And the earth was without form, and void

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* as partes em itálico são recordações do personagem.** a sessão de elucidação é uma das formas de "terapia" que os meninos sofreram, que funciona partindo do princípio de tortura psicológica e física. a imagem considerada errada é relacionada com a dor do choque elétrico, consequentemente "enganando" o cérebro, que passa a ver aquilo como uma ameaça. devido ao trauma, as reações dos meninos podem parecer exageradas, mas são fruto da violência que sofreram por dois anos.*** o capítulo contém descrições de tortura. caso se sinta desconfortável, peço que não continue a ler.**** o jongho é mais velho que yungi na história, caso não tenha ficado claro.


Poderiam ter se passado segundos, minutos ou horas. Eu havia perdido completamente toda a noção da realidade e não fazia a mínima ideia de como reagir. Ainda estagnado no lugar, não retirava meus olhos daquele ser que parecia ter um brilho próprio, e se eu me esforçasse um pouco, poderia ver uma auréola flutuando sobre seus fios castanhos, tamanha a sua aparência angelical. Tudo se passava em câmera lenta aos meus olhos: Yuju chamando minha atenção, sua mãe tomando a mala das mãos do filho, e este último se curvando em minha direção, em forma de cumprimento. Assim que percebi que deveria fazer o mesmo, me abaixei rápido demais, o que ocasionou em uma leve tontura assim que me ergui novamente. Pisquei algumas vezes para recuperar a visão embaçada, e assim que obtive o foco novamente, observei um sorriso em seu rosto. Nunca achei que poderia elogiar os dentes de alguém, mas os dele eram perfeitos.

- Fico feliz em conhecê-lo. – Falou, e sua voz era tão doce que eu podia sentir o gosto de mel em minha boca.

Não consegui formar palavras para respondê-lo, e se tentasse, tinha certeza que diria algo que não fazia sentido nenhum. Meus pensamentos estavam completamente fora de ordem, e tudo o que eu conseguia fazer era fitá-lo por um tempo longo o bastante para que sua mãe se aborrecesse, pondo a mala em minhas mãos.

- Você pode levar lá 'pra cima, querido? – Perguntou, com os olhos pidões. – O Yunho deve estar cansado da viagem.

Assenti sem totalmente compreender o que ela havia acabado de pedir, e para espantar o embaraço, pigarreei, desviando os olhos para Yuju. Tinha que me recompor de seja lá o que isso for, e olhar para ela me trazia calma. Ela então passou a puxar o irmão pelo braço, passando por mim e rumando para o quarto. Mesmo que ele não olhasse para mim enquanto andava, me arrepiei da cabeça aos pés assim que eles passaram ao meu lado. Me convenci de que aquelas reações seriam apenas fruto de lembranças desagradáveis do Reformatório, que voltaram com tudo assim que vi um rosto conhecido. Ainda tinha muito medo daquele lugar e tudo que se relacionava a ele.

Quando finalmente obtive controle sobre meus pés, andei até a porta do segundo quarto que até agora nunca havia estado aberta, deixando a mala a sua frente e seguindo reto, apoiando as costas na parede do corredor. Eu deveria ficar ali e fazer companhia a Yuju? Deveria voltar para seu quarto e esperar que retornasse?

- Eu estou tão feliz que você esteja de volta. – A Jeong afirmou, dentro do quarto. – Como foi a viagem?

Não sabia dizer se ela estava disfarçando o fato que o irmão havia acabado de voltar de uma expulsão de demônios ou realmente não sabia onde ele estava todo esse tempo. Não duvidava que seus pais houvessem omitido esse fato aos filhos. Eram uma família importante e Yuju, principalmente, era nova demais para compreender tais coisas.

- Foi tranquila, eu acho. – Ele respondeu, e só o fato de o imaginar sendo maltratado pelos guardas fez meu estômago se embrulhar.

Havia acabado de sair de mais uma sessão de Elucidação. Meu corpo ainda sofria espasmos, que mesmo mínimos, me atrapalhavam na locomoção. Com uma mão apoiada na parede do extenso corredor claro, tentava chegar ao meu destino, o quarto, onde me deitaria e chamaria por Deus até que me sentisse melhor. Ainda podia sentir pequenos choques nas pontas dos dedos, que não me deixavam esquecer da dor que sentia momentos atrás, além de relembrar as lições que sempre eram ensinadas. Não permitiria que o demônio se aproximasse já que sabia o que me esperaria ao desrespeitar o desejo do Senhor.

cure-me - yungiOnde histórias criam vida. Descubra agora