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Os cabelos ruivos longos como cachoeira desciam nas costas dela enquanto andava até a cozinha, a mulher preparava algo para sua filha comer enquanto a criança brincava com bonecas de pano. Poucos minutos depois um Feérico alto e de presença marcante passa pela porta, e ao ver sua esposa e filha um sorriso se alarga em seu rosto. A garotinha abandona suas bonecas e corre até o pai, no qual a pega pelo ar e a gira.

— Estava com saudade, papai. — O homem sorri e beija de leve sua esposa.
— O jantar está na mesa, meus amores. — O ensopado de carne da mulher tinha o cheiro dominando toda a casa. Os pais conversam como foi a viagem do homem, que durara duas semanas. Após isso, eles se viraram para a garotinha de cabelos ruivos.

— E você, minha princesa, está conseguindo controlar seus poderes?
— Um pouco, papai. As vezes não consigo, mas com alguns dias eu vou estar tão poderosa quanto você e a mamãe. — Os poderes de seus pais não chegavam aos pés da menina, sua mãe possuía somente o poder de cura e seu pai havia herdado o poder de água e era um metamorfo.  A garotinha falava com tanta empolgação que tirou riso dos dois mais velhos.

O poder da menina foi sempre um mistério, seus pais procuraram ajuda por muito tempo quando mais nova, mas nenhum sabia desvendá-lo, então apenas aceitaram aquilo e ajudaram sua filha o máximo que conseguiam.

O poder da menina era pura escuridão.

Batidas soam da porta.

— Está esperando alguém, querida? — A esposa nega. Com a mão na espada o pai abre a porta e fala com alguém, porém em poucos segundos o barulho de seu pescoço quebrado ecoa pela casa, fazendo com que sua mãe corra até a garota e a puxe para dentro da casa.

— Não adianta se esconder, Brilla. — Uma voz feminina fala.
— Majestade... — As mãos da mulher tremiam ao segurar as da filha, lágrimas saíam de seus olhos.

— Vocês poderiam ter facilitado minha vida, sabe? — A rainha. A garotinha sabia quem aquela mulher era. Ela começa a se tremer quando a mulher se aproxima cada vez mais de sua mãe e dela.
— Por favor...

Craque

— MAMÃE! — Ela corre até o corpo caído de sua mãe, a sacudindo enquanto chamava e chamava. — O que você fez com minha mãe? — Os olhos da criança saíram de um tom turquesa para completa escuridão, ela se levantou. A rainha tinha um sorriso triunfante no rosto.

A criança explode em completa escuridão, lançando aquele poder contra a rainha feérica.

Toda a casa havia virado névoa. Pó.

O sorriso da rainha vacila, e antes que a criança fizesse mas algum estrago ela entra em sua mente e tudo muda.

As memórias com seus pais.

Sua infância.

Onde morava.

Tudo sumiu.

Mas não seu ódio por aquela mulher.

— Vamos nos divertir muito juntas, Celeste.

— CELESTE! — Uma voz desesperada me faz despertar. Fios em tom de mel caem fazendo cócegas em meu rosto. Encaro aqueles olhos dourados me olhando, tentando entender o que estava havendo comigo.

— Gavriel? — Minha voz sai baixa e rouca. Ele expira forte e seu aperto em meus ombros diminui, porém seu corpo não saí de cima de mim. — O que está fazendo?
— Eu que te pergunto o que estava fazendo. — O grave de sua voz me fez arrepiar, ele deveria estar dormindo e por algum motivo está aqui. — Você está bem? — Meus olhos passam pelo meu quarto, uma névoa preta... meus poderes estavam aos poucos se dissipando.

— Eu... eu acho que sim. Foi só um pesadelo. — Pressiono minha mão na cabeça, pois ela começou a latejar como nunca, meus olhos fecham por instinto. — Porra. — murmurei.

— O quê? O que está sentindo? Precisa de algo? — Inspiro seu cheiro amadeirado e relaxo meu corpo automaticamente , abro os olhos e vejo preocupação em seus olhos.

— Vou ficar bem, não se preocupe. — Ele se afasta mais de mim e se senta na beira da cama, enquanto eu me sento. — O que aconteceu exatamente?
— Eu ouvi você gritar e vim correndo, quando entrei no quarto estava tudo escuro, seus poderes, Celeste...

— É, eu sei, estão descontrolados. — Bufei e me joguei nos travesseiros, esfregando os olhos como se aquilo fosse aliviar a confusão em minha cabeça. Eu havia gritado? — Obrigada, por me acordar. — Ele sorriu de leve. — Você estava dormindo?

— Na verdade não, estou sem sono. — Ficamos em silêncio por alguns segundos até eu ter uma ideia.

— Tive uma ideia. — Falei empolgada.
— Mal posso esperar para saber o quão normal ela é.
— Ei! — Belisquei seu ombro rindo.
— Ai! — Ele alisava o ombro como se tivesse doído, mas é óbvio que não tinha.

— Dramático. — Revirei os olhos e foi a vez dele de rir. — Enfim, eu sei que Rowan é o tatuador oficial, porém eu sei que é você que faz as tatuagens dele quando ele não consegue, então eu queria saber... — Fiz a minha cara de "cachorrinho abandonado" como nomeou Fenrys para conseguir tudo que eu queria, já que ninguém nunca negou nada a mim quando faço. — Se você poderia fazer umas novas em mim. Por favor. — Cheguei mais perto de Gavriel, ficando apenas centímetros de seu rosto, olhando em seus olhos dourados. Seu olhar percorreu todo meu rosto e se concentrou mais tempo em minha boca, mas logo voltou para meus olhos.

— Ok, você é quem manda. — Sorri triunfante.

Saí da cama e fui andando até meu guarda roupa, bem ciente do olhar de Gavriel na minha camisola curta de cetim preta. Não pude esconder um sorrisinho, graças aos deuses eu estava de costas. 

— Como a frente do meu corpo já tem tatuagens, acho que vou fazer nas costas para juntar com as que eu tenho, pode ser? — Quando ele não falou nada, me virei e me deparei com Gavriel me olhando, como se estivesse em algum tipo de transe. — Gavriel? — Ele olhou para mim.

— Sim?
— Eu te fiz uma pergunta. — Tentei esconder o riso.

— Ah, sim... claro.
— Ah, então se você aparar os pelos em sua forma de leão, seu cabelo ficará raspado... interessante.
— O quê? — Gargalhei me voltando ao armário e peguei um short de dormir e fui até o banheiro colocá-lo. Por fim, me enrolei em uma toalha para cobrir meus seios nus. Quando voltei Gavriel já estava com os materiais para fazer. A tinta preta, ferro e o que podia ser chamado de lápis, mas sempre que falo isso, Rowan só falta me bater. Mostrei a ele como queria a tatuagem e tirei a toalha para me deitar de bruços.

Depois das semanas que passaram desde que havia levado a chicotada, minhas costas estavam repletas de cicatrizes. Eu as encarava todos os dias.

Doía bem pouco fazer as tatuagens comparado as chibatadas, obviamente. Então durante as próximas horas, eu e Gavriel conversávamos enquanto ele fazia o trabalho.

— Já sabem a rota que vamos fazer para capturar Lorcan?

𝐂𝐄𝐋𝐄𝐒𝐓𝐄 - GavrielOnde histórias criam vida. Descubra agora