Laços

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Saí andando pelo corredor escuro, indo na direção dos aposentos de Demetrio.

Chegando na porta, bato na mesma. Uma mancha negra apareceu do nada no chão. Mergulhei nela e cai por cima de uma poltrona bem grande. Ali sentada, observei tudo o que tinha no quarto dele. Era grande e espaçoso, parecida com a decoração de todos os outros quartos. Ou, a mesma temática sombria. Mas era bom.

Dos lados do quarto, algumas coisas de criança. Uma cadeira de balanço, um berço, brinquedos... Me levanto da poltrona e começo a caminhar lentamente tentando não fazer barulho.
- por que ele teria coisas de criança?? - perguntei baixinho para mim mesma.
Mais a minha frente, um enorme sarcófago de pedra. A curiosidade me bateu e fui até o mesmo me aproximando. Eu o observei bem de perto. Coloquei minha mão direita sobre a tampa e vi como era gélido. Um pequeno arrepio me veio na espinha. Então me afastei rapidamente.
- venha criança. - a voz de Demetrio ecoou nítida nos meus pensamentos. - abra o sarcófago...

Respirei e abri devagar empurrando a tampa. Ali, dentro do sarcófago eu vi uma Helena que dormia tranquilamente na posição fetal. Igual um bebê. Ela vestia uma camisola branca. Eu a olho com carinho e um pequeno sorriso se forma em meus lábios. Demetrio apareceu do meu lado com a mesma capacidade que ele tinha de desaparecer. O olhei com um olhar de ternura.
- esse é o quarto dela?
- não. É o nosso quarto.
- ah desculpa não entendi. "Nosso"??
- sim. É aqui que por anos, nós dormimos.
- por que??
- ela guarda meu sono.
- Demetrio sabe, admito uma coisa pra você. não sei por que mas, parece que Helena de certa forma é especial pra mim.
- especial? - Demetrio me perguntou calmamente.
- sim. Ela me é muito familiar de alguma forma que eu não consigo explicar. Porém, o problema está ai. Eu não sei o por que me sinto assim relacionado a ela. Mas enfim, por que me chamou aqui?
- velhos laços nunca morrem. - Demetrio falou e sorriu sutilmente.

O olhei sem entender ao certo o que ele quis dizer.
- Ligeia... Helena é sua filha. - o olhei tão espantada, que acho que se eu não fosse vampira teria desmaiado ali mesmo.
- o que???
- ela é sua filha adotiva.
- mas... como?
- você não podia ter filhos. Você e Alejandro a adotaram ainda bebê. Quando ela tinha três anos, vocês contraíram a peste negra, uma doença da época. Alejandro me pediu para salvar as duas. Mas o problema foi que em seu organismo, meu sangue de vampiro demorou muitos anos para finalmente fazer efeito. Você não se transformava e nem morria. Os aldeões acharam que você estava amaldiçoada e que haviam bruxas por perto. Então eles se revoltaram e assustados, atearam fogo na sua casa.
- meus Deus, é sério isso??
- sim.
- mas... Helena não sabe disso ainda.
- por que ela não sabe? Você como pai adotivo dela, deveria ter contado a ela!
- por favor Ligeia me prometa que não vai contar. - ele se aproximou de mim devagar com um ar um pouco assustador.
Estava sério.

Involuntariamente, me afastei dele um pouco.
- por que eu prometeria isso?
- por que é melhor assim. Não posso destruir o mundo perfeito dela, assim de repente.
- não Demetrio não posso fazer isso.
- Ligeia, por favor você tem que entender que isso poderia magoar muito ela. Poderia traumatiza-la pelo resto da imortalidade dela. E você sabe que para nós vampiros, para sempre é muito tempo.

Eu a olhei de lado, vi como ela era amigável comigo, como me recebeu bem quando cheguei a Casa Vermelha, como ela via Demetrio como o pai e herói dela... mil e uma coisas passaram em minha cabeça naquele momento. Então o olhei de volta e assenti.
- obrigada Ligeia. Sei que compreenderia. Esse vai ser o nosso segredo.
- eu posso saber por que você me contou isso se nem posso chamá-la de filha?
- por que você merecia saber.
- mas o que eu faço com isso agora? Estou me sentindo perdida.
Ele não respondeu.
Eu o olhei esperando alguma resposta que dele não veio. Eu só abaixei minha cabeça e fui saindo devagar.
- Ligeia, a Astrix quer que você faça parte de uma nova casa.
- Astrix? - perguntei tentando entender o que seria aquilo.
- Astrix, o conselho vampiro. - Demetrio falou sério.
- devo ficar feliz com isso?
- me diga você. Não era o que queria?
Ele me olhou ainda sério e eu entendi o que ele quis dizer.

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