Se não era o emprego dos sonhos eu não fazia ideia do que poderia ser, mesmo que minha chefe fosse algumas semanas mais velha, ela havia me cedido um quarto na casa, comida.. Ao que parecia era só se eu fizesse, não reclamei porque eram poucas as oportunidade em que eu podia cozinhar e eu amava fazer isso. Depois que consegui fazê-la comer um pouco mais do que um filhotinho de cachorro comia, ela foi descansar, aproveitei para arrumar o encanamento da pia que estava entupido. Sam era boa em muitas coisas, tinha feito milagres pela casa velha para que parecesse habitável, era possível ver um pouco dela em cada canto desde a escolha da cor da tinta, as flores no jardim externo.
Continuei com a limpeza e organização da sala, cozinha, fiz o mínimo de barulho possível e quando o relógio soou o alarme do remédio dela, corri para desligar. Segurei o aparelho velho entre os braços tentando silenciá-lo quando consegui não me movi, esperando para ver se ela apareceria, nada aconteceu. Enchi um copo com água, separei o remédio, alguns biscoitos e uma xícara de chá.
Caminhei pelo corredor, quando levantei a mão para bater à porta ela se abriu, meu coração parou. Samantha estava caída ao lado da cama coloquei a bandeja de qualquer jeito no chão deslizei até ela, o médico havia alertado que os primeiros dias eram de extremo cuidado, pois a concussão poderia se tornar um traumatismo, pelo exame feito no hospital ela já havia tido outra concussão, uma maior, a pouco mais de um ano.
- Sam? - chamei tocando em seu ombro, ela gemeu, mas não acordou. - Merda, Samantha? - acho que gritei, porque seus olhos se arregalaram, ela se sentou depressa olhando em volta apavorada.
- O que, oi? - ela estava dormindo?
- Você estava caída ao lado da cama, bateu a cabeça novamente?
- Não... - ela levou a mão à cabeça tocando o curativo. - Durmo no chão. - sentei de frente para ela chocado.
- Você dorme no chão. - repeti para mim mesmo, ela assentiu. - Tomei um susto do caralho, achei que dessa vez tinha morrido. Pode não morrer? - passei os braços envolta dos joelhos encarando os olhos dourados à minha frente.
- Eu estou tentando, muito. - pela primeira vez havia um tom de humor em sua voz, isso me fez relaxar um pouco, levantei, peguei a bandeja com a água e o remédio lhe entreguei, ela sorriu ergueu o copo em brinde e engoliu o comprimido.
- Como está se sentindo, de verdade? - ela encolheu os ombros, os olhos se fecharam com força ela estava examinando a si mesma. Já tinha percebido que ela fechava os olhos com força para pensar, mordi o lábio satisfeito que não havia perdido a habilidade de ler as pessoas, até mesmo aquelas que não falavam muito.
- Bem, não estou com dor. Ainda me sinto zonza, um pouco fraca, mas o médico disse que é normal, até o hematoma diminuir.
- Precisa que eu faça alguma coisa para você? - ofereci, pegando o copo de sua mão ela balançou a cabeça em negativa. - Posso te perguntar uma coisa? - ela voltou a fechar os olhos com força, repuxou o lábio mordendo o por dentro, estava nervosa. - Tudo bem, não é nada.
- Pergunte, se eu conseguir responder tudo bem, senão...
- Não vou insistir. - prometi e não iria, por mais que a curiosidade me causasse coceira e eu quisesse arrancar com as mãos iria respeitar. - Mais cedo você teve uma crise... - parei para examinar sua reação ao rumo da conversa ela assentiu começou a mexer distraidamente no anel de prata que tinha no anelar direito. - Sabe o que causou?
Ela inspirou o ar com força e expirou devagar, os lábios se afastando para contar, estava tendo uma crise naquele momento, estava tentando se acalmar, peguei a mão que estava com anel e apertei gentilmente atraindo sua atenção para mim.
- Você está segura, Sam, está em casa. - ela quase sorriu, olhou para nossas mãos, soltou o ar entre os lábios.
- Tenho medo do mar. - ela sussurrou envergonhada, me aproximei mais dela, afastei as mechas de cabelo que estavam em seu rosto, o cheiro cítrico e limpo dele me fez desejar bolar para fumar sentir a brisa que seria, ainda estava sob efeito do último, Deus.
- Tudo bem, estávamos passando pela costa naquele momento. Por isso sempre faz o caminho maior de volta para casa? - algumas vezes tinha percebido que ela seguia para o alto da ilha, no sentido mais afastado do mar quando saia do restaurante.
- Não foi sempre assim, só não consigo mais, acho que nunca mais. - falou tão triste que meu peito doeu.
- Não é verdade. Você pode sim, não se cobre tanto. - ela levantou os olhos para os meus. - Se existe alguém que pode é você, você enfrentou os kooks mais de uma vez sozinha, você transformou uma velharia em uma casa... Todos temos um passado que muitas vezes marca a gente de formas dolorosas, mas você não é definida por isso, não deixe que isso defina quem você é. - lágrimas se formaram em seus olhos quando é que eu havia me tornado tão poético?
- Alguns dias atrás, se me dissessem que JJ Maybank estaria me reconfortando eu teria rido na cara da pessoa.
- Eu tenho uma fama, não espalhe por aí, acabaria com minha pose de mal. - pisquei e ela sorriu novamente tirou a mão da minha seus olhos me examinando. - O que?
- Nunca pensei que você era mal. Encrenqueiro? Com toda certeza. Sei que essa ilha faz com que a gente precise desempenhar papéis que não nos pertencem, mas aqui... - ela girou o dedo no ar. - Aqui dentro dessas paredes seremos nós mesmo, Samantha e JJ.
- Sam. - corrigi, ela revirou os olhos, ainda não havia decidido se o gesto era de alguma forma provocativo, mas tinha um certo apelo, não negaria. - Dá preguiça falar seu nome todo. Sam é tão fácil.
- Certo, mas na rua vai me chamar de Samantha. Maybank.
- JJ! Só JJ.
- Ok, só JJ. - ela alcançou a coberta sobre a cama perfeitamente arrumada. - Eu durmo no chão. - sua voz não se alterou, ela só arrumou o travesseiro sobre o tapete peludo ao lado da cama. - Não quero falar sobre isso, não hoje, não sei quando. Mas se tomar banho todos os dias pode dormir nela, e precisa tomar banho antes, principalmente, antes de deitar nela. - ela não estava brincando, franziu o nariz na minha direção.
- Eu tomo banho.
- Sério? - ela estava me ofendendo? - Com que frequência? Coloque isso junto ao "não arrombar minha casa" como item essencial de permanência nessa casa.
- Eu tomo banho! - respondi agora ofendido, ela só balançou a cabeça apontando a direção do banheiro, que eu já sabia a direção, porque já havia tomado banho naquele dia. - Já que insiste tanto, vou usar seu sabonete. - ameacei e ela gargalhou, uma gargalhada? Prendi os lábios com força para não dar a batalha por vencida, mas havia amado aquele som que pareceu ecoar no meu peito de um jeito novo.
- Por favor vá em frente abuse dos produtos de higiene, tenho certeza de que fará você se sentir muito bem. - apontei o indicador em sua direção, ela deu ombros.
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Encrenqueiro
FanfictionEsta Fanfic contém personagens e referências da série Outer Banks, porém não utiliza o mesmo arco temporal, sendo alternativo aos acontecimentos nela apresentados. ALERTA: Uso explicito de drogas (lícitas e ilícitas), Linguagem imprópria. GATILHOS...