Capítulo 1- Ano de 2025

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— Marcy, sou eu, fuja agora! Procure a comunidade na floresta, logo te encontro! — Assim espero! Pensei, querendo convencer mais a mim mesma que de fato conseguiria.

Desliguei o telefone antes de ouvir seus protestos ou qualquer relutância, sempre a orientei sobre certos procedimentos muitas vezes necessários.
A havia feito prometer por diversas vezes não questionar caso alguma de nós estivesse numa situação de risco, se chegasse esse momento, simplesmente agiríamos e sendo possível, no
momento oportuno daríamos a devida explicação, um segundo, dependendo da ocasião, é algo precioso e a morosidade pode custar à vida.

Se dissesse corre pra direita ou esquerda, faça isso ou aquilo, teria que fazer sem pestanejar, como um cão adestrado.

Alguns anos se passaram desde que entrei para o serviço policial e me convidaram a fazer parte do grupo de inteligência, achei que
seria uma boa sair da área mais operacional e aceitei, tive que aprender a lidar com frustrações, pois muitas vezes levava de bandeja determinada situação para facilitar a tomada de decisão dos meus superiores e eles
engavetavam sem dar muita importância para as informações obtidas, queria morrer com isso,
porque eu gosto de verdade de justiça, de fazer a coisa certa, mas essas decepções nunca me fizeram trabalhar menos, faço o que preciso fazer com afinco.

Uma das coisas que deixei pra trás ao mudar de cargo foi o coturno, apesar de gostar muito da farda, preciso me vestir de maneira discreta, agora uso mais sapatos sociais, até mesmo
scarpin, que são os meus preferidos, pois não havia necessidade de EPI nos pés, porém faz alguns meses em que venho aderindo aos tênis e percebi nesse momento que havia sido uma
boa escolha.

Corri o mais rápido que pude, precisava chegar a minha rota de fuga ou estaria perdida, jamais entrava num lugar sem me atentar para isso, ainda mais estando num lugar conhecido. Praticamente tinha um mapa detalhado na cabeça de cada cantinho.

Algumas pessoas mais próximas me dizem que sou neurótica, mas já era extremamente atenta antes de exercer minha atual profissão, meu estado de alerta sempre foi instintivo, quiçá por
isso sempre sofro de ansiedade e ultimamente venho passando por uma estafa mental.

Espero conseguir chegar à comunidade para juntar-me a minha irmã, a única pessoa da família que me resta.
— Que ela não seja teimosa e que seja bem rápida — era a frase que ficava martelando  em minha mente enquanto descia pelas escadas.

Minha irmã com toda certeza não iria a lugar algum sem o noivo Giovani, ainda que perdesse tempo indo atrás dele, seria bom para não ter que dirigir sozinha, pois a comunidade ficava
distante da cidade mais próxima, mesmo que de carro e o sítio ficava em meio a uma grande mata.

Quanto a mim, provavelmente a entrada estaria sendo vigiada, não iria conseguir sair, sem que fosse posta num porta malas, que só de pensar me deixa em pânico. Morreria sem ar,
preciso mudar o pensamento, pois isso me dá aflição.

Ao chegar ao primeiro andar, entrei numa sala que sabia estar desocupada, pois estava em reforma, ouvi o barulho deles se aproximando, queria que meu coração pulsasse mais
devagar, podia ver minha blusa mexendo ao seu ritmo e a impressão é que até isso eram capazes de ouvir. Batia rápido, não só pela corrida que havia empregado, mas também pelo
medo de ter que ser mais agressiva com eles.
Que infelicidade a minha, estava no local e no momento errado, assim que saí do meu posto de trabalho, subi para a cobertura a fim de tirar fotos.
Teria que passar numa clínica para buscar uma tomografia que Marcy me pediu, ela vinha sentindo fortes dores de cabeça e havia feito a tomo para averiguar mais detalhadamente.
Eu sabia que no caminho havia uma loja de revelação de fotos e por isso quis fotografar, um grande hobby, queria decorar a sala com fotografias da cidade.

Dificilmente apareço em alguma foto, mas entardecer, paisagens não são ignorados pela minha lente.
Apesar de que o prédio só ia até o quarto andar, sabia que de lá a vista da cidade é privilegiada.

Há dias pensava fazer isso, porém só me lembrava quando já havia saído do prédio, porque não me esqueci hoje também?Marcy sempre me dizia que os problemas me procuravam e parece que ela tinha razão. Não restava tempo para ficar me lamentando, precisava agir.

— Jordana, não torne as coisas mais difíceis, venha conosco! só queremos conversar.

Era a voz do Paulo, meu amigo, não apenas meu colega de trabalho, agora um total estranho.
Jamais iria me entregar facilmente, morro tentando sobreviver e lutando pela minha consciência, não vou me tornar um fantoche como eles.
Nunca me dou por vencida, isso é inerente em mim e esperava sinceramente não precisar
atirar neles, pela consideração e amizade que compartilhamos um dia.

— Ela já deve ter saído do prédio, procuramos aqui em vão.

Agora era o Henrique a falar,
estava errado, porém estava torcendo para que Paulo concordasse com ele. Havíamos namorado por exatos quatro meses, até concordarmos que funcionávamos melhor como
amigos e ele se tornou de fato um grande amigo. O perdi também para essa droga.
Lembro- me de que quando descobrimos o que vinha acontecendo, achávamos que era algo
muito louco pra ser verdade, na verdade é loucura mesmo, porém é real pra infelicidade de todos.
Sempre reclamava por não ser muito alta, porém nessa hora era bom ser mignon, estava escondida em meio a umas caixas empoeiradas, torcendo para não ter uma crise de espirros,
há tempos não tinha crise de renite alérgica e não era um momento tranquilo para desencadeá-la.
Tapei meu nariz e boca com o dorso da mão, procurando respirar apenas pela boca e bem devagar, assim fazia quando passava por algum treinamento em que usavam granada de gás
lacrimogêneo e nesse caso procurava salivar bastante, o contrário de agora em que notei que até minha boca estava seca.
Meu corpo estava tenso e assim que ouvi os passos deles se distanciando corri para o lado contrário, não era por onde havia intencionado escapar, mas ao ver uma estreita janela a
minha esquerda, encarei-a como um presente, ali estava a minha saída.

A ForagidaOnde histórias criam vida. Descubra agora