Capítulo 1 - A vida é uma grandessíssima merda.

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Jeremy

A vida é uma grandessíssima merda. Confiem em mim que estava num momento do melhor que em dezassete anos tinha vivido e de um segundo para o outro, passei de caminhar pelos corredores de um supermercado, lado a lado com a minha família, numa manhã normal de há pouco mais de dois anos, num relacionamento saudável com um rapaz espetacular, rodeado de amigos fantásticos, para mal dirigir a palavra a qualquer um deles e voltar costas a tudo pouquíssimo tempo depois de atingir a maioridade.

Tudo isso me veio largar nesta praia, perante esta vista, nesta noite em específico, entregue a mim próprio.

Com uma mão no bolso, a outra empunhava uma garrafa de vodka vazia, a água das grandes ondas batia nas rochas, encharcava a areia chegando-me quase aos sapatos, não podia permitir que tal acontecesse, visto que eram caríssimos e não teria a possibilidade de os substituir nos anos seguintes.

Se resistisse aos anos seguintes.

Cambaleei, queria recuar, mas mal a mal andei para o lado sem grande força no corpo, como se tudo tivesse assumido um estado entorpecido, a minha visão incluída.

No céu escuro apenas identificava os borrões luminosos das estrelas, mesmo assim achava tal imagem muito bela, se fosse um artista pintá-la-ia ou tirava-lhe uma fotografia, como não sou contento-me com vê-la enquanto me falham as pernas e caio de joelhos, graças às mãos trémulas também a garrafa me escapa e pouco a pouco as luzes vão se apagando, as pálpebras pesam cada vez mais, sei que vou desmaiar a qualquer instante e nem me esforço, pelo contrário.

Ah, é possível que fosse boa ideia ter dito antes, tenho diabetes, tipo 1 para ser

mais exato.

Sim, a vida é realmente uma merda.

Camila

Porque raios deixei que me convencessem...? Já sabia exatamente como acabaria! Apesar de gostar imenso do Toby e da Kayla, (ok, do Ed também, contudo esta noite ele não é para aqui chamado, pois teve mais juízo que eu) daquela que se tornou o mais próximo de uma melhor amiga que alguma vez tive, sou diferente deles. Bebida, droga, música aos altos berros acompanhada de centenas de pessoas concentradas num só espaço, envolvimentos sem qualquer conexão, essas coisas não descrevem a minha ideia de diversão, pois sim, sou uma universitária, estudante de segundo ano, que detesta festas. Não me encaixo num estereótipo, encaixo-me noutro, sou a definição daquela miúda recatada e tímida que de um modo geral todas as turmas têm, todos os grupos têm, sou daquelas pessoas que se escondem atrás das luzes arrebatadoras dos populares extrovertidos e mesmo assim, permiti que a minha querida colega de curso, amiga deste mundo e do outro e o meu irmão, pessoa que mal à universidade veio parar já se rodeia de todo um grupo, me arrastassem para a festa de abertura das aulas, só porque esta é especial, a meu ver é igual a qualquer outra.

Vim arejar, saí disparada daquele espaço sufocante sem tempo de avisar ninguém. Posso por fim respirar uma vez mais, para minha grande alegria, já me faltava, o cheiro a maresia entranha-se-me pelo nariz e o som das ondas ecoa-me pelos ouvidos, sinto-me acabada de tomar um calmante, cada mais pequena parte de mim relaxa, de um segundo para o outro sou transportada para o meu paraíso na Terra...

Descalcei os ténis, baixando-me com cuidado para que o vento da madrugada não me fizesse esvoaçar o tecido fininho do vestido e arrepiei-me por inteiro uma vez que os meus dedinhos dos pés tocaram a areia fresquinha, sorri e reergui-me, soube bem, soube estupidamente bem, muitos não acreditariam no quanto me senti recarregada por algo tão mínimo.

Com os velhinhos Converse na mão esquerda, caminhei pela margem, fitando as revoltas ondulações, belas, belíssimas, enfeitadas por espuma branca e pintinhas do mesmo tom, luzes, os reflexos cintilantes das mil e uma estrelas lá em cima e da espantosa Lua, rainha dos céus. Como outrora referi, estava no meu paraíso, para que a situação atingisse a perfeição faltava-me apenas um bom livro, ou música, mas música a sério e não apenas os restos do som daquela festa, ou uma companhia singela... De quem? Do meu irmão, no máximo de Kayla e Edgar.

There's Nothing Holding Me BackOnde histórias criam vida. Descubra agora