Convocação

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Aron estava em choque. Olhou ao redor e viu todas as pessoas paradas incrédulas com os olhos fixos nele. Sem o gorro, sentiu-se nu, como se todos ali tivessem invadido sua intimidade. Cathy foi a primeira a se manifestar.

— E daí? O que muda? Ele é a mesma pessoa que vocês conhecem desde criança. O mesmo caçador que alimenta a aldeia, o guerreiro que protege as estradas, o amigo que ajuda quando necessário.

Ninguém disse uma palavra.

Aron se virou para o líder da aldeia, retirou os ingredientes solicitados pelos curandeiros e estendeu a mão para entregar a ele.

Ao ver Aron estendendo a mão, o líder deu um passo para trás e hesitou por um instante. Depois, pegou os ingredientes, agradeceu com um aceno de cabeça e correu para sua cabana para tratar a esposa.

Aron ouviu o menino Phillip perguntar para a mãe por que ele tinha orelhas compridas se não era elfo. Todas as pessoas sussurravam e quando Aron lhes dirigia o olhar, calavam-se imediatamente. Alguns aldeões instintivamente levaram as mãos a qualquer arma que tivessem por perto.

— Acabou o show. Todos podem ir para suas casas — disse Karl acenando para a multidão. — Temos assuntos a tratar — continuou, falando apenas para Aron.

Cathy se aproximou para participar da conversa.

— Desculpe, gatinha, mas o assunto é privado. Não se preocupe que seu amigo não fez nada de errado, não é ilegal ser meio-elfo. Tenho apenas uma mensagem para ele — disse.

Cathy não se moveu e insistiu em permanecer para participar da conversa.

— Seu amigo já é bem grandinho e não precisa de você como babá. Suma daqui antes que eu lhe prenda. Já tenho motivos de sobra para te prender por agressão a um comandante da guarda — falou Karl para Cathy.

Aron fez sinal positivo com a cabeça para que ela obedecesse.

Cathy apertou os olhos e, bastante contrariada, afastou-se e se encostou numa cerca próxima, ficando a observar os dois conversarem.

— Então, garoto... Aqui está a carta lhe convidando para uma audiência com a feiticeira Mysly. É um convite, não uma convocação, mas acredite que vários feiticeiros matariam pela oportunidade que você terá. Estou aqui para escoltá-lo em segurança para a cidade, pois as estradas andam mais perigosas recentemente — disse Karl.

Aron não prestava atenção no que Karl falava. Seu pensamento estava em outro lugar.

— Ei, garoto. Não me faça repetir tudo de novo — disse Karl com um cutucão.

— Você não tinha o direito de me expor assim — disse Aron.

— Eu tinha uma ordem e vim aqui cumpri-la. Grande coisa ser meio-elfo, eu sou meio-gigante.

— Meio-gigante é normal, meio-elfo não — disse Aron aos gritos.

— As pessoas vão se acostumar. Mostre a eles do que você é capaz e te respeitarão.

Karl informou que partiriam ao amanhecer e que, se ele decidisse se juntar a eles, não deveria se atrasar. Reforçou que o convite era apenas para Aron enquanto olhava para a felline que o fulminava com os olhos à distância.

Aron, ainda anestesiado com os acontecimentos daquele dia, começou a andar em direção à sua cabana. Cathy veio correndo ao seu encontro e, sem dizer nada, lhe deu um abraço.

— Eu sei o quanto você tinha medo disso acontecer, mas vai ficar tudo bem. As pessoas vão entender — disse Cathy.

— Você viu como me olharam? O medo nos olhos, as mãos apertadas nas armas, o julgamento e condenação sem falar nem uma palavra? — desesperou-se enquanto ela apertava mais forte o abraço.

O Feiticeiro MestiçoOnde histórias criam vida. Descubra agora