Tendo sido deixada nas mãos da maîtresse, fui conduzida por um corredor longo e estreito até uma cozinha diferente, muito limpa, mas muito estranha. Ela parecia não conter nenhum utensílio para cozinhar, nem lareira nem forno; não entendi que a grande fornalha negra que ocupava um dos cantos era uma eficiente substituta para eles. Certamente o orgulho ainda não estava começando a sussurrar no meu coração; contudo, tive uma sensação de alívio quando, em vez de ser deixada na cozinha, conforme eu havia parcialmente antecipado, fui conduzida mais adiante para um pequeno cômodo interno chamado de "salinha". Uma cozinheira, usando uma jaqueta, uma saia curta e tamancos, trouxe minha ceia: a saber, um pouco de carne, de natureza desconhecida, servida com um molho estranho e ácido, mas agradável; um pouco de batatas picadas, deixadas mais saborosas com não sei qual ingrediente: vinagre e açúcar, acredito; uma tartine, ou fatia de pão e manteiga, e uma pera assada. Estando faminta, comi e me senti grata.
Depois da "Prière du Soir", Madame veio pessoalmente dar mais uma olhada em mim. Ela quis que eu a seguisse ao andar de cima. Passando por uma série de quartinhos muito estranhos (os quais, fiquei sabendo depois, haviam antes sido celas de freiras: pois o edifício era, em parte, bem antigo) e pelo oratório (um cômodo longo, de teto baixo, sombrio, onde um crucifixo estava pendurado, pálido, na parede, e duas velas faziam uma indistinta vigília) ela me conduziu a um quarto onde três crianças estavam dormindo em três caminhas. Um aquecedor deixava o ar nesse cômodo opressivo; e, para melhorar a situação, ele estava perfumado com um cheiro que era mais forte que delicado: um perfume, na verdade, muito surpreendente e inesperado naquelas circunstâncias, que parecia uma mistura de fumaça com alguma bebida alcoólica; resumindo, um cheiro de uísque.
Ao lado de uma mesa, sobre a qual lampejava o remanescente de uma vela que gotejava no candelabro, uma mulher grosseira, vestida de modo desconjuntado em um amplo vestido vistoso de seda listrada e um avental, estava em uma cadeira, profundamente adormecida. Para completar a cena, e para não deixar dúvidas quanto à situação, uma garrafa e um copo vazio estavam ao lado do cotovelo da bela adormecida.
Madame contemplou esse formidável tableau com grande calma; ela nem sorriu nem franziu o cenho; nenhuma demonstração do raiva, repulsa ou surpresa perturbou a equanimidade de seu aspecto sério; ela nem ao menos despertou a mulher. Apontando serenamente para uma quarta cama, indicou que ela seria a minha; então, tendo apagado a vela substituindo-a por uma lamparina, saiu suavemente por uma porta interna, que deixou escancarada; a entrada para seu próprio quarto, um apartamento amplo e bem mobiliado, como dava para ver pela abertura.
Minhas orações naquela noite foram todas de agradecimento. De modo estranho eu fora conduzida desde a manhã; inesperadamente havia sido auxiliada. Eu mal podia acreditar que nem quarenta e oito horas haviam-se passado desde que eu partira de Londres, sem nenhuma outra tutela além da que protege a ave migratória; sem nenhuma perspectiva além do duvidoso e incerto tracejado da esperança.
Eu tinha o sono leve; na calada da noite subitamente acordei. Tudo estava em silêncio, mas uma figura branca estava parada no quarto: Madame em sua camisola. Movendo-se sem um som perceptível, ela olhou as três crianças nas três camas; ela aproximou-se de mim: fingi estar dormindo, e ela me estudou por muito tempo. Uma pequena pantomima, bastante curiosa, se seguiu. Eu arrisco dizer que ela ficou sentada um quarto de hora na beirada da minha cama, observando meu rosto. Então se aproximou, debruçou-se sobre mim; ergueu ligeiramente minha touca de dormir, e dobrou a borda, de modo a mostrar o cabelo; olhou minha mão, que jazia sobre as cobertas. Tendo feito isso, voltou-se para a cadeira onde estavam minhas roupas: ela estava aos pés da cama. Ouvindo-a tocar as roupas e erguê-las, cautelosamente abri os olhos, pois confesso que estava curiosa para ver até que ponto seu gosto pela investigação a levaria. E a levou bem longe: ela inspecionou todas as peças. Conjecturei sobre seus motivos para proceder assim, a saber, o desejo de formar, a partir das roupas, um julgamento em relação a quem as usava, sua posição, seus recursos, seu asseio, etc. O fim não era ruim, mas os meios eram pouco justos ou justificáveis. Em meu vestido havia um bolso; ela o revirou; contou o dinheiro na minha bolsa; abriu um pequeno livro de apontamentos, inspecionou friamente seu conteúdo, e tirou do meio das páginas uma pequena trança do cabelo grisalho da Srta. Marchmont. A um molho de três chaves, da minha mala, da escrivaninha e da caixa de costura, ela dedicou especial atenção: com elas, na verdade, ela se retirou por uns momentos para o seu próprio quarto. Eu silenciosamente me sentei na cama e a segui com os olhos: essas chaves, leitor, não foram trazidas de volta até terem deixado no banheiro do quarto contíguo a impressão de suas incisões em cera. Tudo isso feito com decência e em ordem, minha propriedade foi recolocada em seu lugar, minhas roupas foram cuidadosamente dobradas. De que natureza eram as conclusões tiradas desse escrutínio? Seriam elas favoráveis ou não? Pergunta inútil. O rosto pétreo de Madame (pois, naquela noite, de pedra seu aspecto dava a impressão de ser: ele tinha sido humano, e, como mencionei antes, maternal, no salon), não revelava uma resposta.