O caçador hesitante e os eternos amigos

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O garoto estava em meus braços, pálido, vagante, com o olhar preso em alguma misteriosa figura que errava sem se ver, acompanhava o nada com o olhar, e murmurava o desconexo, como se a língua tivesse se tornado o tomo de uma velha imortalidade. Tentava curar seu ferimento com minha magia, fazendo o punho uma estátua de jade, e curando-o, assim como fizera com o beor, antes. Pela primeira vez a magia não parecia surtir efeito, e ele continuava a mesma coisa.

-Alô? Por favor, estamos na barca! Precisamos de ajuda! Já pegaram o número cinco, estão...estão... -O garoto apagava.

-O que foi? -A garota chegou depois de um tempo, arregalando os olhos ao ver seu amigo naquele estado, ela tapou a boca com a palma da mão, como se ansiasse por gritar, mas, pela simples cortesia aos convalescentes, não o fizesse.

-Sem tempo! Segure firme e não solte! -Peguei a garota abaixo de um braço e o menino abaixo do outro, corri o mais rápido que pude através da floresta, na direção das badaladas que havia ouvido avançarem pelo ar como um exército em marcha. Uma grande adrenalina se apoderou de mim, um processo familiar, que não sentia a muito tempo, não tive tempo de notar os batimentos subirem e meu corpo começar a aquecer como numa febre infernal.

Como que inconsciente, segui instintos até a velha capela, estraçalhando os galhos com minha trajetória, cortando a neve à passos largos e pesados, daquele que corre ao objetivo, pronto para qualquer coisa.

O mundo passou como um eco ao meu lado, podia jurar ter visto várias pequenas figuras me observarem através das árvores.

-Estão vivas... -O garoto murmurava
Fervendo de algo desconhecido, subi uma colina. Parava agora para perceber que a garota gritava e se esperneava com toda sua força.

Continuei subindo o morro, como uma locomotiva, fervendo à flor da pele, fumaça saindo dos poros. A tempestade ficava mais e mais forte, rugia mais e mais ferozmente, essa besta invernal que tentava saciar sua fome, com seus rugidos, estendia sua cria de ventos cortantes e frios em minha direção, mas meus olhos não notaram as quimeras, tão acostumados ao frio e à precipitação. Parei à frente da pequena capelinha, bati à porta tantas vezes como me foram possíveis antes que ela a abrisse.

Uma mulher, em roupas negras, com um capuz e saia negros, abaixo de um véu negro e com uma trave de ferro negro sob os próprios olhos, em seu rosto que mal se via, abaixo do véu. Uma típica roupa de freira que não parei para olhar dada sua familiaridade aos olhos.

Esfriei, olhei aquele véu inexpurgável e larguei a garota. Peguei o menino com as duas mãos e estendi para ela. A mulher me olhou nos olhos por trás do véu e delicadamente pegou o garoto com as mãos nuas e adentrou o local. Entrei junto dela. Acreditava que teria vergonha de estar ali novamente, mas ali estava. Sentindo isso, o que quer que fosse. Não despreguei os olhos do garoto enquanto a seguia pela escada caracol no fundo do lugar.

-O que está acontecendo, Evergreen? -A garota perguntou, puxando minha capa.

-O garoto...ele está mal. A irmã vai cuidar dele, mas fique aqui, não suba as escadas-Virei a cabeça para dizer

-Porque, eu quero saber, ele está bem?

-Suspirei, virando-me e me agachando para que ficasse apenas pouco maior que ela. Fui dizer algo, mas as palavras me escaparam, olhei para o chão, suspirei

-Fiquei aqui. Ele vai ficar bem, eu...prometo. -Me levantei e botei o pé nas escadas. A irmã permaneceu silenciosa.

Subimos.

No andar superior, apenas um pequeno quarto com uma cama, uma cadeira à beirada de uma janela redonda, um armário e um criado mudo, o mais essencial e simples. A mulher botou o garoto com cuidado na cama, ele tremia.
Um arrepio julgava minha espinha impiedosamente, um horror abateu-se sobre mim, e fruto do horror são as perguntas, e vice-versa.

Réquiem: Aos velhos temposOnde histórias criam vida. Descubra agora