unhappy | changlix

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Sentado na cama eu fazia carinhos leves no cabelo de Felix, que estava deitado em meu colo.
Ele se remexia em busca de um conforto maior, e mantinha um pequeno sorriso no rosto.
Tirei daquele momento tão grande de paz, a força que eu precisava para pensar no passado.
Era tão bom pensar em tudo aquilo que me destruiu um dia e já não sentir mais nada.

- No que você tanto pensa? - escutei sua voz baixa e já sonolenta pelos carinhos que recebia.
- Está com sono? - ri levemente ouvindo seu murmúrio de confirmação - Estava pensando em tudo.
- Em tudo o quê?
- Em nós, a forma que eu era sem você, minha família... tudo.

Senti seu corpo levantando lentamente e logo Felix estava sentado na minha frente.
Se aproximou calmamente e pude sentir sua respiração se aproximando da minha.
Seus lábios tocaram nos meus e só pude fechar meus olhos apreciando e sentindo ao máximo o momento, em uma luta sem fim com as borboletas na minha barriga,

Foi um beijo calmo, cheio de sentimento e cheio de amor.

- Quer conversar sobre isso? - perguntou se afastando e tentando se encaixar nos meus braços - Faz muito tempo que não conversamos sobre o passado.

E era verdade.
O que antes era o responsável por tomar nossa mente o tempo inteiro, atualmente não nos era importante em nada.
Não havia por quê pensar no passado quando eu poderia passar meu tempo planejando nosso futuro e apreciando nosso presente.
As coisas que nos magoavam já não tinham nenhum poder sobre nós, e por isso falar sobre elas já não nos fazia ter crises de ansiedade e muito menos crises depressivas.
Seria mentira dizer que nós ficávamos indiferentes pensando naquilo, sempre existiria um restinho de tristeza por lembrar de tudo, é só que esse restinho não era nada comparado ao que tínhamos agora.

- Acho que podemos - respondi após refletir por alguns segundos - Por onde começamos?
- Hm... Do início? Já me esqueci de muita coisa, mas tem um dia que pra mim é inesquecível.
- Qual? - perguntei realmente curioso.
- O dia que você saiu da escola com minha carta na mão... lembro de te ver pela janela e sentir que meu coração ia explodir - comentou rindo.
- Esse dia... - sorri me lembrando da sensação que senti - Hoje tenho certeza que aquele momento mudou todo o rumo da minha vida.

Abracei ele, que parecia tão pequeno nos braços e depositei um beijo em seu cabelo.
Me sentia grato, mas mais que isso, sortudo.
Me permiti lembrar de tudo o que eu havia vivido, e o quanto esse homem, que hoje posso chamar de meu, fez com que valesse a pena continuar vivendo.

O clima estava pesado como sempre.
Me tranquei no quarto mais uma vez e esperei que eles saíssem de casa para que eu pudesse descer e almoçar.
Respirei fundo sentindo meu corpo arder a cada movimento.
Meus pais nunca foram presentes em minha vida, meu nascimento foi algo que eles não haviam planejado e me odiaram por isso, por toda a minha vida.
Nunca haviam participado de uma reunião escolar, nunca haviam brincado comigo, nunca estiveram ali por mim.
Cresci acreditando que minha babá era minha mãe, e quando ela foi demitida, não soube mais o que fazer.
Tentei fazer dinheiro com minha música para conseguir ter minha própria casa, mas tudo que eu arrecadava acabava sendo usado para pagar minha faculdade.

Minha vida já estava ruim e eu perdia mais as forças a cada dia.
Mas tudo sempre consegue piorar, não?

Um colega de classe havia vindo em minha casa para terminarmos um trabalho, e enquanto eu nos preparava um lanche, ele vasculhou meu quarto e encontrou meu diário.

Encontrou o único momento onde eu era eu mesmo.

No dia eu não havia entendido nada, não sabia o motivo de ele ter saído da minha casa sem se comunicar comigo, não sabia por que não atendia minhas ligações.