Capítulo 3

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O show iria acontecer no palco do Salão Mayor, e todos estavam convidados a prestigiar os novos talentos que chegaram na universidade. Estava usando meu vestido vermelho, e à medida que caminhávamos, podia sentir minhas mãos suadas e tremendo. Concentrei a minha respiração e mantive meu olhar a frente. Adentramos ao salão, já encontrando uma infinidade de cadeiras para a plateia e alguns pequenos cômodos montáveis perto do palco, uma espécie de camarim para quem iria se apresentar em seguida. Lola e eu tomamos alguns assentos mais ao meio, e ela colocou sua mochila na cadeira ao lado dela:
- Vai guardar lugar pra quem?
- Um amigo do segundo ano, ele pediu para sentar conosco.
O show estava quase começando quando mais uma turma adentrou ao salão, Lola ergueu o braço e um rapaz de cabelos caramelos se dispersou do grupo vindo para perto de nós, e só quando ele estava próximo que eu o reconheci; Ethan. O cabelo estava penteado para trás, ele usava uma camiseta branca que com certeza já devia ter saído do guarda roupa, com uma jaqueta preta e uma calça jeans. Ele passou por nós e cumprimentou com um beijo na bochecha; quando ele se aproximou, eu senti aquela mesma fragrância, amadeirada e forte. Meu coração disparou, o último resquício de dúvida que me restava sobre quem era meu parceiro misterioso desapareceu, e eu estava cara a cara com ele:
— E aí meninas, acho que não fomos apresentados. Me chamo Ethan Blackwood, mas pode me chamar apenas de Ethan.
Ele me lançou um sorrisinho sutil. O lugar que Lola guardara era no meio, entre nós duas, e eu poderia estar ficando louca, mas eu tenho certeza que vi um pequeno sorriso despontar dela. Ele se aproximou de mim, sussurrando no meu ouvido:
— Para todos os efeitos, acabamos de nos conhecer.
Arrepiei. Aquela voz - não devia nem ser possível tal existência. Com todo o alto controle que tinha, apenas o encarei e acenei levemente com a cabeça, voltando meu olhar para frente, mesmo ainda sentindo o seu queimar em mim.
            Sam South subiu ao palco, o que indicava que eu deveria ir aos camarins me arrumar. O pequeno cômodo tinha um espelho com luzes e outro na parede ao lado, comprido para permitir a visualização completa; eu já havia feito a maior parte da maquiagem antes de vir, então apenas terminei os olhos com um brilho rose, iluminador nas bochechas e batom no mesmo tom. Fechei os botões do vestido e observei o caimento; eu estava um pouco mais magra mas nada que ficasse muito visível, as fendas ainda cumpriam o papel, assim como o decote coração, meus seios estavam mais fartos, o que fez o decote se destacar um pouco mais. Escutei Henrique, que estava guiando as apresentações, chamar pelo meu nome; saí do pequeno camarim respirando fundo e subi ao palco, onde um microfone estava posicionado no centro. Assim que foquei a minha visão na grande plateia, pude ver Lola acenando e fazendo sinais de incentivo.
- Olá! Me chamo Sky Dawn e hoje eu vou cantar pra vocês.
Puxei o microfone do suporte, uma última respirada profunda, quando a primeira nota saiu da minha boca, o mundo desapareceu.
Ethan
            Os primeiros toques de Heart Attack da Demi Lovato soaram nas caixas de som do palco, Sky cantava os primeiros versos, uma voz que parecia feita de mel:
— Lola! Ela canta muito bem!
— Espera só pra ver.
Os olhos dela estavam marejados, a música se encaminhava pela melodia e a felicidade dela era palpável. Vendo ela ali com aquele vestido vermelho, os cabelos castanhos batendo conforme ela andava pelo palco; o cheiro de flores e cereja voou até mim, me deixando hipnotizado.Voltei a assistir a apresentação com admiração, lembrando da musica que minha melhor amiga ouvia escutava em casa, e foi quando realmente tive um estalo na minha mente:
— Lola, ela não vai...
— Ah sim Ethan, ela vai sim.
A nota alta:
— I'm flying too close to the sun. And I burst into fla-fla-flames.
Minha boca caiu, literalmente. Sky alcançava cada vez mais alta a cada nota do refrão, e não vacilou em nenhum momento. Lola foi a primeira a se levantar para aplaudir e assobiar, eu me levantei em seguida e depois todos da plateia se juntaram em um aplauso, e Sky estava com um sorriso de gratidão estampado no rosto. Ela estava tão linda.
            Ela voltou para o pequeno camarim, provavelmente iria tirar o vestido, e eu me perdi nos meus próprios pensamentos até que ela saiu e escutei-as conversando
— Acho que ele tá imaginando você amiga.
— Impossível sua louca.
— VOCÊ TÁ VERMELHA!!
— Tô nada!
Lola riu mais alto, e acabou me tirando do transe.
— Ah que bonitinho, ele tá todo vermelho.
— Que?
Lola apenas sorriu disfarçadamente e balançou a cabeça para os lados, como se dissesse “eu não vou me meter”, e me deixando em uma situação embaraçosa, olhando no fundo dos olhos castanhos de Sky que de fato estava com as bochechas vermelhas, o peito subia e descia em respirações profundas; com o vestido pendurado em seu braço ela desviava o olhar de mim diversas vezes, eu também fazia isso, mas um momento nossos olhares se encontraram e eu dei um meio passo para frente, segurando levemente seu queixo com a ponta dos dedos, os olhos dela tremiam levemente quando eu aproximei nossos lábios, o seu cheiro de flores e cereja acariciando meu pulmões, tocando-os com reverência e cuidado, ela acabou retribuindo, movia-os timidamente como se fosse a primeira vez e deixava sua cabeça cair levemente para trás, como se me deixando aproveitar nossa diferença de altura. envolvendo meu pescoço com os braços e os meus em volta de sua cintura. Até que ouvi um estalar repetido de dedos:
— Ethan, tá tudo bem?
— Sim... O que aconteceu?
— Você parecia em outro lugar, sua mente viajou muito longe — Ela riu descaradamente.
“Só se tiver viajado para o corpo dela. Meu Deus, o que eu estava pensando?”
— É... Deve ter sido isso mesmo.
— Vem, Lola chamou a gente na cafeteria. Ela faz questão de brindar minha apresentação.
Ela revirou levemente os olhos em tom de brincadeira e saiu andando, eu a segui com um único passo para trás; as lembranças falsas que minha mente criara ainda queimavam, e cada vez que olhava para frente, meus olhos se prendiam em sua calça jeans escura ou em seus braços dobrados que carregavam o vestido e a bolsa. Obriguei meus olhos a focarem em outro ponto durante o curto trajeto até a cafeteria, onde Lola nos esperava em uma das mesas; à sua frente, três copos com um líquido âmbar e um grande bolo de chocolate.
SKY
— Senhoras e senhores. Eis aqui a nossa estrela da noite! 
Lola iniciou uma grande salva de palmas que trouxe calor para as minhas bochechas; Ethan estava um passo atrás de mim, onde se manteve enquanto eu ia até a mesa principal. Lola me puxou para um abraço apertado, me fazendo sorrir:
— Um brinde ao novo período, aos novos alunos e aos novos talentos!
Todos ergueram seus copos, brindando entre si; sentindo o sabor adocicado do refrigerante que encheu meu coração de memórias de casa, partimos o bolo e a música foi iniciada. Foi isso até às duas da manhã; muita risada, brincadeira, e gritaria. Ritmos de várias partes do mundo se amarravam; dancei coreografias de infância com as meninas, solos dos anos 2000 e até me atrevi a puxar Ethan e outros rapazes para dançar algumas músicas clássicas; vê-los rindo, se atrapalhando totalmente e impressionados enquanto eu rompia com a convenção social e guiava os passos. Ethan sempre que podia, me puxava para dançar, rindo alto. Até o momento em que eu escorreguei em um copo caído no chão. Caí de joelhos, com as mãos sobre os estilhaços do copo, que causaram diversos pequenos cortes na pele. Ele me puxou do chão, o semblante desesperado, e precisei de toda minha lábia - que não era muita com ele - para que me deixasse ir ao banheiro para remover os pedaços de vidro, a água causou ardência, mas obtive sucesso. Acabei ficando com alguns cortes mais profundos, o que o assustou ainda mais, ele insistiu em me levar para a enfermaria, onde fui examinada. Enquanto a enfermeira de voz doce analisava os cortes nas mãos e arranhões nos joelhos, eu precisava acalmar a ele - caminhando nervoso de um lado a outro, ou sentado no pequeno sofá, mexendo os pés e as mãos sem parar - até que finalmente, a querida enfermeira sorriu:
— Muito bem dona Sky, vou te passar um remédio para caso de dor, mas não tivemos grandes problemas por aqui. Apenas cuide para trocar os curativos pelo menos uma vez ao dia e depois de três dias, apenas trate com a pomada, sem tampar, para que os cortes sequem, está bem? 
— Combinado — apertei os olhos para enxergar o nome no crachá — Jen.
— Então está tudo certo, agora tente dormir um pouco.
— Pode deixar. Até! Tenha uma boa noite.
— Igualmente. 
Saímos da enfermaria, Ethan tentava - sem muito sucesso - controlar a respiração. Segurei suas mãos e olhei fixo em seus olhos inquietos:
— Ethan, eu estou bem, não tem motivos para ficar nervoso.
— É que — ele engoliu em seco — você caiu enquanto dançava comigo, eu podia ter te segurado.
— Ei. Já passou, eu estou bem. 
— Posso te abraçar?
— É claro. 
Ele me abraçou com força, e eu retribui tanto quanto pude, e então voltamos para o espaço em que tinha sido a nossa comemoração, apenas nossas amigas estavam por lá, já limpando tudo. Eu quis ajudar, mas Ethan não deixou - ele mesmo pegou a vassoura restante e ajudou as meninas, e então subimos juntos até a ala dos quartos; meu corpo estava cansado o suficiente para me fazer querer apenas mergulhar na cama, mas minha mente ainda estava desperta, lembrando-me o tempo todo das risadas e dos toques - as mãos dele - na minha cintura enquanto dançávamos, o perfume me instigando, incentivando a imaginar - a tomar - os próximos passos. Dormi com esses pensamentos, vencida pelo cansaço, ainda que minha cabeça se recusasse a tomar o mesmo rumo.
O dia seguinte veio com muitas nuvens, arrastando-me, fui ao banheiro, tirei os curativos de ontem a noite para lavar o rosto, e então os refiz. Abri a janela do quarto, para encarar dois segundos de vento forte e fechar; puxei do armário uma legging preta, uma camiseta branca simples e um grosso moletom azul marinho, calcei meu all star e amarrei meu cabelo em um coque bagunçado no alto da cabeça. Estava morta de preguiça e cada passo era arrastado. Encontrei Lola ao pé da escada, com seu clássico copo do Starbucks cheio, mas ao contrário de mim, ela estava vestida para o frio com elegância; uma calça que imita jeans e uma blusa de uma pesada lã branca que desce até os joelhos, os cabelos amarrados em um rabo alto, os lábios tingidos em um rosa envelhecido e os pés protegidos por lindas botas pretas: 
— Bom dia Sky.
— Bom dia Lola. Me diz como você consegue se arrumar desse jeito nesse clima?
Ela riu baixo.
— Eu vivia no Canadá. Estou bem acostumada a viver no frio. Quer café? Você está com uma cara péssima.
— Eu quero. Meu ânimo está zerado hoje. 
Tomei um gole da bebida, sentindo o sabor do café e caramelo. Seguimos para as salas, meus pés se arrastando pelo piso. Quando chegamos à sala, todas as minhas vontades se resumiam a deitar-me sobre a mesa, mas me forcei a manter os olhos abertos quando o Sr.Foster entrou na sala. A alguns dias ele vem fazendo suspense sobre o próximo assunto que trabalharia, e a cada aula que ele iniciava, minha ansiedade aumentava:
— Bom dia pessoal. Como eu venho avisando vocês, hoje iremos iniciar um novo assunto, já devo alertar de antemão que este será o tema mais abordado na prova trimestral, portanto sugiro que agucem sua atenção e não percam nenhum detalhe, como já deixei claro, qualquer dúvida estou a disposição. Dito isso, vamos ao tema: Sistema Laban/Bartenieff de Análise do Movimento, ou método SLAM, como gosto de chamar. Vou passar agora um vídeo de uma apresentação e quero que vocês se atentem aos movimentos dos bailarinos.
O vídeo era de uma bailarina solo, caminhando pelo palco; ela estica o corpo, muda o tamanho dos passos aleatoriamente, mistura os estilos, e depois se coloca no meio de outros bailarinos que criam um fundo para seus passos. Fiquei hipnotizada com a leveza com que dançava, com a facilidade de interagir com o palco, até mesmo com o espaço vazio, como se fosse um simples grão de areia no ar:
— Muito bem. Percebem o jeito que ela se movimenta? Como não está presa a um passo ou a uma coreografia,  mas sim guia a si mesma pelo espaço que possui: Isso é o SLAM, que nada mais é do que observar e descrever o movimento humano a partir de um sistema desenvolvido com essa finalidade, que leva quatro bases principais: corpo, espaço, esforço e forma. Essas quatro chaves estimulam o olhar e a investigação do movimento, tanto seu quanto dos outros. Para resumir, é uma forma de se desapegar da necessidade de uma coreografia, apenas interagindo com o espaço que você tem de forma única.
A aula acabou em um piscar de olhos, e tenho certeza de que se tivessem me observado em qualquer momento da aula, teriam visto os meus brilhando, de felicidade; a matéria simplesmente me encantou, a dança lírica, como eu conhecia, sempre me impressionava e, agora conhecer um método de análise nesse estilo, estava apaixonada.
transição
Era um sábado à noite, e desde ontem, meu único plano era passar o fim de semana lendo. Desde segunda, o clima despencou e não existiria um fim de semana melhor, até que Lola e Jéssica entraram correndo no meu quarto, como um furacão:
— O que vocês estão fazendo aqui?
— Viemos te levar para sair 
— Sair? Vocês viram o frio que está lá fora? Eu não vou sair daqui.
— Ah Sky! É um sábado à noite, não desperdice isso. Até Lola topou.
E realmente. Lola estava com uma cara de cachorrinho abandonado que eu não consegui encarar:
— Onde?
— Um boliche no centro.
Respirei fundo. Parece que os livros e o edredom vão ter que esperar:
— Está bem. Eu vou.
— Uhul! — Elas gritaram em uníssono — Corre se trocar que já chamamos o táxi.
Me levantei quase caindo no chão, indo até o armário e puxando a primeira peça que vi: uma camisa de flanela vermelha. Coloquei uma jaqueta preta que lembrava vagamente uma farda militar. Para combinar, vesti uma calça, uma mom jeans clara, e calcei meu all star. Optei por deixar o cabelo solto e coloquei algumas jóias prateadas.Passei um pouco de rímel e gloss também, para esconder o rosto inchado. Quando saí do banheiro, encontrei as duas com expressões extremamente impacientes, tanto que literalmente me puxaram para fora do quarto. 
O vento uivava nas árvores e arrepiava meus braços. Assim que entramos no carro, já arrancamos pela estrada, até encontrarmos o prédio. Subindo as escadas chegamos já sentindo o cheiro forte de fritura. Encontramos uma mesa perto das pistas e prontamente um garçom já veio nos atender:
— Boa noite senhoritas, o que desejam?
— Três tropicals e uma porção de batatas fritas, por favor.
— Certo.
Ele deixou a mesa, e eu lancei para Jéssica um olhar mordaz:
— Porque você pediu sem perguntar pra gente?
— Porque vocês com certeza iriam pedir algo bem sem graça, e nós saímos para nos divertir, temos que aproveitar. Agora, vamos jogar!
Encarei Lola que só sorriu, me olhando como se dissesse “ela tá certa”, então só suspirei e as segui para as pistas. 
transição
— HÁ! Mais um strike!
— Caramba, Lola! De novo!?
— É tudo questão de estratégia.
Ela riu e veio para pequena mesa que tínhamos na pista; de nós três, o seu copo era o mais cheio, e o de Jéssica o mais vazio - e já era o segundo. Me aproximei da pista, já com uma das pesadas bolas na mão, e lancei pelo assoalho liso, e… canaleta. De novo.
— E com essa são… sete jogadas que Sky Dawn não acerta nenhum pino.
— Não se esqueça que você tá a um ponto só atrás de mim Jéssica!
— Mesmo assim, você só acertou as três primeiras por pura sorte.
Voltei à mesa e puxei mais um gole da bebida; o tropical nada mais era do que uma mistura de gin e energético, cheio de frutas e especiarias, bem fresco, e apesar de não querer admitir, muito gostoso:
— Aquele é o Lex?
Todas nos viramos, a tempo de ver três meninos subindo pelas escadas. Lex foi o primeiro a notar Jéssica, vindo rapidamente em nossa direção. Os outros dois o seguiram de longe, e foi quando perdi o ar:
— Ethan…
Ele sorriu largamente ao me ver, e o rapaz que os acompanhava, um menino de pele branca e cabelo moreno grande, usando óculos pretos redondos, camiseta cinza com uma camisa social branca por cima e uma calça jeans escura, olhos verdes tímidos encararam Lola, indo até ela, me deixando frente a frente com Ethan; alguns passos nos separavam e ele me observava, antes de encurtar essa distância e me envolver em um abraço:
— Senti sua falta… como estão as mãos?
— Bem melhores, nem sinto mais. Obrigada por ter me levado para a enfermaria naquela noite.
— Era o mínimo que eu poderia fazer.
Ele beijou a ponta dos meus dedos e a palma da mão, e então me abraçou mais forte.
— Sky! Sua vez.
Estampei minha insatisfação quando me soltei de seus braços e fui em direção a pista; lancei um olhar mordaz para Jéssica no mesmo tempo da bola - e fiz um strike, arrancando olhares de espanto das minhas amigas. Voltei para perto dele, que não demorou a me abraçar de novo:
— Parece que seus beijos me deram sorte.
— Como assim?
— Eu estava a sete rodadas sem acertar nenhum pino, aí você chega e eu acerto um strike de primeira?
Ele puxa meu braço e me gira por uma vez:
— Talvez seja porque ela virou ao meu favor quando te encontrei. 
— É, pode ser. — me estiquei para alcançar minha bebida na mesa — quer um gole?
— Eu quero. — ele puxa a bebida pelo canudo — que delicia! O que é?
— tropical.
Ele soltou uma risada rouca, e deu mais um gole:
— Coincidência ou não, é um dos meus drinks favoritos.
Ele riu, apenas me fazendo rir junto; Lex e Jéssica estavam próximos em um canto, e Lola falava animadamente com o outro garoto que estava junto, e claro, intercalamos as jogadas e os goles de bebida, com a loirinha que não era vista, passando a frente de todos, e eu poderia estar enganada, mas ela era a que parecia estar menos interessada no jogo, desde que o misterioso rapaz tomou sua atenção:
— Quem é o menino que veio com vocês?
— Ryan. É um calouro também, do curso de escrita, pelo que parece. Lex que o convidou.
— Lola perdeu todas as jogadas desde que ele chegou, sendo que ela quem estava ganhando.
— Eu entendo ela. Não é fácil se manter concentrado quando aquela pessoa está perto.
Ele me encarou. Aqueles olhos dourados hipnotizantes pareciam fitar cada milímetro dos meus pensamentos, me desafiando a ousar desviar o olhar. Eu queria poder dizer que identifiquei o jogo, mas a verdade é que estava tão absorta pelos raios que cruzavam a sua íris que simplesmente mergulhei naquela sensação; meus braços e pescoço se arrepiando, a respiração ficando curta - eu simplesmente não consegui parar até irmos embora.
    Jéssica precisou que Lex a apoiasse, exagerou tanto na bebida que mal conseguia se manter de pé; Lola e Ryan saíram de mãos dadas, com ela dizendo que iria voltar caminhando com ele. Já Ethan e eu fomos os últimos a sair, e acabamos caminhando de volta também. O céu estava encoberto por nuvens, e mesmo que eu estivesse ao lado dele, as estrelas sempre pareciam estar presentes quando estávamos juntos, e hoje não foi assim:
— Um pensamento por outro?
Ele trocou a mão que segurava a minha, para passar um dos braços sobre meus ombros:
— O céu está apagado hoje…
— E porque isso parece te incomodar tanto?
— Porque sempre que estamos juntos, as estrelas estão presentes também. Eu senti a ausência delas, porque sempre me fazia sentir acompanhada das melhores pessoas do mundo; minha avó, minha mãe, e você…
— Eu não senti falta das estrelas. Porque eu posso ver todas elas bem aqui.
Ele segurou delicadamente meu queixo, trazendo meu olhar de encontro ao dele, sempre parecendo que eu encarava o sol, ou então uma grande mina de ouro. Seus lábios tocaram levemente minha testa, e depois fui envolvida em um abraço; seu perfume amadeirado me fazia sentir em uma cabana no meio da floresta, com uma lareira crepitante e grilos cricrilando; uma sensação de proteção me tomou, escutar as batidas de seu coração, retumbantes aos meus ouvidos me fez sentir segura. Voltamos a caminhar, e, coincidência ou não, as nuvens se afastaram, permitindo as estrelas a voltarem a brilhar.  

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⏰ Última atualização: Apr 21, 2022 ⏰

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