Prólogo

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- Há algo que deseja me dizer, mestre? - Chittaphon disse em um tom quase inaudível.

Taeyong abriu os olhos azuis-claro e olhou diretamente nos de um de seus aprendizes. Passou a mão pelo pulso do menor enquanto sorria tranquilo. Estava há tanto tempo naquele hanok que havia esquecido o quão bom era sentir o toque humano.

- Acho que você está pronto para ouvir o que eu tenho a dizer. Sobre como eu vim parar aqui.

Chittaphon prendeu a respiração por alguns segundos, sentindo a mão macia de seu mestre sobre sua pele, comparando involuntariamente seus trajes modernos com o hanbok utilizado pelo homem a sua frente.

- É uma honra ouvi-lo, meu mestre.

O motivo pelo qual queria que Chittaphon ouvisse a sua história era parte de algo maior que o bruxo com séculos de experiência estava elaborando. Mesmo permanecendo com a aparência jovem, cujo rosto e corpo não aparentavam ter nem ao menos trinta anos de idade, Lee Taeyong viveu demais, teve vários nomes, histórias e perdas significativas. Sentia que precisava dar um ponto final em algo específico.

Para isso, teria que matar seu irmão caçula, Yunoh.

- Irei lhe dizer o que houve com o meu irmão. O grande mestre da magia sombria, completamente inacessível e perigoso. Porém, até mesmo ele já amou alguém, e é isso o que eu irei lhe contar hoje. - Passou a mão pelo rosto do mais jovem. - Escute bem, porque você precisará de algumas informações. Preciso que me ajude no que eu planejo.

A história que Taeyong contava aconteceu há aproximadamente quatrocentos e vinte e seis anos do ano em que viviam. Uma grande revolta ocorreu entre os feiticeiros da família Jeong, tudo por um único indivíduo, o homem que conseguiu o elixir da vida, um bruxo, alquimista, ou qualquer coisa que o fizesse imortal.

Jung Yunoh era movido pela ambição, perversidade e ódio ao seu irmão mais velho. O primogênito era benevolente e puro, sempre disposto a cuidar das pessoas em sua volta, servindo muitas vezes como um poderoso curandeiro. Eram essas as características que fizeram o rancor do irmão mais novo.

Em uma clara apatia e rebeldia contra seu próprio clã, Yunoh foi exilado. Passou a viver com bandidos, e se tornou um exímio assassino, impossível de se derrotar.

Uma guerra entre os dois irmãos foi travada, mesmo a contragosto de Taeyong. Yunoh se viu perdido ao estar cercado de vários guerreiros querendo a sua cabeça. O elixir da vida o dava regeneração, mas ainda não conseguiu o suficiente para se tornar completamente imortal. Por isso, tentava ao máximo não ser encostado por ninguém, explodindo pessoas de dentro para fora sem controle. Sua atenção estava voltada a apenas uma.

Kim Dongyoung era um jovem assassino renomado, mas também, era o homem que Yunoh amava. Estava lutando ao seu lado, mesmo sendo um humano "normal". Um rapaz um tanto impulsivo e geralmente mal humorado agora estava desesperado, coberto de sangue, procurando Yunoh. Acabou o encontrando no meio do campo de batalha, próximo a uma pequena vila no centro da Coreia.

- YUNOH! - O grito de Dongyoung se fez presente no meio daquela confusão. Os olhos sangrentos de Yunoh se desviaram em direção ao Kim, que conseguiu chegar próximo dele. Pegou em seu pulso. - Vamos!

Dongyoung o puxou alguns bons metros para dentro de um hanok, com uma legião de pessoas atrás deles. Com dificuldade, conseguiu fechar a porta de madeira. Yunoh conjurou um feitiço que a deixaria forte o suficiente para não ser arrombada pelos próximos minutos.

Ambos caíram no chão, cansados. Dongyoung pousou a mão no ombro de Yunoh, que o olhou com dificuldade pela semi-cegueira que acabara tendo.

- Yunoh... O que você precisa para aperfeiçoar completamente o elixir da vida?

Tremendo, Yunoh teve que responder.

- Um sigilo ativado com o êxtase da morte, mas não se preocupe. - Pegou um frasco de dentro de um saco o qual carregava, contendo um conteúdo vermelho brilhante. - Se você beber agora, não terá tantos problemas. Não está perfeito, mas conseguiremos sobreviver com isso.

Dongyoung suspirou, já tendo tomado a sua decisão. Pegou uma adaga e deu na mão de Yunoh, que o olhou sem entender. Com o sangue de terceiros em suas mãos, desenhou um sigilo em sua roupa e fechou os olhos.

- Me desculpe, Yunoh.

- O-O que você vai fazer? D-Dongyoung...

Ao som dos gritos das pessoas que estavam ao lado de fora, Dongyoung se sacrificou pela imortalidade de seu amado, que o faria sair daquela situação. Se jogou com força contra a adaga na mão de Yunoh, indo o mais fundo possível, rasgando seus tecidos.

- Escute, Yunoh. - A voz fraca do mais velho ecoou em seus ouvidos. - V-Você precisa sobreviver. Precisa viver para sempre e sair desse inferno. - Encostou o queixo no ombro do outro, o abraçando pela última vez. O sigilo foi ativado e a energia se transferiu para o conteúdo do frasco que Yunoh segurava. - Espero que eu tenha uma outra vida ao seu lado. Eu te amo, Yunoh.

Yunoh não conseguia entender. Estava perdido demais para raciocinar, e quando se deu conta, Dongyoung estava morto nos seus braços. Não tinha mais o que fazer, pois seu espírito já tinha ido embora. Seus olhos quase cegos encaravam o seu amado, enquanto lágrimas caíam no rosto pálido do outro.

Foi quando prometeu que a morte da pessoa que mais amava não seria em vão. Bebeu o conteúdo do frasco enquanto seu coração se enchia de ódio.

Seus olhos, agora vermelhos, demonstravam a dor e a angústia que sentia no momento. E seu poder foi o suficiente para explodir aquele imóvel de madeira e terminar de matar quem estava ao redor sem dó e nem piedade, pois não tiveram compaixão com quem Yunoh mais amava.

E tudo era culpa de Taeyong. 

O Bruxo de Bukhansan - DoJaeOnde histórias criam vida. Descubra agora