Capítulo Quatro

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Narrativa Pedro

Sentimentos são confusos e estranhos, e toda vez aquela sensação de querer toca-lo e poder sentir o calor do seu corpo, não compreendia de onde vinha aquela fascinação naquele ser pequeno e indefeso.

Sempre com o olhar concentrado em alguma coisa, sempre nos seus devaneios internos, e era isso o que mais me chamava atenção nele, como se tudo ao seu redor não fizesse parte daquele espaço no qual ele se encontrava, como se estivesse perdido, sempre à procura da sua terra do nunca particular.

Ele se distanciava o máximo que podia das pessoas, com um livro nas mãos e observando os seres a sua volta com a maior cautela, como se fossemos animais no seu pequeno zoológico particular e exclusivo.

Toda vez que o via pelos corredores com a cabeça baixa, era como se esperasse o pior das pessoas a qualquer momento, como se o medo fosse seu companheiro fiel, que estava presente em todos os momentos da sua vida, aquele tipo de sensação estava claro em todos os seus movimentos corporais.

Era evidente que amigos não eram o seu forte, caminhava sozinho, como um lobo solitário, mas o seu charme estava envolto nesse método exótico de viver a vida, mas isso tinha seu lado bom e ruim, o bom era que seria mais fácil abordar ele, sem toda a pressão dos seus amigos me julgando sendo ou não um bom partido, mas pelo lado ruim, tinha medo de me aproximar e ele sair correndo como uma lebre foge de um leão faminto.

Não sabia explicar o que ele tinha, para que ninguém quisesse se aproximar, suas notas eram incríveis, ele era fora dos padrões de quem faz faculdade, como se aquilo fosse algo libertador, nem queria parar para pensar no tanto que ele podia ter sofrido no passado, e como essa formação podia ajudar no seu futuro, um dos projetos que ele mesmo criou no aula, foi um dos mais comentados e elogiados pelos professores, certamente tinha talento e força de vontade, não tinha como não se impressionar com a sua capacidade e amor quando se envolvia em algum projeto, mas como eu disse, ele preferia fazer tudo sozinho, não queria que alguém o atrapalhasse na hora do pensar.

Algo tinha acontecido e minha curiosidade me matava tentando resolver esse quebra cabeça, ele soa inofensivo e indefeso, será que no final das contas estava enganado? Será que talvez ele seja quieto e estranho, isso me soava meio que como o primeiro estágio da psicopatia, ou talvez meu argumento estivesse errado, meu preconceito estava em modo ativo nesse momento, incertezas rodavam na minha cabeça, como uma pessoa que mal me dirigia a palavra dentro da sala, mal conversava com as pessoas, podia me cativar tanto?

Me recordo de uma noite que a faculdade estava vazia, ninguém nos corredores, a maioria dos alunos estavam no campeonato que a faculdade fazia uma vez ao ano, o ar leve de liberdade percorria o meu corpo, e no momento em que estava discutindo comigo mesmo a caminho da biblioteca, o vi sentando em uma mesa perto da cantina, com um pequeno livro de bolso nas mãos, se deliciando com uma maçã verde, os olhos estavam cativos na leitura, ele girava as folhas como se devorasse o livro invés da maçã.

Quando por fim percebeu minha presença, e viu que meus olhos estavam sobre ele, rapidamente abaixou a cabeça como se pedisse permissão a mim para continuar a leitura, aquilo me partiu em pedaços, não conseguia entender toda essa metodologia de subserviência.

Perguntas e mais perguntas brotavam na minha cabeça, do que ele tinha tanto medo? O que será que afligia aquele pequeno coração? Quem poderia ter feito mal a ele? Perguntas sem respostas até aquele momento, questões que se perguntadas diretamente a ele, implicaria como indelicadeza da minha parte.

Não sei explicar certamente o tipo de sentimento que tinha por ele, mas o que passava na minha cabeça era que no final das contas, eu e somente eu precisava protege-lo dos perigos dessa sociedade maluca, dessa sociedade que o julgava sem ao menos conhecê-lo, como as pessoas não tinham interesse nele? De fato, aquilo era o que mais me chamava atenção, essa distância que tomava das pessoas, talvez para poder observá-las com cautela, e sempre anotando seus hábitos e suas manias.

Posso tentar descreve-lo de várias formas, e nem ao menos vou chegar perto do que sinto com relação a esse ser humano com uma personalidade tão envolvente.

Minha vida era estranha também, vários dos meus amigos não entendia a relação que tinha com meus pais, não conseguia ser dependente deles, era como se meu pai tivesse trilhado o seu caminho, e o meu definitivamente era o oposto, nossas reuniões e jantares era quase um campo de batalha, meu pai tentava ao máximo me convencer de seguir a sua carreira de advogado, mas minhas investidas e argumentos fizeram ele aceitar o contrário, não devo esquecer que minha mãe deu a sua contribuição para que meu sonho pudesse ocorrer.

Nunca fui o tipo de pessoa que espera tudo acontecer e chegar no final e assumir aquilo como se fosse ato meu, e que a glória era toda minha, queria botar a mão na massa, sentir por alguns momentos que fazia parte de algo, e me apaixonei por esse tipo de vida ainda criança, e uma coisa interessante era que quando tinha doze anos, pedi meu pai uma ajuda para construir minha casa na arvore, e ele com seus clientes, estava sempre ocupado, e nunca o julguei por isso, então decide fazer as coisas por conta própria, nesse momento surgiu a vontade de ver aquele projeto se levantar do nada, e no final das contas saber que aquilo valeu a pena, e estar presente a cada segundo me mostrava que eu estava vivo, pulsante e alegre.

Me mudei para São Paulo no final do ano passado, mesmo não querendo aceitar o dinheiro dos meus pais, me rendi quando soube que a vida não era aquele paraíso no qual tinha sido criado, era complicado, tudo se pagava e era diferente, e quando cheguei a cidade percebia que não seria fácil, mas isso não me deteve, segui em frente e até hoje não encontrei desafio que não pudessem ser vencidos com um pouco de paciência e força de vontade.

Podem me chamar de Pedro, batizado como Pedro Ribas, filho de Henrique Fogaça Ribas, um dos melhores advogados do estado de São Paulo, sua fama se deu graças as suas defesas dos grandes políticos do congresso nacional, não era o meu motivo de orgulho, por isso sempre que ia clientes da alta cúpula em casa discutir qual seria o próximo passo, eu me ausentava do recinto e mergulhava no mundo da arquitetura, isso era um sonho desde a casa da arvore.

Minhas experiências afetivas não tinham sido as melhores possíveis, a paixão pela vida era o que me prendia, e quando observei aquele menino preocupado com a sua segurança e com as pessoas que estavam a sua volta, percebi ali que um sentimento nascia. 

Garotos (Romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora