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Por algum motivo, aqueles olhos azuis não me pareciam estranhos.

Era como se, em algum momento, aquele olhar já tivesse cruzado com o meu.

Mas, que seja. Eu realmente não ligo pra isso. Preciso aguentar esse enfermeiro dentro da minha própria casa por alguns dias. O que, obviamente, será um inferno.

— Ouviu, Harry?  - Gemma disse, me tirando dos meus próprios pensamentos.

— O que? Não, não escutei. Desculpa.  - Eu murmurei olhando para ela, que revirou os olhos para mim.

Minha irmã se aproximou, e me envolveu um abraço.

— Não me odeie por isso. Preciso ir agora, tudo bem?  - Ela sussurrou, e eu concordei.

Sei que Gemma estava tentando me ajudar, mas eu não queria ajuda. Não mesmo.

Ela trocou mais algumas palavras com o enfermeiro, o qual eu nem sei o nome ainda.  E logo, ela sai de casa, me deixando sozinho com ele.

Que comece os dias mais complicados.

Eu não me esforcei em tentar ser amigável, ou pelo menos gentil. Não preciso. Nem queria que alguém cuidasse de mim.

Percebi de vislumbre que o enfermeiro estava caminhando em minha direção.

Puta merda. Pensei.

Ele se sentou na poltrona na minha frente, aparentemente um tanto desconfortável.

Somente nesse momento, consegui reparar em seu rosto. Ele era bonito, e seus olhos eram quase hipnotizantes.

Tanto faz. Ele fará o seu trabalho e me deixará sozinho.

— Eu sou o Louis, e bem, você é o Harry, certo?  - Ele disse quebrando o silêncio.

Tinha uma voz bonita, mas não era especial.

— Certo.  - Me limitei a dizer, e evitei fazer contato visual com o mesmo.

Escutei a respiração profunda do enfermeiro.

Se ele não está confortável, que saia da minha casa. Gostaria que isso acontecesse.

Mas percebo que não irá, assim que ele começa a falar de novo.

— Gemma me falou que você não gostou muito da ideia de ser cuidado por alguém.  - Ele disse calmamente.  — Não vou te importunar, só preciso fazer meu trabalho.

— Tá. 

Louis levantou da poltrona, e foi pegar sua, sei lá, maleta com equipamentos médicos, eu acho.

Eu não consegui ver o que havia ali dentro, o que me despertou certa curiosidade.

— Vou medir sua pressão, tudo bem?  - Ele avisou e começou a fazer, sem esperar minha resposta. Afinal, o médico era ele.

Seu toque era leve, mas sua mão era áspera.

— Está ótimo.  - Ele disse sorrindo um pouco.  — Se você estiver cansado, posso te ajudar a ir até o quarto.

Eu sei que ele estava tentando ser legal, mas eu não precisava de sua alegria.

— Consigo fazer isso sozinho. Valeu.  - Disse sem me importar.

Percebi que o enfermeiro ia dizer algo, mas não completou.

Eu subi as escadas devagar, já que a tontura persistente estava me atrapalhando.

Cheguei no meu quarto, troquei de roupa e me deitei.

Quase gemi baixinho quando meu corpo sentiu minha cama macia. Finalmente estava confortável.

Tentei não pensar que havia outra pessoa em casa comigo, afinal, isso já estava me estressando.

Por um instante, me peguei pensando em Louis. Ele parecia ser novo para ser enfermeiro.

Ele parecia é gentil, mas um traço de dúvida me alertava.

Apaguei meus pensamentos. Ele era só um enfermeiro, não há nada além disso.

Logo, eu adormeci naquela tarde. Não sei por quantas horas eu dormi, mas quando despertei, já era noite.

Me levantei, e senti uma dor forte na cabeça, além da tontura.

Que merda. Eu mal acordo, e já desejo dormir de novo, só para não sentir essa sensação ruim.

Alguém bateu na porta, e deduzi ser Louis.

Ele andou explorando minha casa? Como ele sabia onde eu estava?

— Entra.  - Disse com a voz rouca.

Mais uma vez, eu estava certo. O enfermeiro colocou a cabeça pra dentro da porta do meu quarto.

— Desculpa, eu escutei você acordar e, normalmente, pacientes com danos cerebrais se sentem mal ao despertar.  - Ele disse olhando para mim.

— É. Minha cabeça dói e eu estou tonto. Mas isso acontece desde o acidente.

— Eu posso entrar?  - Ele murmurou timidamente.

— Ah, sim, claro.  - Permiti, sem realmente querer fazer isso.

Louis entrou e parou na minha frente. A nossa diferença de altura era engraçada.

Ele tinha que olhar pro alto, para conseguir encarar meu rosto.

— Está quase na hora do remédio, você quer comer algo antes? Sua irmã deixou comida aqui.

Eu neguei com a cabeça, e o enfermeiro se afastou um pouco de mim, e ficou em silêncio.

— Eu vou, hm, tomar banho.  - Avisei.

Louis concordou.  — Só não molhe seu cabelo. Os pontos ainda são recentes.

Ele saiu do quarto, me deixando sozinho novamente.

Entrei no box, e deixei a água quente percorrer todo o meu corpo, aproveitando aquela sensação.

Acabei, me vesti e sai do quarto.

Percebi que o enfermeiro estava arrumando suas coisas no quarto de hóspedes, assim como Gemma me explicou que aconteceria.

Fui para a sala de estar, e encontrei sua maleta em cima da mesa.

Um ar de curiosidade tomou conta de mim. Não faria mal ver o que tinha ali, não é?

Até porque são só equipamentos médicos.

Eu coloquei minhas mãos na maleta, e a abri devagar.

Meu coração deu um pulo, e senti minha visão ficar turva.

Danos Cerebrais - L.S Onde histórias criam vida. Descubra agora