INTERLÚDIO II

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Textos do diário de Ulisses Braga
07 de Janeiro de 1995


Este é meu segundo dia neste hotel abandonado. Apesar do cenário sinistro de abandono, este lugar está muito longe de ser o inferno que era em seus tempos de glória quando ainda funcionava e acolhia pessoas em busca de um lar ou, em alguns casos, de descanso. É irônico pensar que este lugar já tratou e salvou vidas, quando ainda funcionava como uma clínica. Safira preencheu sua ficha de internação e ninguém imaginava que aquela assinatura no fim do formulário colocaria um fim no tão sucedido - e o melhor, como foi julgado por muitos profissionais da área - hospital psiquiátrico do estado do Ceará. Miriam Lopez estava com os dias contados para o seu fim quando Safira pôs os pés em seu piso pela primeira vez.

Safira Gullar, 25 anos, se internou nesta instituição quando foi pega por um vizinho cometendo o mais brutal e desumano ato. Ela estava preparando-se para sacrificar um bebê. Ao que tudo indica, essa horrenda demonstração de desumanidade seria cometida para uma demonstração de adoração ao Satã.

"Eu queria provar que era digna de confiança, e ele disse que eu precisava fazer aquilo, pois o sangue do bebê lavaria minha alma com a juventude eterna"

Alegou a paciente quando deu seu depoimento diante do tribunal, no dia de seu julgamento.

Quando questionada se tinha contato frequente com o Anjo Caído, Safira apenas afirmou ser uma seguidora fiel de seu líder e que sentia o poder dele em sua alma, sempre que o procurava. Os conselhos e ordens vinham deste poder. Se manifestavam em sua cabeça, como vozes interiores que ditavam o que ela tinha de fazer.

Safira despertou a ira de muitas pessoas, a maioria delas fiéis religiosos que discordavam das práticas diabólicas da mulher. Mas a mídia começou a desconfiar da devoção obsessiva que Safira fazia questão de expor para a imprensa. Um jornal de Várzea, cidade vizinha de Juncá, publicou na primeira página, as pesquisas feitas pelo jornalista Adalmir Machado, que indicavam que Safira sofria de distúrbios e alucinações, afirmando então que "Loucura" era a única religião que a mulher seguia. Logo depois, foram levantadas várias pautas em diversos jornais sobre a sua saúde mental, e essas teorias eram constantemente comprovadas pelos pais da mulher que alegavam serem contra as atividades profanas que ela afirmava seguir e que estavam em choque com a repercussão do caso.

Safira foi alvo de críticas no país inteiro, e apesar de estar listada como uma das pessoas mais perigosas do país, essa personagem é importante para entendermos como toda a história trágica da clínica Miriam Lopez e do Hotel Miraplazza se deu início.

Mas quem foi Safira?

Fazendo minhas próprias pesquisas, conversando com parentes, amigos, vizinhos, conhecidos e até mesmo inimigos, consegui coletar informações valiosas que moldam todo o comportamento da mulher e explicam os diversos fenômenos que vieram logo após sua captura.

Safira Gullar já era uma adulta quando foi internada na clínica psiquiátrica Miriam Lopes. Sua chegada até a clínica só foi possível graças à sua família que julgou suas práticas satanistas como um distúrbio de personalidade.

Segundo relatos de uma vizinha, amiga de sua avó, Safira adquiriu gosto por tais ritos quando assistiu pela primeira vez uma sessão espírita acompanhada da avó. A família nem mesmo imagina a história por trás da vida da anfitriã dos Gullar. A informação a seguir é dada pela já citada amiga de dona Tulla, que jura de pé junto que tudo o que disse é a única e mais pura verdade.

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