Capítulo 1

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– Ai! — gritei ao sentir mais um maldito pernilongo me picar. Meu pai poderia pelo menos ter me deixado na sede, mas não. Só porque eu o chamei de velho louco, ele resolveu me deixar no meio da estrada. E lá estava eu: os saltos atolando no barro, as rodinhas das minhas malas não deslizavam na grama, estava com sede, suada, cansada e...

— Ai! Isso não é um pernilongo, mais parece um pterodátilo! — gritei com raiva novamente.

Olhei de um lado para outro e percebi que não havia ninguém. Nem uma viva alma para ouvir minhas lamúrias ou me ajudar a carregar minhas malas Louis Vuitton. Tirei os óculos escuros para enxergar melhor, mas não via a casa. Mais uma vez amaldiçoei meu pai por me fazer andar tanto. Ele ia me pagar com cada centavo do limite do meu cartão de crédito. Ah, se ia!

Andei por mais uns vinte minutos e tenho certeza de que bolhas estavam se formando nos meus pés delicados. Então, avistei a casa principal. Meu Deus, como aquela velharia era grande. Quando criança, eu passava as férias lá, mas, como odeio a vida fora da civilização, meu subconsciente deve ter bloqueado essas memórias inúteis. Um bem que ele me fez.

Coloquei a mão na testa para fazer sombra no rosto e apertei os olhos para ver se enxergava um pouco mais à frente. No mínimo, devia estar uns quarenta graus, e na sombra.

— Graças a Deus, alguém — falei sozinha.

Comecei a gritar, quando vi um homem saindo de um galpão próximo à casa.

— Ei... Ei... — Acenei freneticamente para que ele me visse. — Seu surdo! — gritei ainda mais alto, pois o desgraçado estava subindo no cavalo sem nem me olhar. — Até que enfim! — falei, soltando as malas no chão e colocando as mãos na cintura, assim que notei que ele tinha me ouvido.

Quando o homem começou a caminhar em minha direção, percebi que ele era jovem, talvez uns 25, 26 anos. Alto, corpo bem-definido, e eu não conseguia identificar a cor dos seus olhos. Quando ele chegou mais perto, fiz uma careta e fechei o nariz com os dedos.

— Argh! Que nojo! Já inventaram uma coisa chamada banho, sabia? — avisei com a voz fanha.

O estranho me olhou de cima a baixo e deu um sorriso. O enorme chapéu que ele usava fazia sombra em seu rosto, impedindo uma análise mais detalhada, mas eu estava tão cansada que não tinha forças para tentar descobrir o que havia por baixo do acessório.

— Pegue minhas malas — ordenei e voltei a caminhar. — E tome cuidado, são duas Louis Vuitton.

Quando me virei para adverti-lo, notei que o idiota nem tinha se movido.

— Por. Acaso. Você. Entende. Português? — Falei cada palavra pausadamente. Esses caipiras não estão acostumados com a civilização, então talvez ele estivesse com medo de mim. Com uma das mãos ele levantou a aba do chapéu e me olhou. Santa promoção! Que olhos eram aqueles? O castanho mais límpido que eu já tinha visto na vida.

Ele me deu um sorriso torto e pegou as malas, me deixando estática por um momento, encarando o. Despertei do transe inicial e marchei em sua frente, e o estranho continuou sem abrir a boca. Devia ser mudo, era a única explicação. Ou ficou mudo diante da minha beleza. Não me espantaria, pois não seria a primeira vez que um homem perdia a fala depois de me ver. Sou extremamente bonita. A parte de mim de que mais gosto são os olhos. Herdei da minha mãe o castanho que eu tanto adoro.

Há quem diga que são cor de mel, mas eu prefiro que sejam castanhos. Meu cabelo é de um preto muito escuro, não muito longo, um pouco abaixo dos ombros. Magra, alta, rosto perfeito, pele macia, corpo atraente e muito, muito rica. Ou seja, sem defeitos. Por isso causo esse efeito nas pessoas. Era de se esperar que nem o caipira resistisse.

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