Semifauno X Fauno

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Já era a quarta vez na semana que Steve Holtters entrava a contragosto em qualquer lugar para se abrigar. A cada passo, o chão rangia. Claramente, a antiga mansão não era um dos melhores abrigos. Contudo, já escurecia lá fora. Zumbis e outros monstros igualmente pavorosos assomavam pelas ruas, sem mencionar que uma tempestade se formava.

Ali, o jovem Steve sentia a fria solidão. Como o esperado, excluindo os desprezíveis zumbis, contava apenas com a companhia de aranhas e ratos. No porão, após abater zumbis e selar as entradas, o semifauno procurou um canto onde dormir. Removeu o excesso de poeira e teias de aranhas, então estendeu no chão o saco de dormir.

Era difícil acreditar na série de eventos catastróficos dos últimos meses. Ele nunca pensara que o mundo passaria por tudo aquilo, tampouco que seria preciso dormir em uma velha mansão que não lhe passava segurança. Após alguma relutância, Steve deitou-se para meditar antes de adormecer, decidido a adentrar o mundo Fauntasy, um hábito que ele cultivara muito nos tempos da pré-adolescência. 

"Se eu morrer aqui, neste mundo, enquanto estiver em Fauntasy, talvez lá se torne o meu novo mundo...", pensou o semifauno.

Nascera no mundo humano, mas havia criado um lar extra naquela dimensão, para onde costumava fugir em busca de refúgio, pulando de um corpo a outro.
Assim que a sua consciência apagou-se por completa no mundo humano, Steve despertou na toca de uma floresta banhada pelo luar. Via-se em um corpo uns sete anos mais jovem, com as características mais marcantes de um esquilo; um corpo fauno nascido na floresta entre companheiros alquimistas e magos desde a época em que o seu espírito passara a ter contato com eles, os faunos do Mundo dos Faunos, seres mágicos compartilhando semelhanças com os mamíferos, todos bípedes.

Às vezes, Steve se perguntava por que havia sido abençoado com aquela segunda vida. Somente ali se sentia inteiramente fauno, completo, e isso era muito bom. Na clareira adiante, havia duas tendas. Em uma delas, um casal de magos faunos mantia relação íntima.
Steve se dirigiu para a outra tenda. 

— Olá, Nahlyes. — Saudou Steve, ao se encontrar com a pequena fada dourada.

A fada retribuiu a saudação na língua das fadas Nahvilys, antes de voar para o ombro de um fauno lebre que passava pela tenda.

— Zelldh! Tudo em cima?! — Saudou o jovem fauno de manto branco.

O fauno esquilo olhou em volta, ao esboçar um sorriso ligeiramente amargo.

— Oi, Pronório. Bom, como posso dizer... Vejo que aqui tudo anda tranquilo, mas o mundo humano... ainda passa por muita coisa terrível. Queria que ele tivesse pelo menos um pouco da paz daqui.

— Lamento pelo seu mundo, cara. Mas, um dia, talvez o seu destino seja ficar aqui.

— Sim, talvez.

Dez minutos depois, eles se reuniam em torno de uma fogueira, então começaram a conversar.

— E a garota de cabelo vermelho? — perguntou o fauno de manto branco.

— Estive investigando. Parece que ela se foi, mas deixou pelo menos uma réplica de si mesma... Deve ter passado a missão para a sua réplica.

— Compreensível. Sabe, se eu tivesse que partir, acho que faria o mesmo.

— Eu também, se pudesse me replicar.

— Mas qual seria a missão dela?

— É o que eu gostaria de saber. Mas, seja o que for, creio que visa o equilíbrio, assim como você esperaria de um Fragmentalista — Steve olhou para as chamas ao imaginar compridos cabelos como brasas de fogo —, ou de uma réplica especial do Povo Fragmentalista.

"............."

— Tem razão. Ah, Fragmentalistas e a sua nobreza... eram mesmo fantásticos. 

Pronório olhava para a lua cheia, conforme mergulhava em pensamentos ao alimentar as chamas com o espeto de peixe.

Steve Holtters - A Patrulha do Alvorecer da Ordem dos FalcõesOnde histórias criam vida. Descubra agora