avisar e sairemos imediatamente.- Seus olhos são fixos ao da irmã, buscando por qualquer desconforto. Assim como, se certificava de que ela o compreendia.

Pela expressão, a irmã parecia chateada, com um bufo, ela agarrou sua mão, o puxando. Tanjiro sabia que se ela pudesse falar, estaria o repreendendo pelo comportamento super protetor. Quem poderia julgá-lo? Havia muitos pesos em seus ombros, muitos cicatrizes em seu peito, estar paranóico, era um dos males menores.

Quando a cidade os cercou, foi uma sobrecarga em seus sentidos. Havia muitos cheiros, muitas pessoas, muito barulho. Nezuko pareceu tonta, entretanto, não houve sinal do comportamento agressivo inerente aos recém transformados, pelo o que foi grato. Era irônico, como dessa vez, mesmo não sendo gêmeos, sua irmã guardava características tão incomuns quanto as suas, o que lhe traz sentimentos conflitantes.

Segurando mais forte a irmã, ele a puxou levemente, um pouco cambaleante, ela o seguiu. Costurando por entre tantas pessoas, com a pele formigando e o estômago embrulhado, ele buscou por um canto mais vazio. Quando em um beco estreito e húmido, ele parou, expirando e inspirando, aos poucos dominando as sensações em rebuliço.

- Bem, acho que poderíamos ter começando por um lugar mais calmo.- Comentou um pouco sem graça, o resmungo da irmã foi sua única concordância.

Ao mesmo tempo, mais centrado em si, um detestável cheiro se sobrepôs aos cheiros de óleo, esgoto, perfumes e suor. Não como o de Muzan, mais fraco, mas definitivamente o de um oni. Não uma de suas luas também, ele sabe que não seria tão simples achá-los, mas ele tinha um plano. Um plano imaturo, mais uma aposta que algo concreto.

Com a palma no punho da espada, Tanjiro se preparou, deixando de lago a tristeza e ressentimento, o desgosto por ter que machucar, matar, lutar. Desde sua primeira infância, desde aquela primeira luta, ele soube que jamais gostaria de se tornar um samurai, de ter que infligir dor a outro. Nenhuma dessas questões importava a muito tempo, ele já havia chegado muito longe, tão profundamente envolvido que a paz não era seu destino. Nunca foi, nem antes, nem agora, por mais que a desejasse.

Essa noite, ̶Y̶̶o̶̶r̶̶i̶̶i̶̶c̶̶h̶̶i̶ Tanjiro sairia a caça.

Sol Nascente (Hiatus)Onde histórias criam vida. Descubra agora