No começo eram flores e tudo era florido ao nosso redor, os campos, o céu, as casas, a vida. Tudo colorido, um arco-íris de flores. Eu e Doralice no paraíso. Éramos tão jovens, tínhamos muito o que aproveitar e desfrutar da vida. Existir não bastava e o que eu queria mesmo era viver. Doralice era uma flor tão bela, seus olhos eram da cor do céu e seus cabelos eram girassóis. Seus lábios tão rosa, sua pele tão margarida. Seu perfume era tão doce que me deixava enfeitiçado e eu só queria cheirá-la. No início tudo era bonito de se ver, de viver e de dizer. Eu amava uma flor. Falava que a amava tanto quanto amava a vida. Ela se derramava feito manteiga e eu a via dançar. Bastava um eu te amo para vê-la desabrochar. Eu sorria. Doralice também. Mas parece que o que é bom dura pouco tempo ou talvez o bastante para se tornar inesquecível. Todavia eu queria desfrutar mais dos bons momentos. Era tudo tão perfeito, tão doce. Eu e Doralice passeava pelas ruas da cidade florida, tomávamos chuva juntos, íamos até o rio e sentávamos no mato para admirar as águas tão serenas, a gente se beijava tanto que ficávamos com câimbras nos lábios e eu ficava todo rosado do rosa de sua boca, a gente se amava, deitava e rolava e não havia momento melhor, senão ao lado de Doralice. Mas o tempo foi passando e o amor se esfriando. Até parou de chover. Antes, quando chovia, caiam gotas coloridas do céu, parecia que todo o céu era um grande arco-íris. As flores dançavam e exalavam seu doce perfume. Inclusive Doralice que dançava para mim toda vez que eu te dizia o quanto te amava. Entretanto fomos nos cansando um do outro cada vez que o tempo passava, era tanto para dar e tanto para receber que nunca chegava a um equilíbrio e harmonia, tínhamos que cuidar um do outro, tínhamos que regar um ao outro, eu já estava farto de tanto dizer eu te amo e vê-la dançar, de sentir aquele perfume doce, o encanto estava perdendo o efeito na medida em que o tempo passava. Doralice foi se afastando. Cada vez mais sem vontade de amar. Eu fui parando de dizer que a amava e já fazia tempo que não a via desabrochar. Ela foi murchando. O céu foi perdendo as cores, as flores foram adoecendo e ficando cada vez mais mortas, lá se ia o encanto e a magia. Até amar levava a uma monotonia chata e todas as flores foram murchando, eu não era o único a deixar de amar, Doralice não foi a única a morrer. Havia algo no fundo ali que me mostrou que amar e não ser amado não compensava e que havia uma medida certa de amar, senão tudo se acabaria um dia.
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CONTOS & CRÔNICAS
Historia CortaUma coletânea de contos e crônicas do autor Ruan Vieira.