Coração bandido

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[.......]

Coração roubado
Segunda feira
" Danilo, tenho uma lista de processos que necessitam ser analisados" Murilo disse entrando em minha sala e jogando uma pilha de papéis em minha mesa.
Bufei, afinal de contas já eram quase 20:00 horas é tudo que eu mais queria era ir para casa e cair na cama.
"Não acha que está tarde para conversarmos sobre isso?" Perguntei nervoso "O expediente já acabou há muito tempo" Completei entre uma bufada e outra.
"Não tenho culpa se o chefe quer isso para ontem" Murilo falou estressado " Meu expediente acabou há muito tempo e eu também estou aqui" Ele continuou.
"Você é um simples secretário, tem que ser o último a ir embora mesmo, mas eu, não preciso disso, sinceramente estou cansado" Expliquei " Faz dias que não durmo" Finalizei me levantando da mesa, pegando meu terno que estava sobre a cadeira preta de rodinhas e o vestindo.
"Amanhã vejo isso!" Disse indo em direção a porta " Boa noite!"Disse batendo a porta.
[...]
Meu carro era o único no estacionamento, parado em uma vaga ao lado do celta prata de Murilo, liguei-o e, me retirei dali o quanto antes, estava cansado, com fome e com sono e, tudo que mais gostaria era chegar em casa.
A Marginal estava um caos, parece que todos os paulistas decidiram sair mais tarde do trabalho, ou melhor, parece que todos decidiram sair para fazer sei lá o que ás 21:00 horas da noite, o que culminou em um atraso considerável em meu horário de chegar em casa.
Resmunguei alto, enquanto escutava as notícias, não aguentava mais o tormento de ter que trabalhar na sessão jurídica da empresa de cosméticos "Bella Piel". Veja bem, não é como se eu não gostasse do cargo, na verdade eu o amava, ganhava um salário considerável, tinha uma vida estável, que me presenteava com regalias, todavia, sentia-me completamente sobrecarregado.
Meu chefe, era um homem alto, gordo, com cabelos grisalhos, que deixavam claro que ele tinha mais de 50 anos, havia herdado a empresa de seu falecido pai. Sua administração era boa, gerando-lhe um capital invejável, todos na empresa queriam ser como ele, o único que não dava a mínima era eu.
O odiava pelo simples fato dele querer mandar em todos, não respeitando o horário do expediente, sempre nos procurando próximo da hora de ir embora, para que fizéssemos hora extra. Achava-o um tirano que não conhecia as leis trabalhistas.
[...]
Cheguei em casa após duas horas de cansativo trânsito e, ao abrir a porta dei de cara com Maggie, que encontrava-se deitada no sofá da espaçosa sala de estar vendo televisão. Ela usava um robe de cetim rosa bebê, os cabelos castanho claros estavam jogados pelo sofá.
Aproximei-me dela beijando-a carinhosamente na face.
" Você demorou hoje" Ela disse sem tirar os olhos da novela que assistia "Deixei seu jantar no forno" Completou "Não se preocupe com a louça, amanhã a empregada lava" Ela disse e eu assenti positivamente com a cabeça.
Maggie era uma mulher de 26 anos, filha do meu chefe, João Mesquita, nos conhecemos em uma festa da empresa e, eu fui apresentado a ela por seu próprio pai, uma vez que, segundo ele, eu seria uma boa influência para sua filha, que estava tentando passar no vestibular de direito. Na época, eu tinha 23 anos, trabalhava como estagiário da empresa e Maggie tinha 19. Ajudei-a com o que eu podia e, acabamos nos envolvendo, todavia, eu nunca quis nada sério com ela, além de noites casuais de sexo. Maggie também não parecia se importar com o fato de sermos apenas "amigos que transam" ela mesma nos denominava assim. Ficamos assim por 4 anos, até que seu pai exigiu que eu tomasse providências quanto ao meu envolvimento com ela e, decidimos morar juntos, todavia, era algo de fachada.
Maggie aceitou morar comigo para fugir das brigas intermináveis com o pai que não a deixava fazer o que ela queria e, eu aceitei morar com ela para não me sentir tão sozinho. João Mesquita queria que nos casássemos, entretanto, como nunca sentimos nada forte um pelo outro, não tínhamos coragem de "estragar" nossas vidas a esse ponto.
Tomei um banho demorado, fiz a barba, peguei meu prato no microondas e resolvi jantar, Maggie cozinhava muito bem e, não demorou muito para que o cheiro de filé de tilápia ao molho madeira enchesse a casa.
" O cheiro está delicioso Mag" Disse da cozinha
"Espero que goste D" Ela disse
"E como foi o trabalho hoje?" Perguntou
"Uma grande merda!" Respondi "Sei pai é um tremendo tirano!" Falei e ela riu gostosamente
" Eu não o suporto, por isso sai de casa" Ela disse sincera
"Vai dizer que não gosta nem um pouco de mim?" Perguntei sentando-me na sala de jantar com o prato em mãos, abocanhando um delicioso pedaço de filé.
"Você sabe que eu gosto de você, só não o amo" Disse sincera, a novela havia acabado e ela sentou-se ao meu lado na mesa.
"Eu entendo" Disse entre uma garfada e outra
" E você?" Ela perguntou
"Eu o que?" Perguntei sem entender
"Me ama?"
"Óbvio que não" Disse e ela me olhou sem expressão, ponderou um pouco e depois respondeu seca
"Estamos quites então" Falou deixando a sala de jantar e indo em direção ao nosso quarto
" Quando terminar venha dormir, tem uma surpresinha te esperando" Ela disse manhosa e eu senti todos os meus sentidos aguçarem.
Eu não amava Maggie, mas sentia um enorme desejo por ela, seu corpo escultural, resultado de longas horas de academia faziam com que ela fosse desejada por diversos homens. Eu não tinha ciúmes dela, todavia, seu pai, já havia comprado briga com diversos rapazes, que queriam aproveitar-se dela.
[...]
Terça feira
Cheguei ao trabalho cedo, antes deixei Maggie no consultório de psicologia onde ela trabalhava como psicóloga, ela havia passado no vestibular para direito, entretanto, no segundo semestre percebeu que não tinha vocação para aquilo e, decidiu-se por outra área. O pai dela quase a matou por isso, entretanto, ele não teve outra escolha, afinal Maggie disse que, se não pudesse fazer psicologia ela não faria curso superior algum.
João Mesquita estava em minha sala analisando alguns papéis que estavam jogados na minha mesa, exatamente como eu os havia deixado na noite anterior.
"Danilo!" Ele disse nervoso assim que me viu "Por que não olhou esses contratos? Eu tenho uma reunião daqui há 2 horas com esses fornecedores e, você não fez nada. O que eu direi para eles?" Perguntou alterado
" Diga a verdade, que você pediu que eu analisasse esses contratos depois do meu expediente e, eu como não sou escravo decidi ir para casa descansar" Falei dando de ombros, escutei ele me xingando baixo.
" Você pensa que eu sou algum dos seus amigos?" Ele perguntou com o rosto vermelho "Não te dou o direito de responder assim para mim" Completou "E trate de resolver isso agora, para que dê tempo até que os meus fornecedores cheguem!" Disse saindo da sala
"Otário!" Disse baixo pegando os papéis e os analisando, até que o processo não era tão difícil, o que fez com que eu conseguisse resolver tudo rapidamente
"Seus papéis" Disse entrando na sala de João e jogando-os encima de sua mesa "Faça bom proveito!" Completei me retirando
"Danilo?!" Ele me chamou e eu fui obrigado a voltar
" O que houve?" Perguntei "Fiz algo errado?"
"Nada errado, só estou percebendo que você está mais estressado do que o normal" Ele disse " E isso pode afetar o seu trabalho" Completou "O que acha de pegar Maggie e tirar o resto da semana de folga?" Ele estava brincando comigo? Há uma hora atrás ele estava a ponto de me matar e, agora estava querendo me dar uma folga? Isso era realmente verdade?
" Sr. Mesquita, isso é algo que eu desejaria muito, mas e os seus processos?" Perguntei
"Eu peço para o Leonardo Lins resolver, ele não é tão competente como você, mas, consigo sobreviver sem você essa semana" Disse " Você está precisando de folga, caso contrário vai infartar e, eu preciso de você, afinal de contas, você é o melhor advogado dessa empresa!" Disse e um pequeno sorriso surgiu em meus lábios.
"Eu realmente agradeço pela oportunidade" Disse me retirando dali
Era óbvio que ele estava fazendo isso porque eu estava namorando com sua filha, se fosse qualquer outro trabalhador daquela empresa ele nunca faria isso. Há se ele soubesse que Maggie e eu mantínhamos um relacionando aberto, onde nos relacionávamos com outras pessoas!
[...]
Cheguei em casa cedo, Maggie mandou mensagem dizendo que estava na academia e que depois iria para casa de uma amiga.
Como estava cansado, pedi uma pizza e me preparei para dormir, tinha 5 dias de folga e, precisava saber o que fazer com eles.
Talvez eu pudesse ir para a casa de campo dos meus pais, lá era um lugar aconchegante, com toda certeza eu conseguiria relaxar e, esquecer tudo que vinha passando nesses anos todos de trabalho árduo.
Provavelmente Maggie não iria comigo, afinal de contas, a casa era no interior e, ela odiava cidades do interior, dizendo que elas eram feias e sem graça, sem nada para fazer.
Arrumei as malas, mandei uma mensagem para Maggie convidando-a para ir comigo, todavia, como eu imaginava ela recusou, dizendo que sua semana estava cheia e, que ela iria aproveitar que eu estava fora para poder fazer umas coisinhas.
Eu sabia que coisinhas que ela iria fazer, afinal de contas, de uns tempos para cá, Maggie tinha começado a sair muito com suas colegas de trabalho, iam a danceterias, festas, gostavam de passar o fim de semana em uma fazenda há 2 horas de São Paulo, todavia, eu quase não a acompanhava nesses passeios, pois estava sempre cansado. Com toda certeza, ela iria aproveitar que eu estava fora para ir nesses lugares.
Como Maggie não iria comigo, decidi sair o quanto antes, eu amava dirigir de noite, pois me trazia uma sensação de tranquilidade maravilhosa, além de ser mais tranquilo. Coloquei as malas no carro, liguei o ar condicionado e uma música do Nirvana invadiu o ambiente, relaxando-me, aquelas seriam as 4 horas mais relaxantes da minha semana, pelo menos por enquanto.
[...]
Quarta Feira
Cheguei á casa de campo ainda de madrugada, deitei-me na cama de casal que meus pais mantinham e dormi tranquilamente, acordando às 12:00.
Minha barriga roncava e, eu desejei loucamente algo para comer, todavia, a geladeira estava fazia, então decidi sair para almoçar e, aproveitar para fazer umas compras em um supermercado próximo.
Fui a um restaurante aconchegante próximo a casa, e enquanto comia, um rapaz magro, franzino, vestido com uma blusa polo azul e uma calça jeans surrada aproximou-se de mim.
" Com licença senhor, só queria deixar esse panfleto contigo" Disse "Desculpe atrapalhar o seu almoço" Falou retirando-se dali, não dando tempo nem de eu responder.
Li o tal anúncio, que dizia que o Circo Imperial, acabava de chegar à cidade e que iriam ter matinês todas as noites, a partir das 19:30.
Eu sempre amei o circo, gostava do cheiro das pipocas, de comer o algodão doce quentinho servido nas barraquinhas, de comprar chicletes para assistir durante o espetáculo. Os palhaços eram a melhor parte, ria muito com todos eles, divertindo-me bastante.
"Por que não ir e me recordar do passado!" Pensei alto " Acho que é o máximo que pode ser feito nessa cidade de interior" Completei.
Paguei o almoço, passei em um supermercado próximo, comprei alguns mantimentos e voltei para casa.
[ ...]
Sai de casa às 19:00, estava ansioso, queria recordar-me dos tempos de criança, o local era próximo da minha casa, o que fez com que eu fosse caminhando. Ao chegar ao tal circo, percebi que as instalações eram simples, mas de muito bom gosto, diversas crianças estavam na fila para comprar os ingressos.
" Quero uma inteira por favor" Disse para uma mulher de cabelos ruivos da bilheteria
" R$ 15,00 senhor" A mulher disse, paguei-a e peguei o meu ingresso
" Bom divertimento!" Ela disse sorridente
Sentei-me na fileira mais alta, pois queria ver tudo, sem perder nenhum detalhe. Prontamente as 19:30 o espetáculo começou, os palhaços entraram fazendo palhaçadas, que me fizeram gargalhar, recordando-me dos tempos de criança.
Após isso, um motoqueiro ficou girando no globo da morte, arrancando gritos da plateia, que torcia para que ele conseguisse vencer a prova.
Eu estava tão feliz que nem vi o tempo passar!
"Essa foi mais uma apresentação do circo imperial" O mesmo homem de outrora, que havia me entregado o panfleto dizia. Ele era o apresentador do espetáculo. Ao terminar de dizer isso, todas as luzes de se apagaram, eu achei que o espetáculo tinha acabado e, me preparei para ir embora, quando percebi um pequeno facho de luz no meio do palco. E uma mulher com os cabelos negros como a noite se aproximando. Nesse momento meu coração deu um pulo.
A luz foi aumentando de intensidade, e eu pude observá-la com mais nitidez, ela era baixa, com cabelos negros e longos soltos por toda a extensão de seu rosto, usando um vestido de paête vermelho.
Ela parecia tímida, alheia aos olhares curiosos das pessoas, eu a encarava sem piscar, tentando imaginar qual numero ela iria fazer. Quando escutei um som magistral vindo de sua boca.
Uma voz doce e suave ecoou pelo ambiente, ela cantava docemente, com os olhos fechados. Honestamente, não sou capaz de dizer sobre o que se tratava a canção, pois estava ocupado demais observando cada detalhe do seu corpo. Que mulher era aquela? E por que eu estava sentindo tudo aquilo?
Ela terminou de cantar e abriu os olhos, não sei se foi coisa da minha cabeça, mas notei um olhar dela sobre mim, como se ela me encarasse, ela sorriu, agradeceu o público e, recebeu uma chuva de aplausos.
"Maraísa eu te amo!" Escutei as pessoas gritarem, ela referenciou-se, agradecendo-as e saiu dali calmamente.
Foi aí que o show acabou e todos foram embora, todavia, eu não conseguiria ir, sem antes conhecê-la. Eu não podia perder essa oportunidade!
Sem qualquer noção dos meus atos caminhei até os trailers das pessoas que trabalhavam ali, a movimentação era geral, todos estavam arrumando as coisas. Era interessante pois, todos apresentavam uma alegria ímpar, apesar de terem uma vida tão simples.
"O senhor está perdido?" Percebi alguém tocar os meus ombros, fazendo com que eu olhasse para trás e visse o mesmo senhor de outrora.
"Eu..... Er...... Queria cumprimentar a cantora..... Quer dizer..... qual o nome dela mesmo?! " Perguntei gaguejando e o rapaz sorriu
"Qual o seu nome?" Ele me perguntou
"Sou Danilo, Danilo Gentili" Disse estendendo minha mão "E o senhor?" Perguntei
"Sou Antônio Fagundes, mas todos me chamam de Tonho" Ele disse sorrindo "Venha vou te levar ao trailer da Maraísa" Ele começou a caminhar e eu o segui.
Paramos em frente a um trailer simples de cor vermelho, Tonho bateu na porta e, a mulher ruiva da recepção atendeu.
"O que houve Tonho?" Ela perguntou abrindo apenas uma brechinha da porta, mostrando apenas uma parte de seus olhos.
"Esse rapaz quer falar com sua irmã, Maiara" Ele disse aprontando para mim que sorri timidamente. Então ela tinha uma irmã?! Interessante.
"Ah,sim. Pode entrar então. A metade está tomando banho" Ela disse me olhando dos pés a cabeça.
"Metade é como elas se chamam" Tonho me explicou "As duas se amam muito, são gêmeas" Ele disse e Maiara sorriu sem graça.
"Não tinha reparado" Disse encarando Maiara pelo canto de olho, ela era baixa como a irmã, tinha cabelos longos pintados de ruivo, os quais estavam escovados e lhe caiam sobre os ombros, tinha um corpo franzino e usava um short curto e uma blusa branca. Era uma mulher bonita, mas nem tanto como sua irmã.
"Então o que você faz?" Uma Maiara curiosa perguntou sentando-se ao meu lado
"Maiara!" Tonho disse chamando sua atenção "Deixe o rapaz em paz" Ele disse a encarando
"Deixe, não tem problema em responder, eu sou advogado, trabalho em uma empresa de cosméticos" Expliquei e os olhos dela brilharam.
"Sempre quis ser advogada"Ela disse sincera, ela ia dizer mais algumas coisas, quando a voz magistral de outrora ecoou pelo ambiente.
"Maiara, você não me avisou que tínhamos visitas!" Maraísa disse aproximando-se de nós, os cabelos soltos sobre os ombros, estavam levemente encaracolados, ela usava um vestido curto florido branco, o qual realçava seus cabelos e olhos negros. Maiara levantou-se, apressando-se em me apresentar.
"Esse é o Danilo, ele chegou de última hora e queria te cumprimentar pelo seu número" Ela disse olhando a irmã. Agora, olhando as duas de perto, realmente elas pareciam gêmeas. A morena sorriu sem graça, encarando-me com um sorriso tímido nos lábios. Eu estava encantado demais a observando para ter qualquer reação, além de ficar parado como uma estátua a observando.
Percebendo meu possível desespero, ela aproximou-se de mim, ainda sorrindo, seu perfume era suave e eu sorri ao senti-lo.
"Obrigada pelo carinho" Ela disse me estendendo a mão, a qual eu apertei levemente para não machucá-la, aquela mulher era tão baixa, que eu parecia uma parede próximo a ela. Suas mãos eram delicadas, com um leve esmalte nude sobre as unhas.
Sem dar conta dos meus atos eu a abracei, foi algo rápido, ao qual ela me retribuiu sem graça, todavia, senti-la perto de mim fez com que algo novo surgisse em meu peito e meu coração começou a bater de forma descompassada novamente. O que estaria acontecendo? Por que eu estava agindo desse jeito? Estaria doente?
"Parabéns pela apresentação! Você é uma excelente cantora!" Disse a olhando nos olhos, ela corou levemente e sorriu.
"Obrigada, ela disse baixo, como se não estivesse acostumada com elogios" Eu sorri ao vê-la tímida daquela forma e, algo dentro de mim fez com que eu sentisse a necessidade de conhecer melhor aquela mulher até então desconhecida. Eu queria lhe perguntar tantas coisas, mas, não conseguia pensar em nada, além de "Nossa, como você é linda!" Entretanto, ainda não tínhamos intimidade o suficiente para eu dizer algo desse tipo.
"Maraísa canta desde criança" Maiara disse cortando os meus pensamentos "Ela é um prodígio!" Continuou
"Maiara!" Ela chamou a atenção da irmã olhando-a nervosa. Percebendo o impacto que estava causando nela, decidi que o melhor a fazer seria deixa-las, afinal já tinha tomado tempo demais.
"Eu preciso ir" Disse olhando para as duas irmãs, que pareciam discutir silenciosamente, olhando uma para outra com cara de poucos amigos.
"Está cedo" Uma Maiara falou como se não se importasse com as críticas da irmã "Conte-me mais sobre advocacia, sempre quis seguir essa profissão" Ela disse me olhando. Queria que Maraísa tivesse esse mesmo entusiasmo em conversar comigo, todavia, ela estava mais preocupada em arrumar os cabelos perfeitamente alinhados do que trocar qualquer palavra comigo.
"Já está tarde, Maiara, e ele precisa ir, além de que, nós temos que desmontar as coisas" Tonho que ate então permanecia calado resolveu dizer. Maraísa assentiu positivamente com a cabeça como se concordasse com o homem.
"Bem, então, foi um prazer conhecê-los" Disse já caminhando em direção a porta, quando senti o mesmo perfume doce de outrora inebriar minhas narinas. Olhei pelo canto de olho para trás e percebi que ela estava atrás de mim.
"Deixe-me abrir a porta" Ela disse colocando a mão sobre a maçaneta e abrindo-a cautelosamente "Para que volte mais vezes" Continuou e eu sorri encarando-a. O trailer era pequeno e, estávamos frente a frente, ela era tão pequena que eu tive vontade de abraçá-la.
"Você tem um talento especial" Disse com um sorriso "Nunca pare de cantar" Disse e percebi que Maiara e Tonho estavam parados na sala improvisada nos encarando. Ela sorriu e agradeceu e eu finalmente fui embora.
Queria sentir seu corpo junto ao meu, entretanto, limitei-me a mais um aperto de mão, o qual durou uns 5 segundos, todavia, foi tempo suficiente para que meu coração se descompassasse como nunca havia feito antes. Estaria tendo um infarto?
[...]
Ao chegar em casa ainda inebriado pelo contato de outrora, procurei entender o que estava se passando comigo e, porque estaria tendo todo esse comportamento, pelo simples fato de ter assistido uma artista de circo. Ela não era tão bonita assim, existiam outras mais belas, mais bem cuidadas, Maraísa era apenas mais uma mulher que ganhava a vida como podia, o que eu não conseguia entender era o motivo dela ter mexido tanto comigo.
Deveria ser saudades de Maggie, talvez eu precisasse ligar para ela para que pudéssemos conversar um pouco. Já eram 23:00 da noite, mas como ela dormia sempre lá pelas 1:00 am decidi tentar. O telefone tocou algumas vezes, mas ela não atendeu, fazendo-me questionar se ela não estaria em uma das muitas festas que ela gostava de frequentar.
Vencido pelo cansaço, consegui finalmente pegar no sono.
[...]
Quinta feira
Acordei e decidi dar uma caminhada pela cidade, o ar do interior me fazia bem e, tudo que eu gostaria era de relaxar e esquecer os problemas que o trabalho havia me causado.
Andei sem rumo por algumas horas parando em uma praça para tomar uma agua de coco, quando percebi estar próximo do circo que estivera na noite anterior. Sem entender muito bem o motivo decidi caminhar até lá.
Algumas pessoas faziam a faxina no local, enquanto outras arrumavam as lonas que haviam se soltado com o vento.
Fiquei parado olhando toda aquela movimentação, na esperança de avistar Maraísa no meio todas aquelas pessoas, entretanto, eu não a vi.
Estava a ponto de ir embora, quando senti uma mão pequena tocar meu ombro, chamando-me.
"Danilo?" Virei-me para trás e encontrei Maiara com um olhar tímido, seus cabelos estavam presos em um coque mal feito, ela estava suada, possivelmente pela limpeza que estavam fazendo. Usava uma blusa branca e um short jeans preto.
" Olá" Disse a encarando, todavia, olhando discretamente para os lados na esperança que sua irmã estivesse por perto.
"Precisa de alguma coisa?" Ela perguntou
"Não, eu estava passando por aqui perto e, bem.... Sei la, simplesmente me deu vontade de vir aqui de novo" Falei gaguejando, afinal de contas, dizer que passei pelo circo na esperança de rever Maraísa não seria algo certo a ser dito. O que Maiara pensaria? Provavelmente me acharia um doente ou algo do tipo.
"Eu percebi que ontem você ficou meio perplexo" Ela disse sincera e eu engasguei com minha própria saliva, levando-me a uma crise de tosse. "Maraísa mexeu com você" Ela falou sincera e a crise de tosse aumentou a ponto de me fazer ficar vermelho. Percebendo o meu estado, ela pediu que esperasse e caminhou em direção ao circo.
Tive vontade de ir embora, mas era impossível com aquela tosse infernal. Esperei alguns instantes e, uma Maraísa voltou segurando um copo com água. Eu tive vontade de me esconder, estava vermelho, meus lábios estavam molhados de tanta saliva e eu havia suado um pouco. Ela se aproximou lentamente e eu tive vontade de sair correndo. Um fio de suor escorreu sobre minhas costas.
"Maiara disse que você engasgou" Ela disse e eu me senti como se fosse um bebê que engasga com a papinha "Tome esse copo de água" Ela disse me entregando e eu o bebi de uma só vez, ela me encarava curiosa.
Entreguei o copo de água para ela, agradecendo e, já estava a ponto de ir embora quando percebi que ela tinha algo a me falar.
"Você é daqui mesmo?" Ela perguntou e eu neguei com a cabeça explicando que era de São Paulo e que ficaria aqui por alguns dias para relaxar.
"Por que não volta para o circo hoje a noite? Estou aprendendo uma canção nova e, talvez você goste" Ela disse com um sorriso, eu queria dizer que não ia vir, que tinha que sei lá, estudar mil coisas ou assistir ao jornal nacional, entretanto, algo nela fez com que eu não tivesse capacidade para dizer nada.
"Eu irei" Disse sorrindo, sem ter noção do que havia acabado de prometer "Pode me esperar" Disse calmo e ela sorriu, afastando-se de mim.
Deus, o que eu havia feito? Onde eu estava com a cabeça? E que espécie de transe essa mulher podia causar em mim?
[...]
Jurei para mim que não iria, todavia, a imagem doce de Maraísa pedindo para que comparecesse era mais forte do que tudo e, quando dei por mim já estava diante do circo, comprando meu ingresso. Maiara estava na bilheteria, e quando me viu sorriu contente.
"Que bom que veio" Ela disse
"Eu prometi a sua irmã que viria" Falei sem graça
"A metade vai ficar feliz" Ela disse me entregando o ingresso "Ela pareceu gostar de você" Falou calmamente e eu senti meu coração pulsar acelerado. Ela havia gostado de mim? Isso era inacreditável.
Como um adolescente bobo rumei rumo ao local onde a apresentação aconteceria, minhas mãos suavam e, eu me sentia como se a apresentação fosse feita por mim.
O espetáculo começou e com isso as luzes foram apagadas, eu estava ansioso, os olhos brilhavam e eu só sabia sorrir. Um pacote de pipoca não havia sido suficiente e, eu acabei com três deles enquanto a esperava.
Foi quando em um facho de luz ela apareceu, linda como sempre, com os cabelos negros encaracolados, o sorriso estampado no rosto e um vestido preto de paetês que contrastava com sua pele clara. Ela olhava para todos os cantos do palco, como se procurasse alguém e, quando nossos olhares se encontravam, percebi que era a mim que ela procurava. Ela me encarou sorrindo e e não pude deixar de sorrir de volta. Entrei em uma espécie de transe, como se estivéssemos apenas nós dois no mundo e, todos desaparecessem.
Ao terminar a canção, novamente uma chuva de ovações, eu a aplaudia continuadamente, mesmo não sabendo o que ela ela tinha cantado, pois, estava mais preocupado com nossa troca de olhares do que com qualquer outra coisa.
O show terminou, e ela se foi, mas não sem antes olhar firmemente para mim, como se perguntasse "Você vai ao meu trailer para me cumprimentar, como fez anteriormente" Um sorriso nascia em meus lábios, enquanto ela saia, sempre com uma postura ímpar, como se ela fosse uma daquelas artistas famosas de televisão.
Quando tudo terminou, eu estava pronto para ir para o trailer cumprimentá-la, afinal de contas, já sabia o caminho, minhas mãos suavam durante todo o percurso e, eu rezei mentalmente para que ela estivesse sozinha e pudéssemos por fim ter algum momento a sós.
[...]
Bati na porta duas vezes e esperei, foi quando ela apareceu, os olhos negros expressivos demonstravam um brilho diferente da noite anterior, ela usava a mesma roupa de outrora, e o perfume estava mais marcante do que nunca.
"Oi" Ela disse tímida "Maiara disse que você tinha vindo" Explicou.
"Eu precisava cumprir minha promessa" Disse
"Obrigada por ter vindo" Ela falou e eu coloquei a mão no bolso sem graça
"Eu que agradeço" Disse a olhando firmemente
"Eu vou indo"Disse sem graça "Não quero te atrapalhar" Falei e já estava a ponto de ir para casa quando senti ela me puxar fortemente pelo ombro e fechar a porta.
Estávamos cara a cara a milímetros de distância, o perfume dela inebriava minhas narinas e eu queria beijá-la, mas não podia.
"O que você quer comigo, Danilo?" Ela perguntou baixo com a voz rouca "Ninguém aparece aqui mais de uma vez para me cumprimentar" Disse me olhando nos olhos e eu senti como se fosse desmaiar a qualquer momento
"Maraísa, eu...Er..... não sei...... Te achei.....Enfim, gosto de cantar" Gaguejei formando uma salada de palavras desconexas.
"Gosta de cantar ou de me ver cantar?" Ela perguntou chegando seus lábios próximos aos meus, roçando-os. Aquela mulher era quente, e todos os meus sentidos pareciam ir por água a baixo pela sua simples aproximação.
"Gosto de te ver cantar" Disse e ela aproximou-se mais, agora nossos lábios se encostaram e eu pude sentir seu gosto, mesmo que tenha sido por breves momentos.
"E o que eu cantei hoje?" Ela perguntou com a boca entreaberta, a voz baixa, os olhos cerrados. Eu não pensava, simplesmente minha mente não conseguia raciocinar.
"Eu não prestei atenção, estava atento demais aos nossos olhares" Disse sincero sem me dar conta que havia revelado tudo a ela.
Ela balançou a cabeça negativamente, desvencilhando-se de mim, eu abri os meus olhos a encarando, ela me olhava nervosa.
"Você é como os outros Danilo, como todos os outros" Falou séria

O circo [DANISA]Onde histórias criam vida. Descubra agora