Capítulo vinte e oito - Vigilâncias I

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— Pode sentar aqui mesmo.

— Agradecida — A senhora respondeu.

O cabelo branco estava em formato de coque para trás. Vestia um conjunto florido, mas discreto. Não exibia maquiagem ou jóias e tinha uma maneira retraída de se comportar. Os olhos exibiam tristeza profunda por ter reconhecido que a mulher no necrotério era a sua Viviane.

— Lembra da última vez que a viu? — André perguntou.

— Nem se eu quisesse me esqueceria. Faz uns cinco dia.

— E como ela tava? Estranha? Triste? Alegre? — Corina se ajeitou na cadeira ao lado de André.

— Mais espevitada que o normal. Sabe, eu já tava desconfiando das saídas dela. Sabia que era homem. Ela sempre foi assim. Nesse dia ela até me beijou, coisa que não fazia. Disse que a nossa vida ia melhorar, que a gente ia sair daquele barraco. Nossa casa é simples, mas não é um barraco, sabe? Mas ela achava que era.

— Como assim? — Indagou André — Ela ganhou algum prêmio na loteria?

— Macho rico — Dona Janaína respondeu mais seca que o barulho das teclas pressionadas pela escrivã Mirian — Era só isso que ela pensava. Faz uns meses que ela chegou com uns brinco do tamanho do mundo lá em casa. E dava pra ver que era coisa cara, não era do camelô não. Eu conheço, já fui camelô, e aquilo ponho meus pé no fogo se aquilo não valia milhão. Eu nunca falava nada de um ou outro presente que ela ganhava, apesar de achar safadeza dela, mas depois do brinco... sei não.

— E por que desconfiou do brinco?

— Sei lá, coisa de mãe. Mas é que aquele negócio era além do que ela já tinha levado pra casa, sabe? Era um troço que só gente podre de rica compra, grandão, dourado e com uma pedra vermelha do tamanho do mundo. E depois começou a chegar mais. Era uns vestido caro, umas maquiagem importada não sei de onde, uns colares com umas pedra que eu nem sei dizer o nome. Não gosto de gente rica e não tava gostando dela se envolver com essa gente. Já não gostava antes, quando ela se envolvia com esses homem que se acha rico por que tem um barzin ali da esquina, imagina gente importante. Gente importante só tem sujeira, e olha aí... no que deu — Janaína se emocionou e limpou o canto dos olhos com um paninho que carregava — Eu tinha certeza que isso não ia acabar bem, avisei tanto, mas tanto, tanto...

— Por que não comunicou sobre o sumiço antes? — Corina perguntou, antes de pedir para André buscar um copo de água para a mulher.

— Ela sempre sumia, mas não desse jeito. Tinha coisa ruim aí. Coração de mãe, dona delegada. Coração de mãe...

Ao ver o copo de água, Janaína bebeu e ficou mais calma.

— A senhora viu algum desses homens? Ou ela falou o nome deles pra senhora?

— Eu acho que eu sei, mas não sei se devo... — A mulher parou de falar olhando para os próprios pés.

— Senhora, se você não confiar em mim eu não vou poder ajudar a descobrir quem fez isso com a sua filha. Qualquer coisa que lembrar, por mais que não pareça, é importante. A senhora deve confiar em mim.

— Olha, um dia antes dela sair, ela não largava o telefone. Se eu ouvi bem, era algum Walter, mas não sei mais nada além disso, juro. Sempre que ela chegava tarde da noite, eu até tentava ver, mas só ela saía do carro, nunca vi nenhum deles.

Corina deu uma olhada rápida para a porta. André já estava ali há algum tempo parado segurando o copinho descartável com água. Ela tinha certeza que ele estava tendo o mesmo pensamento que o seu.

— Pode confirmar o nome completo da sua filha, por gentileza.

— Viviane Pereira da Costa. — Ela falou.

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