Fora da Lei

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Raissa 💖

Luciene: Ela é durinha, tem quantos meses mesmo?

Raissa: Três.

Luciene: É, as crianças de hoje em dia são assim. Daqui a pouco já tá andando, você vai ver, e essa vai dar trabalho pra mamãe, vai chamar muita atenção de tão linda que é.- Eu sorri fraco.- o que você acha que ela tem do pai?

Raissa: O olhar, o formato do olho é o meu, mas tem hora assim que parece até que é o Matheus me olhando quando ela fixa o olhar em mim!

Luciene: Ela tem o nariz dele também, eu achei, tu acha? - Virou a neta pro João.

João: Acho que ela é ele todinho, parece um pouco com o Jefferson quando era novinho assim também.

Deus me livre minha filha parecer com aquele falido filho da puta!

Nair: E como segue as coisas minha filha? Foi dura a sua recuperação né? - Assenti.- é, mas tudo passa. Tá aí bem, a menina também, tem certas coisas que a gente tem que passar mesmo.

Raissa: Tudo bem dona Nair. Foi dura mas passou, aquela época que a senhora me viu eu tava muito ruim, quem fazia tudo era minha mãe, foi horrível.

Nair: Pegou trauma? Vai querer pegar barriga mais não?

Raissa: Eu penso que foi só uma má experiência, sabe? Não quer dizer que vai acontecer outras vezes, mas eu não quero outro filho não, uma tá bom demais.

Luciene: Qual foi sua experiência? O que aconteceu?

Nair: Eu não te contei mulher que ela ficou ruim? Ficou em cima de uma cama moída, parece que tá doida, depois a velha sou eu!

Luciene: Falou, mas eu quero ouvir dela, não pode não véa? Eu hein.

Comecei a contar assim por alto e ela entretida na situação, perguntando mais e mais. Entraram no assunto de parto, as duas contando como foram os delas.

Nair: Você sabe que eu tenho seis filhos né? - Falou comigo e eu concordei.- era pra ser sete, mas um morreu ainda criança. E de todos, o que menos eu sofri foi o desse aqui.- Apontou pro João.- deve ser por isso que esse é o que eu me dou bem, porque teve uns aí que me maltratou na hora de parir também.

João: Pra você ver Raissa, meus irmãos nenhum quer saber dela. Não liga pra perguntar nada, nem se mamãe tá bem, se precisa de alguma coisa! Isso porque são seis, mas é como se ela tivesse só um.

Raissa: É sempre assim, a pessoa ter um monte de filhos e achar que por isso nunca vai ficar sozinha é a mais pura ilusão. Tive uma, quero permanecer com uma, e se um dia ela me largar aí é da cabeça dela. Por mim seria meu bebê pra sempre, mas eu sei que vai crescer, passar de mim, é o que acontece....

Luciene: É isso mesmo, filho cresce e quer seguir a vida.- Eu bem olhei pra cara e ela percebeu.- acho que eu já errei bastante nisso, coisa que eu não podia jamais ter feito eu fiz, isso me envergonha.

Ela disse isso eu fiquei só pensando em como as pessoas são né cara? Tudo que o Matheus mais queria era isso aqui, a gente sentado numa sala conversando com a família dele, e isso nunca aconteceu com ele em vida.

Todo mundo fala que nunca é tarde pra se arrepender, mas tem certeza que é assim mesmo? Porque isso aqui, que tá acontecendo hoje, podia ser comum entre a gente e nunca foi! Precisou o filho partir, não estar mais presente em vida entre nós pra mãe dele superar o orgulho!

Eu penso e vou continuar pensando, do que vale? Agora é sim tarde demais. É tarde porque nunca vai ser uma coisa saudável, eu nunca vou me sentir a vontade na frente dela e isso é notório.

Passou a vida me humilhando, me apontando, dizendo inverdades, fazendo cabeça de quem tivesse por perto pra não gostarem de mim. Eu nunca vou conseguir esquecer do dia que eu liguei pra saber do Matheus depois do que tinha acontecido aquela vez e ela me humilhou, como sempre.

Mas foi uma humilhação que passou dos limites, e eu me torturava pensando que eu nunca fiz NADA pra ser trata daquela maneira. A maldade dela em falar do meu corpo, em ser baixa pra conseguir me ferir eu nunca vou conseguir esquecer e espero que as pessoas entendam o meu lado.

Eu tô aqui nem é por ele, porque se fosse pelo Matheus, eu teria me espremido antigamente pra caber nessa sala. Só eu sei do quanto ele pedia, só faltava implorar, mas eu não fazia, então não é por ele. É pela minha filha, de onde ele estiver, também sabe disso.

Por que a pessoa teve que deixar tanto tempo passar pra dizer que se envergonha? Você ver as pessoas dizendo o tempo todo que a vida é um sopro, e realmente é. Mas o ser humano é tão estranho né? Parece que esperam alguém morrer pra lembrar que o amor e o respeito são primordial.

Hoje só Deus sabe do coração e do que ela sente, se é sincero ou não só ele sabe, não vou julgar da mesma forma que ela fez comigo a vida toda. Mas infelizmente foi tarde demais sim!

Como viver sem a chance de uma resposta? Com a sensação de que podia ter sido diferente mas não foi por uma escolha sua? Matheus não pode mais responder. Falam tanto de perdoar, de fazer por onde, mas só fazem numa situação dessa mesmo, quando é tarde.

Eu imagino a dor que ela sente em ter perdido o filho e também até imagino no arrependimento dela. Da pra ver a dor, a culpa no olhar, só que infelizmente teve que esperar acabar pra se libertar do que tanto prendia ela.

Enquanto ela procurar, eu vou fazer essa ligação entre ela e a neta, só que no dia que ela parar de pedir também não irei ir atrás, vou estar fazendo esse vínculo enquanto minha filha é total dependente de mim. Quando a Maitê souber como e onde encontrar a vó, ela que vai decidir se quer ir atrás ou não.

Não espero chegar aqui domingo de tarde, sentar e esquecer da vida, não espero ter uma "relação" com ela. Acho que o que tem que haver, é só o respeito que não existiu todos esses anos, porque o que tinha que acontecer já não faz mais tanto sentido sem ele aqui.

Luciene: Raissa, obrigada por isso mais uma vez tá? - Falou quando eu já estava de saída.- do fundo do meu coração, eu te agradeço muito por me deixar fazer parte disso. Eu tenho vivido dias difíceis, essa menininha foi a única que me deu alegria, amor...de onde ele estiver, deve também estar em paz, os filhos dele tem mães maravilhosas.

Raissa: Não tem que agradecer! - Ela começou a chorar.- acalma o seu coração. Fica bem, não foi nada demais ter vindo aqui pra você conhecer ela.

Luciene: Eu choro de saudade do meu filho, de dor, arrependimento, medo dos meus netos crescerem e acabarem descobrindo a pessoa que eu fui. Não coloco a culpa em ninguém mais além de mim mesma. Sei que é tarde, e como eu sei.- Tentou secar as lágrimas.- acho que até o dia da minha morte, vou me torturar por isso. Posso ter recebido o seu perdão, o do meu filho, o perdão de Deus. Mas eu nunca vou deitar a cabeça no travesseiro e conseguir ter paz. Isso não existe mais em minha vida, agora eu vivo totalmente apagada, sem luz!

Quando ela disse isso eu até tentei abrir minha boca, mas não tinha o que dizer, eu não sabia o que falar pra essa mulher.

Voltei pra casa com um turbilhão de sensações, minha filha cochilando, eu aproveitei pra tomar um banho rápido e assim que terminei de comer escutei o chorinho dela. Sentei no sofá da sala com ela nos braços e comecei a dar mamar, ela logo se acalmou. Alisei a testa dela, observava os detalhes da Maitê e quando fui perceber eu estava chorando em silêncio.

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