São Francisco, Califórnia
Maya observava minuciosamente uma casinha de brinquedo feita de madeira, sua mãe havia lhe dado de presente ainda quando criança em um de seus aniversários. Conforme ia analisando os cômodos daquela pequena casa de bonecas, ela ia também lembrando-se do tom dócil que sua mãe utilizava ao lhe aconselhar.
— Filha, você poderá organizar a sua vida exatamente do jeito que quer. E exatamente do jeito que gosta. — Katherine Bishop usou bonecos de pano para exemplar, queria que Maya soubesse que ela poderia comandar sua própria vida assim como fazia com os bonecos. Logo em seguida abaixou-se e segurou as mãos da pequena, sorrindo para ela. A menor, por sua vez, ouvia tudo atentamente, admirando a sabedoria da figura materna.
Por alguns minutos Maya foi transportada para um espaço seguro, a lembrança de um dia feliz que não voltaria mais. Havia um ínfimo desejo de congelar aquela memória para que nunca se perdesse em seus devaneios.
— Você fez um trabalho incrível hoje, Bishop. — Victoria a trouxe de volta à realidade, transmitindo um sorriso afetuoso assim que a loira aproximou-se dela, deixando a casa de bonecas para trás.
— Obrigada! — Maya agradeceu com um timbre triste enquanto levava sua destra em direção à canhota da amiga, onde concedeu um aperto simbólico.
— Como os funerais devem ser, não tão tristes! — Sua fala conseguiu arrancar um sorriso de Maya, que concordou.
— Acho que mamãe teria aprovado.
— Se tivéssemos mais alguns anos, a tornaríamos uma Democrata.
A recém órfã encarou o chão enquanto refletia, expondo um meio sorriso na face antes de retomar o contato visual.
— Talvez não! — As duas falaram ao mesmo tempo e riram em uníssono, balançando suavemente as cabeças.
Maya respirou fundo e guiou sua mão até um vaso marrom que destacava-se por seus detalhes em dourado, deslizou as pontas de seus dedos sobre ele cuidadosamente em um ato de respeito pelas cinzas daquela que lhe deu a vida.
— É realmente bonito, não é? — Ela estava satisfeita com a escolha e desejava que sua mãe também estivesse, caso ainda pudesse ver o que ocorria na Terra.
Após mais alguns segundos de reflexão e imersão em seus próprios pensamentos, Bishop suspirou pesado antes de dispensar a amiga.
— Preciso dar um mergulho. — Soltou a mão de Victoria e virou as costas para ela, caminhando na direção oposta. Maya necessitava mais do que nunca de um momento a sós.
— Tudo bem, faça isso! — Vic estava preocupada com a sua melhor amiga, mas ambas respeitavam o espaço uma da outra e nessa ocasião não seria diferente.
Já era entardecer quando, vestindo apenas um maiô preto, a escritora deu passos lentos, quase que melancólicos, em direção à piscina. Algumas luzes de postes começaram a se acender nas ruas e as vozes nos arredores se faziam cada vez mais audíveis, era final de turno e os vizinhos estavam voltando para seus lares após suas extensas rotinas de trabalho. Maya, todavia, se sentia segura ali na quietude e calmaria de seu quintal, protegido por cercas de madeira envelhecida e pequenos arbustos, os barulhos externos não a incomodavam quando tudo o que ela conseguia ouvir era a voz de sua mãe martelando insistentemente em seus pensamentos.
— Não há garantias na vida, Maya. Esteja preparada para qualquer coisa.
Ao lembrar da sentença, um singelo sorriso nasceu no canto de seus lábios, para logo em seguida dar lugar ao aperto no peito. Sua mãe havia a preparado para o primeiro dia de aula, para as dores de um coração partido, para as frustrações com quem se ama, mas havia uma coisa para a qual a mãe não conseguiu a preparar: o seu último adeus.
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TAKE ME TO CHURCH
RomanceDe um lado, Maya Bishop, uma escritora assumidamente lésbica. De outro, a mãe de um jovem rapaz e esposa de um fiel pastor, Carina DeLuca, cujas crenças são questionadas quando o destino de ambas se cruzam e desse encontro nasce um profundo sentimen...