Capítulo 3 - Chega perto não

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877 palavras

Hermione acordou cedo, como costumava acontecer, com Spock miando insistentemente e andando pelo seu corpo. Bichento, já na sua avançada idade, não fazia mais isso, deixando a função para o gato mais novo.

— Ah, não, Spock... Deixa a mamãe dormir só mais um pouquinho...

Vendo que a insistência permaneceria, a contragosto a morena abriu os olhos e se sentou na cama. O relógio digital marcava 6:13. Acariciou o pequeno felino, o que o fez miar menos, porém não parar de vez. Enquanto escovava os dentes, os dois gatos de estimação se intercalavam ao redor de suas pernas, esperando pela comida que sabiam que viria em breve.

Hermione riu ao fitar sua imagem no espelho. A cara de sono e os cabelos bagunçados a fizeram refletir sobre o tipo de vida que escolhera ter. Estaria caminhando lentamente pela estrada que a tornaria uma verdadeira “velha dos gatos”?

Assim que terminou sua higiene matinal, se dirigiu para a cozinha, ainda com os dois animais a seguindo, atentos aos seus atos e miando esporadicamente. Agora até mesmo Bichento estava disposto a miar. Tão logo terminou de encher os potinhos com ração, olhou em direção à porta da sala, onde viu algo amarelado no chão.

Se aproximou com um olhar de curiosidade e abaixou, percebendo que se tratava de um pedaço de papel, aparentemente arrancado de um bloco de notas e dobrado ao meio. Logo que abriu o papel, Hermione sorriu e meneou a cabeça, sentindo a fragrância de amêndoa, café e jasmim que ela tanto gostava de sentir. O cheiro já havia denunciado quem escrevera as palavras no pedaço de papel, mas ainda que o aroma não estivesse ali, ela teria reconhecido a letra.

Começou a ler as palavras ali escritas e corou. Pansy era tão espontânea e parecia ter uma facilidade tão grande de dizer as coisas que sentia. Hermione queria ter coragem de fazer o mesmo, mas ela se enrolava com seu lado extremamente racional.

Era difícil racionalizar o que sentia pela outra mulher. Às vezes ela achava que era só carência, outras achava que era realmente um sentimento mais forte. Mas faltava certeza para agir. Esse era um de seus defeitos, afinal. Querer agir apenas quando se sentisse segura o suficiente para traçar as rotas e ter total domínio de todo o percurso.

Com Pansy as coisas não funcionavam assim. Bastava um toque dela, o cheiro do perfume, um olhar, um beijo ou qualquer outro ato simples para Hermione se perder. Ela se sentia perdida junto aos seus próprios sentidos, que estavam junto com os de Pansy, com certeza. Ela já não conseguia se tornar só ela. Já se sentia parte demais da outra, que ocupava tanto dos seus dias, dos seus pensamentos... Sem sombras de dúvida, fazia parte de seus melhores momentos e lembranças atualmente.

Como se lidar com todos esses sentimentos não fosse o bastante, a maneira que Parkinson agia deixava Hermione incomodada. Às vezes ela até sentia que tudo não passava de brincadeira, que Pansy era tão direta justamente por saber que ela não corresponderia, ou quem sabe era tudo apenas um jogo de conquista e, assim que ela correspondesse, perderia a graça e ela acabaria sozinha e apaixonada.

Ela se jogou no sofá, relendo o bilhete que tinha recebido e ponderando se deveria chamar Pansy para uma conversa, se deveria responder e enviar essa resposta ou se deveria apenas ignorar e deixar o tempo resolver todas as coisas. Fitando o teto, ela deu um longo suspiro. No fim das contas, ela também estava morrendo de saudades e cada palavra escrita mexia muito com seus sentimentos. Por que Pansy Parkinson tinha se tornado uma pessoa tão atraente, determinada e ao mesmo tempo fofa?

Embora ela sempre achasse engraçado todas as frases enigmáticas e poéticas que Pansy dizia, achava tudo aquilo muito lindinho e se sentia cada vez mais propensa a se jogar de cabeça na sua própria vontade, mesmo que saísse machucada no final.

Decidiu então se levantar e escrever uma resposta. Ela sabia que não conseguiria falar nada pessoalmente, se enrolaria muito. E se a outra podia usar metáforas e poesia em vários momentos, ela podia também. Sentou à mesa e abriu um caderno antigo, onde começou a escrever.

“Oi, senhorita P. P.

Fui surpreendida com as suas palavras logo cedo, depois de alimentar meus filhos. Mais uma madrugada insone, né?

Bom, vamos lá, quero te fazer um pedido: chega perto não.

Eu quero lembrar como se respira, engolir as palavras antigas e reinventar cada uma delas. Eu acho que me perdi nos meus sentidos que estão por aí com os seus, já que depois de tudo que a gente tem vivido eu não consegui me tornar só eu.
Chega perto não. Mas se você me achar, me liga pra avisar?

Hermione.”

Hermione riu. Não sabia se Pansy conseguiria decifrar o que tinha por trás daquelas palavras, mas torcia para que sim. Já não cabia dentro de si de vontade de encontrá-la e, pela primeira vez depois de tanto tempo, estava disposta a se jogar e viver o que quer que fosse ao lado dela.

Dobrou o papel e o enviou pela sua coruja, antes que aquilo que estava sentindo se esvaísse. Se ela tivesse sorte, receberia em breve alguma resposta.

Sinergia - PansmioneOnde histórias criam vida. Descubra agora