Conforto

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Sakura

Quando eles surgiam, eu sempre colava as costas na pedra mais distante e esperava pelo pior. Em geral, traziam alimentos, vinham fazer uma ronda ou só estavam em busca de algo mais fraco para torturar antes de dormir. Mas o meu verdadeiro pavor era quando abriam a cela. Era sempre quando o pior acontecia.

Abrir o portão significava que eu tinha uma chance, mesmo que ínfima, de fugir e eles faziam questão de garantir que eu estivesse imobilizada. Era nesses momentos que usavam os piores golpes, jutsus e me machucavam tão profundamente que, por vezes, tinham que chamar Kabuto para curar os danos antes que eu morresse.

Dessa vez, quando abriram o portão, entretanto, os golpes não vieram. Os jutsus não foram lançados, não houve fogo, nem sufocamento, nem dor. Eles me seguraram pelos braços, apertando apenas o suficiente, e me levaram embora da cela. Embora do único lugar que eu tinha visto durante cinco anos.

À princípio, achei que era um sonho. Fiz de tudo para me acordar: gritei, me mordi, chutei meu próprio pé. Mas nada aconteceu e eles continuaram me carregando por um corredor escuro e úmido. Gotas de água caíam sobre minha cabeça e o chão estava encharcado.

No fim do corredor, havia uma escada. "É aqui que vão me deixar" pensei. "Vão trazer uma cobra, um monstro ou uma espada especial e será meu fim". Mas, novamente, eu estava errada. Eles me guiaram pelos degraus, que tive dificuldade de subir — tinha cinco anos que eu não fazia aquele movimento com as pernas e meus músculos gritaram durante todo o processo.

Eu não sabia se sentia medo ou encantamento. Pela primeira vez em tanto tempo eu estava vendo outra coisa, andando em outras texturas, respirando outro ar. No fim da escada, outro corredor, agora melhor iluminado e seco. Meus olhos se arregalaram quando se depararam com portas, várias delas, e paredes lisas, pintadas com tinta clara. Luzes artificiais ao invés de velas, um carpete macio ao invés da pedra cheia de limo.

Lágrimas escorreram pelos meus olhos, contra a minha vontade, e meus dedos ficaram tensos, doidos para tocar tudo ao redor: as paredes, o chão, as maçanetas, as lâmpadas.

Outra escada e mais um corredor e eu já não me importava mais se estavam me levando para a morte; pelo menos ia morrer em outro ambiente, não naquele calabouço. Uma porta grande foi aberta e atrás dela havia mais um corredor. Qual era o tamanho desse lugar, afinal? Se me soltassem aqui eu jamais conseguiria voltar para o cativeiro sozinha, ficaria totalmente perdida. Provavelmente jamais encontraria a saída também.

A porta grande se fechou e a luz arrocheada que eu já conhecia bem a cobriu. Eu não estava a caminho da liberdade nem da morte, mas de uma nova cela, percebi. O corredor tinha duas portas iguais, uma de frente para a outra e mais nada. A energia rocha do jutsu de proteção era a única fonte de luz aqui.

Os capangas abriram uma das portas, a da esquerda, e me deixaram do lado de dentro. Assim que seu toque deixou meus braços, a porta se fechou e eu fiquei sozinha, no silêncio total. E esse silêncio era de verdade, sem o som do rio ou de infiltrações pingando.

Meus olhos se adaptaram à escuridão com facilidade — tinha vivido nela por muito tempo — e escanearam o ambiente. Um colchão coberto por um edredom grosso, uma abertura sem porta e um interruptor. "Não é possível" pensei, mas arrisquei ainda assim, apertando o botão. Luz branca tomou o cômodo pequeno, fazendo meus olhos arderem tanto que me curvei. Meus ouvidos zumbiam, estranhando o silêncio, e meus pés ainda não tinham se adaptado ao carpete, que fazia cócegas.

Demorou alguns minutos até que eu conseguisse abrir os olhos e ler o ambiente novamente, agora iluminado. Era um quarto. Eu estava em um quarto. Não havia janelas, nem cômoda ou decoração, mas era definitivamente melhor do que o lugar onde eu estivera até então. Havia uma cama e um edredom e, quando explorei o portal descobri que tinha um banheiro. Com chuveiro e vaso sanitário!

O Tempo Entre NósOnde histórias criam vida. Descubra agora