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Dandara

Lavei toda a louça depois de ter preparado um almoço. Seria a primeira vez na semana que nós iríamos fazer uma refeição completa,  seria ótimo pra saúde do meu avô.

O bolsa família de trezentos e sessenta e cinco reais quebrava um galho no aluguel, luz e um pouco de comida só no começo do mês, depois a gente tinha que se virar pra comer. Eu faxinava umas casas, fazia uma unha aqui e ali e até mesmo ajudava uma moça numa barraquinha lá na praia. Não era muito mas quebrava um galho, já era o pão do dia.

13h da tarde e o meu avô chegou, suado e cansado. Ele foi direto pro banho, tratei logo de esquentar a comida no fogão novamente, o microondas tinha quebrado e não tínhamos como consertar.

Dandara - Fiz um feijão brabo pro senhor, senta aqui, vou temperar a salada - ele sentou na mesa em frente à pia.

Tião - De onde você tirou esse dinheiro dessa comida, minha filha?

Dandara - Foi a Verena, vô - coloquei o prato em cima da mesa - Eu não queria aceitar mas ela insistiu muito.

Tião - Essa menina tem um coração muito bom, pena que escolheu os caminhos errados.

Dandara - Não é tão errado, não é, vô? É melhor que roubar, matar.

Tião - Sim, mas no meu tempo isso seria uma vergonha.

Dandara - Mas é graças a essa vergonha que nós estamos comendo agora - ele se calou.

Não julgava o meu avô, os pensamentos dele condiz com a época em que ele viveu e digamos que até hoje também não é aceito mas eu não vou permitir que fale mal dela, ainda mais sendo ela que está me ajudando.

Sebastião comeu tudo, ele estava com fome mesmo. Cortei as bananas e coloquei com um pouco de leite no prato, nós amávamos essa gororoba, ele fazia pra mim quando eu tinha dez anos. Entreguei a gororoba nas mãos dele e fui almoçar, estava com fome, não tinha tomado café de manhã.

Depois de ter almoçado e lavado os pratos eu me sentei do lado dele.

Dandara - Como foi a consulta, vô?

Sebastião - O de sempre, o resultado é só no mês que vem. - eu suspirei.

Era sempre assim, maldito sistema de saúde, levávamos mais de um mês pra conseguir marcar uma bendita consulta e quando conseguíamos o resultado só saía dois ou três meses depois. Era foda mas era nossa única opção, não tinhamos condição nenhuma de custear tratamento no particular, mal tínhamos o que comer.

Dandara - Mas vai dar tudo certo - levantei do sofá e fui até a estante pegar o controle, foi aí que eu vi um cigarro atrás da TV - O que é isso aqui, Sebastião? - ele me olha surpreso.

Tião - Não sei não, minha filha, deve ser antigo.

Dandara - Antigo, sei... - olhei pra ele desconfiada - estranho que eu passei pano nessa estante ontem de ontem e não tinha cigarro antigo nenhum, o senhor anda por aí fumando escondido de novo né? Depois fica aí tossindo que nem um cachorro.

Tião - Não eu sou não, minha filha, não fumo mais - mentiu.

Dandara - Me engana que eu gosto! O senhor não é nenhuma criança, sabe que não está bem de saúde e continua fumando essa porcaria que só faz piorar todos os sintomas.

𝗖𝗼𝗺𝗮𝗻𝗱𝗼 𝗩𝗲𝗿𝗺𝗲𝗹𝗵𝗼 Onde histórias criam vida. Descubra agora